ARTIGO

Com as mãos de Pilatos

Netanyahu pensa a campanha militar como uma possibilidade de se projetar como o líder que salvou o Oriente Médio da ameaça iraniana. De quebra, acredita que possa melhorar a imagem minada pelo massacre com características de genocídio em Gaza

 Smoke billows in the distance from an oil refinery following an Israeli strike on the Iranian capital Tehran on June 17, 2025. Israel and Iran exchanged fire again, the fifth day of strikes in their most intense confrontation in history, fuelling fears of a drawn-out conflict that could engulf the Middle East. (Photo by ATTA KENARE / AFP)
     -  (crédito:  AFP)
Smoke billows in the distance from an oil refinery following an Israeli strike on the Iranian capital Tehran on June 17, 2025. Israel and Iran exchanged fire again, the fifth day of strikes in their most intense confrontation in history, fuelling fears of a drawn-out conflict that could engulf the Middle East. (Photo by ATTA KENARE / AFP) - (crédito: AFP)

Ao que parece, o destino do aiatolá Ali Khamenei está traçado. Tanto Israel quanto os Estados Unidos deram indicações de que não estariam interessados em um cessar-fogo. Se o desejo do governo de Benjamin Netanyahu fosse apenas o de destruir o programa nuclear iraniano, suas forças não teriam empreendido uma campanha de assassinatos seletivos de lideranças militares do regime, nem bombardeado a emissora estatal de Teerã. O objetivo é eliminar o regime teocrático islâmico, visto como uma ameaça à supremacia militar de Israel no Oriente Médio.

Tudo com a anuência de Donald Trump, que se revestiu de Pôncio Pilatos e “lavou as mãos” para a  campanha militar israelense contra o Irã. Em uma de suas mais recentes declarações, o titular da Casa Branca disse não procurar um cessar-fogo, sinalizou a indisposição em negociar e admitiu que busca o fim do conflito. Na segunda-feira, Netanyahu declarou que a paz depende da eliminação de Khamenei.

A guerra iniciada unilateralmente por Israel tem consequências imprevisíveis. Apesar de os Estados Unidos supostamente não terem envolvimento direto com os ataques ao Irã, a anuência da Casa Branca e as declarações explosivas de Trump podem amplificar o antiamericanismo no mundo e colocar interesses dos EUA como alvos de grupos terroristas e milícias xiitas. Por atacar o Irã, Israel — envolvido na matança de inocentes em Gaza — corre o risco de alimentar o antissemitismo e fomentar o extremismo. A potencial derrubada de Ali Khamenei e de seus asseclas lançaria o Irã em um vácuo de poder, o que poderia transformar o país em um celeiro do terror. Basta lembrarmos o que aconteceu no Iraque após a queda, prisão e execução de Saddam Hussein. 

Israel assinala que a guerra travada contra o regime dos aiatolás é existencial, porque o Irã estaria a ponto de produzir armas nucleares. Qual é a prerrogativa para que Israel mantenha seu arsenal nuclear e exija de países da região que se abstenham desse tipo de armamento? A garantia da soberania militar e da dissuasão atômica? Existia a perspectiva de um acordo nuclear e o desejo do Irã de negociar, ainda que as primeiras tratativas tenham fracassado. O ataque ao Irã sepulta qualquer possibilidade de acordo e, segundo especialistas, deve incitar o país a buscar o quanto antes a bomba atômica, por questão de sobrevivência.

Netanyahu pensa a campanha militar como uma possibilidade de se projetar como o líder que salvou o Oriente Médio da ameaça iraniana. De quebra, acredita que possa melhorar a imagem minada pelo massacre com características de genocídio em Gaza. No fim das contas, tudo é questão política. O tiro pode sair pela culatra, ante o risco de Israel estar preparando uma armadilha para si mesmo.

postado em 18/06/2025 06:05 / atualizado em 18/06/2025 07:42
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