
Quem diria! Em tempos de debate sobre anistia e PEC da Blindagem, os clubes do futebol brasileiro deveriam ser exemplo a outro tipo de agremiações: os partidos políticos. Houve um tempo em que os cartolas esculhambavam as nossas competições nacionais com um indulto chamado virada de mesa. Clubes gigantes rebaixados para a segunda — e até a terceira divisão — desrespeitavam o "estado democrático de direito" do Campeonato Brasileiro, rasgavam a constituição das competições e permaneciam onde estavam na temporada seguinte com a maior cara lavada. Como se nada tivesse acontecido.
Há quanto tempo você não ouve falar em anistia a times rebaixados no Campeonato Brasileiro? Eis um pequeno passo. Independentemente do peso das camisas, os cartolas foram enquadrados. O poderoso chefão Mario Celso Petraglia nem ousou pedir absolvição ao Athletico-PR no ano passado.
O Furacão tem no currículo o título da Série A em 2001; foi duas vezes vice da Libertadores, em 2005 e em 2022; ganhou a Copa do Brasil em 2019, e a Sul-Americana nas edições de 2018 e de 2021. O time paranaense iniciou o fim de semana em sexto lugar na Série B, fora do G4, e correndo desesperadamente contra o tempo para voltar a figurar na elite.
Nem sempre foi assim. Em 1991, o Grêmio caiu para a segunda divisão de mãos dadas com o Vitória. O tricolor participou da Série B em 1992 e não subiria. Os cartolas de plantão rasgaram a constituição — regulamento — do campeonato e deram um jeitinho de anistiar o time gaúcho. A quantidade de vagas para o acesso foi multiplicada por seis! Passou de duas para 12. O Grêmio subiu em nono.
Houve anistia para o Fluminense. Rebaixado em 1996, o time das Laranjeiras ficou na elite em 1997. O então presidente Álvaro Barcelos extrapolou ao estourar um champanhe para celebrar a virada de mesa e foi criticado pelo ex-mandatário Peter Siemsen: "Em 1996, o então presidente cometeu uma vergonha nacional. É injusto condenar o clube pela atitude de uma pessoa.
Filho de Barcelos, Fernando deu a explicação da família ao ato do pai. "Todos caíram em cima dele. Ele nunca comemorou uma virada de mesa. O que ele comemorou ali, naquele dia, foi o fim de todo um sofrimento pelo qual o Fluminense passava", justificou. O Fluminense caiu novamente em 1997, jogou a Série em 1998, despencou para a Série C, conquistou a terceira divisão em 1999 e voltou à elite em 2000 na confusão da Copa João Havelange de 2000 depois de o Gama peitar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) no Caso Sandro Hiroshi e impedi-la de organizar o Brasileirão. Até hoje, há piadas de que o Fluminense deve uma participação na Série B. Tempos confusos que não voltam mais.
O fim do indulto no Brasileirão levou Corinthians, Palmeiras, Santos, Botafogo, Fluminense, Vasco, Grêmio, Internacional, Atlético-MG e Cruzeiro para a Série B. Dos 12 clubes mais tradicionais do país, Flamengo e São Paulo seguem sem ser rebaixados.
O futebol nacional deu um passo, mas faltam inúmeros. O efeito suspensivo é uma forma de anistia depois de longos julgamentos nos tribunais desportivos. Craques como Edmundo no passado, e Bruno Henrique no presente, foram beneficiados. Há absolvição aos clubes endividados, quebrados, mal pagadores. Em meio a incontáveis mazelas, passamos a ter uma certeza: quem cai, cai. E quem sobe, sobe, mesmo, depois do fim da anistia no Brasileirão. A virada de mesa acabou!