
Na semana passada, o Brasil publicou os primeiros resultados de uma vacina 100% nacional contra a covid-19. Em testes clínicos, com a participação de aproximadamente 350 voluntários, o imunizante mostrou-se seguro e eficaz. Além de preparar as células do organismo humano a resistir a uma eventual transmissão da doença, em caso de infecção, a vacina SpiN-Tec habilita o sistema imunológico a atacar apenas as células atingidas pelo coronavírus. Essa característica, segundo os pesquisadores envolvidos no projeto, representa uma inovação no combate ao patógeno causador da pandemia.
Vencidas essas primeiras etapas, os cientistas pretendem obter autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para realizar a fase 3 dos testes, com 5,3 mil voluntários de todas as partes do país. Mantido o andamento do processo, a expectativa é de que o imunizante nacional contra a covid-19 esteja disponível para os brasileiros em 2027.
A vacina SpiN-Tec é fruto de um trabalho desenvolvido pelo Centro de Tecnologia de Vacinas (CT-Vacinas) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em parceria com a Fundação Ezequiel Dias (Funed), com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), gerido pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Para fomentar a iniciativa, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) investiu R$ 140 milhões.
Trata-se de um avanço extraordinário para o Brasil, considerando que a pandemia de covid-19 matou mais 700 mil pessoas no país. No período mais crítico, em abril de 2021, a doença ceifou mais de 4 mil vidas em apenas um dia. Todos ainda se recordam da angústia que o país viveu à espera de imunizantes — e a dura constatação de que éramos dependentes de tecnologia e conhecimento científico acumulado no exterior.
Registre-se que a vacina brasileira contra a covid-19 se junta a outra iniciativa relevante em nosso território: a partir do próximo ano, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) deverá oferecer 60 milhões de doses da vacina doméstica contra a dengue. A intenção é atender a população de 2 a 59 anos, com possibilidade de ampliação da faixa etária e coadministração com a vacina contra a chikungunya.
O desenvolvimento de um imunizante totalmente nacional significa um passo da maior relevância para a soberania científica do Brasil. Além de fortalecer toda a rede de pesquisa voltada ao aprimoramento da saúde pública, confirma o papel do país como referência em políticas de imunização. Ainda está na memória de muitos a espetacular vitória contra a poliomielite nos anos 1970-1980, apesar das recidivas em anos recentes. Diga-se, ainda, que esses avanços colocam o Brasil como um fornecedor relevante de vacinas no exterior, especialmente para países gravemente acometidos por doenças infecciosas.
Por fim, no caso específico da covid-19, o desenvolvimento de uma vacina totalmente brasileira reforça o compromisso do país com a ciência, após o tenebroso período de charlatanismo no governo Bolsonaro. É o resgate da vida, em que pese a tristeza com a morte das vítimas de tanta irresponsabilidade, incompetência, negacionismo e falta de empatia.