
"Nós, mulheres, não temos o privilégio de desistir de nada." Selecionei essa frase entre tantas outras, bem marcantes, da entrevista que publicamos hoje com a ministra Maria Elizabeth Rocha, que, nesta quarta-feira, assume a presidência do Superior Tribunal Militar (STM). E por que essa frase? Porque ela ficou gravada em mim.
Não é uma frase simples, é uma sentença. É também uma lembrança. A verdade é que não conquistamos alguns dos direitos mais básicos, entre eles o de poder simplesmente descansar. A luta da mulher não cessa. Maria Elizabeth ainda é a única mulher na Corte militar, e não foi um cargo entregue de bandeja ou por um consenso, como ocorre normalmente com os homens. Por isso, ela sabe que a batalha não se esgota com a sua chegada a esse posto.
"Nós temos o compromisso da sororidade. Por isso é que eu busco mais mulheres para essa Corte. Por isso eu clamo ao presidente Lula que indique uma outra mulher. Nós temos que abrir caminho para as gerações futuras. É a nossa missão, é o nosso dever, é o nosso compromisso", diz a ministra.
Ela sabe, e nós também entendemos, que qualquer mudança estrutural passa pela ocupação dos espaços de poder pelas mulheres. É preciso garantir a presença feminina no Judiciário para que o olhar dos tribunais para a sociedade também mude. Existem muitos meios de se fazer justiça, e todos eles podem seguir as leis vigentes. Mas é preciso um Judiciário mais empático com as mulheres — desde as salas de audiências.
A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, em entrevista publicada ontem, foi enfática também em relação a isso, criticando a falta de espaço para as mulheres até na base da política. "Os partidos não dão espaço para as mulheres crescerem partidariamente. Também não dão oportunidade para as mulheres serem carros-chefes de campanha", diz.
Esse vácuo de mulheres no poder tem íntima relação com uma cultura de machismo e misoginia que termina por inflar a violência. Como disse a ministra Cida, vivemos uma pandemia: seis mulheres são assassinadas no crime de feminicídio por dia, segundo os registros oficiais. A cada seis minutos, uma mulher é estuprada. Entre dois e três minutos, há uma denúncia de violência doméstica familiar contra as mulheres.
São números alarmantes. E, não se engane, há uma estreita relação entre o ódio às mulheres e o ataque às liberdades, às minorias, à democracia. Estamos no Mês das Mulheres. Hoje a Lei do Feminicídio completa 10 anos. São momentos que nos convidam a refletir sobre o nosso lugar no mundo, sobre o quanto conquistamos e sobre por que ainda não podemos parar — ainda que seja exaustivo continuar a luta. Por nós e pelas futuras gerações, estou com Maria Elizabeth: não temos o direito de desistir.