
YOUSSOUF ABDEL-JELIL, representante do Unicef no Brasil
Os olhos do Brasil e do mundo estão voltados para novembro de 2025, quando vai ser realizada em Belém (PA) a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP30. E muito se pensa e se fala sobre esse evento — menos que se trata, também, de coisa de criança.
Sim, a COP30 também é coisa de criança — e de adolescente. E no melhor sentido da expressão: justamente por ser um espaço para que países se unam no combate às mudanças climáticas, a Conferência precisa incluir e considerar as vozes e os direitos de crianças e adolescentes se quiser, de fato, manter o aumento da temperatura média global abaixo de 2ºC e, idealmente, não mais que 1,5ºC.
Isso porque as crianças, embora sejam quem menos contribui para a crise climática, são quem mais sente e sentirá os seus efeitos. São elas que vivem mais desastres climáticos que seus pais, avôs e bisavôs; que são as impactadas por quase 90% das doenças intensificadas pela mudança do clima, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS); e que veem sua educação, sua forma de brincar, suas oportunidades e toda a sua vida afetadas por um clima em constante mudança. Por isso, não existe justiça climática sem justiça intergeracional.
Mas é mais que isso. Meninos e meninas têm experiências e perspectivas únicas, diferentes das dos adultos, e já estão engajados oferecendo ideias e soluções nas comunidades em que vivem. Assim, os esforços de mobilização convocados pela presidência brasileira da COP30 têm muito mais chances de sucesso se incorporarem a ação climática que está sendo liderada pelas novas gerações no Brasil e no mundo.
É para isso que o Unicef está atuando antes, durante e depois da COP30. Além de produzir dados sobre como as mudanças climáticas impactam essa geração e as próximas, agimos para mobilizar crianças, adolescentes e jovens para que participem e contribuam nos processos formais e informais até a COP30. Aqui no Brasil, fazemos isso em um trabalho conjunto com governos municipais, estaduais e o governo federal, e com parceiros da sociedade civil, do setor privado, e de organizações lideradas por meninos e meninas.
Desde a COP28, os países signatários do Acordo de Paris reconheceram que as mudanças climáticas impactam de maneira desproporcional as crianças. E o que ficou claro nos debates desde esse reconhecimento é que o mundo conhece as soluções que podem e devem ser adotadas para enfrentar esse problema.
Primeiro, cada país deve traçar e cumprir objetivos ambiciosos, considerando as necessidades específicas de crianças e adolescentes, para suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) — o compromisso de cada nação, enviado periodicamente à ONU, sobre como reduzir as emissões de gases do efeito estufa. Infelizmente, isso é algo que apenas um terço das NDCs anteriores fez. No caso do Brasil, a mais recente NDC apresentada pelo país, em novembro de 2024, incluiu avanços no olhar para a infância, mas ainda há muito espaço para melhorar.
Além disso, o financiamento climático precisa crescer drasticamente e ser alocado de forma a garantir direitos de crianças e de outras populações mais impactadas, como previsto na decisão sobre a meta de financiamento da COP29. O Unicef identificou que, entre 2006 e 2023, apenas 2,4% do financiamento climático global foi direcionado a projetos com atividades responsivas a crianças e adolescentes. Se queremos avançar, é essencial que esse número chegue a pelo menos 20% até 2030.
Há várias outras decisões a serem adotadas em Belém — sobre adaptação climática, sobre as perdas e os danos sofridos por países e comunidades, sobre os impactos particulares para mulheres, pessoas indígenas e outros povos tradicionais — que podem e devem considerar o impacto da mudança do clima sobre meninos e meninas, e sobre como eles e elas podem ser parte da solução.
São desafios consideráveis, que só poderão ser superados se atuarmos junto às crianças e aos adolescentes. E o Brasil tem o necessário para aproveitar essa oportunidade, contando com esforços dos governos; crianças, adolescentes e jovens que já estão organizados e mobilizados; e organizações, empresas e grupos que desejam contribuir no combate às mudanças climáticas.
Como organização observadora da COP, o Unicef estará à disposição do Brasil, de outros países e da sociedade para contribuir para esse movimento. É diante desse cenário que defendemos: que o legado da COP30 seja não só por cada criança, mas para elas e com elas.
Opinião
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