Fábio Macêdo*
A sociedade, que arca com os tributos sobre o consumo, sentirá os impactos da Reforma Tributária, mas os entes federados também são os contribuintes de fato de suas compras. Olhando por esta perspectiva, sabe-se que isso trouxe uma preocupação para os municípios. Afinal, eles são os maiores compradores governamentais, com a possibilidade de aumento da carga tributária com suas aquisições públicas de bens e serviços.
A proposta aprovada determina que a receita proveniente dos novos tributos estabelecidos com a Reforma Tributária e incidentes nas compras governamentais pertence ao ente federado que contratou.
A princípio parece uma medida interessante, pois efetivamente o ente público contratante só precisará pagar o preço do serviço ou bem adquiridos sem esses tributos, logo não "suportaria" a carga tributária incidente nas suas compras. Entretanto, não é bem assim. As alíquotas do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição de Bens e Serviços (CBS) serão somadas. Irão transformar-se em alíquota do ente contratante, IBS (estados e municípios) ou CBS (União), e incidirão na compra governamental. Na prática, o próprio poder público contribuirá para sua própria receita ("paga e recebe de volta o pagamento"). E qual a consequência disso?
Sendo receita própria do ente federado, a tributação sobre suas compras trará para todos os entes uma diminuição de ingressos de recursos financeiros nos seus caixas, pois parte da receita dos tributos atuais sobre o consumo será trocada por uma parcela meramente contábil, referente à tributação de suas compras governamentais. No entanto, continuarão existindo as mesmas obrigações de gastos em educação, saúde, repasses para outros poderes sobre as receitas financeiras efetivas e as meramente contábeis.
Parece complexo, mas não é. Veja o seguinte: os municípios compram R$ 222 bi e os estados, R$ 110 bi (economista Sérgio Gobetti, 2022). Admitindo que seja tributada uma alíquota total de 20% (IBS e CBS) sobre as compras governamentais, os municípios e estados terão uma redução de R$ 44 bi e R$ 22 bi, respectivamente, nas suas receitas futuras do IBS, que efetivamente ingressam nos seus caixas, ou seja, menos disponibilidade financeira.
Provavelmente, outras fontes de recursos que custeiam as despesas, como empréstimos e transferências voluntárias, deverão diminuir, pois entes federados necessitarão de menos recursos para comprar, em virtude de o credor e devedor de tributos serem a mesma pessoa. Logo, as situações fiscais dos estados e dos municípios serão agravadas; e para recuperar a receita financeira perdida só com aumento das alíquotas do IBS estadual e municipal, definidas em leis próprias de cada ente federado.
No caso dos estados, a situação será mais grave, pois terão que repassar recursos financeiros de uma receita própria de IBS, meramente contábil, para os seus municípios. Isso pelo fato de se manter a participação dos municípios na receita estadual do IBS como ocorre no ICMS, imposto de titularidade exclusiva estadual.
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Para prefeitos e governadores, os riscos de terem suas contas rejeitadas pelos órgãos de controle externo serão aumentados, pelo fato de não atingirem os limites constitucionais de despesas obrigatórias e repasses para outros Poderes (Legislativo e Judiciário), pois a partir da Reforma Tributária tudo que comprar independentemente da origem do recurso, gerará uma receita própria meramente contábil, e estabelecerá gastos obrigatórios sem o devido lastro financeiro. Como consequência, poderemos ter milhares de prefeitos e alguns governadores inelegíveis.
Presidente da Federação Nacional dos Auditores e dos Fiscais de Tributos Municipais (Fenafim); presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais de Tributos dos Municípios e do Distrito Federal (Unafisco) e presidente do Sindicato dos Fazendários do Recife (Afrem Sindical)*
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