
RAFAEL GIOVANELLI, gerente de Pesquisa do Instituto Escolhas, coordenou a área de litígio estratégico do WWF-Brasil; e SERGIO LEITÃO, advogado, diretor-executivo do Instituto Escolhas, foi assessor para temas indígenas e ambientais no Ministério da Justiça
O enfrentamento das mudanças climáticas exige a mobilização de vultosos recursos; afinal, a transição para uma economia de baixo carbono e a adoção de medidas de prevenção contra eventos extremos custam caro. Para que os países em desenvolvimento tenham condições de adotar essas medidas, os países desenvolvidos deveriam lhes destinar U$ 1,3 trilhão anuais.
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O impasse sobre a chegada desses recursos se arrasta desde a Eco-92 no Rio de Janeiro, quando foi aprovada a criação da Convenção do Clima. Ali, os embates giraram em torno da definição do Capítulo 33 da Agenda 21, que tratava dos meios de implementação dos compromissos assinados, o que incluía desde recuperar o que foi desmatado até o aumento da oferta de transporte público.
À época, o Secretariado da Eco-92 estimou que essa implementação pelos países em desenvolvimento teria o custo anual de US$ 600 bilhões, dos quais US$ 125 bilhões seriam financiados pelos países desenvolvidos. Como o dinheiro nunca chegou, a conta subiu feito um foguete.
Recentemente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, divulgou um relatório com propostas para que finalmente esses recursos possam entrar nos cofres dos países em desenvolvimento. O documento foi elaborado no âmbito do Círculo dos Ministros das Finanças da COP30, grupo formado por 35 países para facilitar a negociação do tema do financiamento climático na Conferência do Clima em Belém.
As propostas do relatório passam pela mobilização dos recursos dos bancos de desenvolvimento, bem como pela criação de soluções financeiras inovadoras para atrair trilhões em capital privado.
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Para ajudar o Brasil a mobilizar recursos públicos para atrair capital privado e aumentar o financiamento climático, o Instituto Escolhas acaba de lançar a proposta de um novo instrumento financeiro, a Letra de Desenvolvimento do Nordeste (LDN), capaz de alavancar R$ 10 bilhões para projetos de industrialização verde de grande porte, além de beneficiar projetos de relevância social e ambiental que não tenham acesso ao crédito em condições normais de mercado.
De acordo com a proposta elaborada pelos economistas Marcelo Tsuji, Cláudio Yokota e Carlos Manso, o Banco do Nordeste (BNB) define as características dos projetos a serem contemplados e repassa recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE) para os bancos comerciais interessados. Esses bancos estruturam a operação creditícia, aportando recursos adicionais e assumindo os riscos financeiros da operação.
A operação não traz nenhum risco para o Banco do Nordeste, por estar garantida pelos bancos comerciais, bastando a celebração de um contrato entre o BNB e essas instituições para que o repasse aconteça. O dinheiro repassado será recebido de volta com as taxas de juros previamente estabelecidas, assegurando a remuneração do BNB e os rendimentos dos recursos do FNE.
Esse modelo permite que os projetos de industrialização verde obtenham crédito de longo prazo e juros baixos, característica dos empréstimos com recursos do FNE, que são administrados pelo BNB. O banco tem interesse em usar o potencial energético das usinas eólicas e solares do Nordeste para atrair grandes empreendimentos, estratégia conhecida como "powershoring".
De acordo com a LDN, em contrapartida ao acesso aos recursos do FNE, os empreendedores devem promover projetos de alta relevância social e ambiental, como a restauração de áreas desmatadas nas margens dos rios e nascentes.
No semiárido, isso é uma ação fundamental para a adaptação à nova realidade climática. Além de remover carbono da atmosfera, a recomposição das matas protege os recursos hídricos e, dessa forma, serve como remédio contra a desertificação, que avança a passos largos sobre a Caatinga.
Estudos do Instituto Escolhas mostram que a recuperação da vegetação nas margens dos rios em assentamentos da reforma agrária localizados na Caatinga pode gerar 50,4 mil empregos e produzir 3 milhões de toneladas de alimentos no Rio Grande do Norte. No Ceará, serão criados 66 mil empregos e produzidas 3,6 milhões de toneladas de alimentos. No caso de Pernambuco, serão gerados 48 mil empregos e produzidas 2,8 milhões de toneladas de alimentos.
A LDN pode viabilizar esses resultados positivos. É uma proposta que o Brasil pode levar para a COP30 como um exemplo de instrumento inovador para direcionar capital público e privado para destravar o financiamento climático.

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