ARTIGO

Alfabetismo funcional entre jovens exige atenção renovada nas políticas educacionais

Garantir que jovens tenham acesso a práticas de letramento e numeramento que os levem aos níveis consolidados de alfabetismo é assegurar que possam participar criticamente da sociedade

Ana Limapesquisadora e coordenadora do o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf); Marisa Villiconselheira nacional de juventude no  Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) e diretora executiva da Rede Conhecimento Social

Em 2025, o Brasil completa 20 anos de políticas públicas voltadas às juventudes. O momento é oportuno para uma análise crítica dos avanços obtidos e dos desafios persistentes. Entre os temas que merecem atenção renovada, está o alfabetismo funcional, cuja evolução revela limitações estruturais na garantia do direito à educação de qualidade. 

Dados do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) mostram que, entre 2001 e 2024, o índice de analfabetismo funcional caiu de 39% para 29% da população entre 15 e 64 anos. Embora represente uma melhora, o ritmo de redução é lento diante da magnitude do problema. 

Paralelamente, o nível elementar de alfabetismo — que corresponde a um domínio básico da leitura, escrita e uso de números — passou a concentrar a maior parte da população. Indivíduos nesse nível conseguem realizar tarefas simples, como localizar informações em textos curtos e interpretar gráficos básicos, mas enfrentam dificuldades para lidar com conteúdos mais complexos. 

Entre jovens de 15 a 29 anos, 19% estão em situação de analfabetismo funcional e 36%, no nível elementar. Isso significa que uma parcela expressiva da juventude brasileira, mesmo com escolaridade formal avançada, não desenvolveu competências suficientes para interpretar criticamente informações escritas. Muitos não conseguem distinguir com clareza fatos de opiniões, o que compromete sua capacidade de participação cidadã, inserção qualificada no mundo do trabalho ou fruição cultural.

As desigualdades raciais seguem presentes: jovens negros (pretos e pardos) apresentam índices mais altos de analfabetismo funcional (17%), em comparação aos brancos (13%). No nível consolidado de alfabetismo, a diferença também é significativa: 40% entre negros e 53% entre brancos. Esses dados evidenciam que o acesso desigual à educação continua reproduzindo barreiras históricas.

Diante desse cenário, é fundamental que políticas voltadas às juventudes priorizem a melhoria da qualidade da educação básica, sobretudo com atenção especial aos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio. Garantir que jovens concluam a escolarização obrigatória com domínio consolidado das habilidades de leitura, escrita e raciocínio matemático deve ser objetivo central. Além da escola, é necessário ampliar o acesso a práticas alfabetizantes em espaços culturais, profissionais e digitais.

A celebração de duas décadas de políticas de juventude não pode prescindir de um compromisso efetivo com a superação das limitações educacionais que ainda afetam milhões de jovens. Investir na garantia do alfabetismo proficiente é investir na capacidade de transformação social e no fortalecimento da democracia. 

A aprovação do Plano Nacional de Juventude, demandada pelo Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) em carta enviada ao presidente Lula em junho de 2025, representa uma oportunidade estratégica para enfrentar os desafios que ainda limitam o desenvolvimento pleno das juventudes brasileiras. Mais do que consolidar diretrizes, o plano pode ser um instrumento para priorizar políticas públicas que garantam direitos fundamentais, reconhecendo suas múltiplas realidades — territoriais, raciais, de gênero e geracionais. 

Nesse contexto, os dados do Inaf reforçam a importância de incluir o alfabetismo como dimensão estruturante das políticas de juventude. Garantir que jovens tenham acesso a práticas de letramento e numeramento que os levem aos níveis consolidados de alfabetismo é assegurar que possam participar criticamente da sociedade, interpretar dados, produzir cultura e ocupar espaços de decisão. O Plano Nacional de Juventude pode, e deve, ser um marco para que o país avance na construção de uma geração que não apenas esteja na escola, mas que saia dela com condições reais de exercer sua cidadania, com autonomia informacional e capacidade de transformação social. 

 

 

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