
Ninguém compra ingresso para o lançamento de um filme, um concerto ou peça de teatro sabendo como a história termina. Sim, em tempos de ansiedade e redes sociais, há mão de obra especializada em estragar o prazer alheio com spoilers. Existe também a turma do pensamento acelerado. O apressadinho viciado em ouvir áudios ou assistir a vídeos na maior velocidade possível para acabar logo, livrar-se. Males do nosso tempo. Estamos contemplando pouco e desfrutando menos ainda.
A final da Libertadores entre Palmeiras e Flamengo, hoje, às 18h, no Estádio Monumental, em Lima, no Peru, precisa ser apreciada em câmera lenta ou no modo slow motion, como prefere a turma da língua inglesa. Não sei qual dos dois times será o primeiro brasileiro tetra continental e tenho raiva de quem sabe. Peço perdão aos oniscientes deuses da bola, mas prefiro o suspense.
Por falar em divindades, lembro-me de uma conversa com Arthur Antunes Coimbra, o Zico, maior ídolo do Flamengo, sobre as decisões recentes da Libertadores. O Galinho tem uma tese sobre a era dos jogos únicos no principal torneio da América do Sul: a perda da concentração em uma fração de segundo tem definido o campeão muito mais do que bichos, táticas, preleções e os gritos à beira do campo ou da arquibancada.
Em 2019, na primeira final única, o Flamengo virou o jogo contra o River Plate devido a um erro individual. O zagueiro e capitão Javier Pinola, um dos melhores em campo até então, errou o domínio da bola no lançamento longo do meia Diego. Ele ajeita a bola e Gabriel Barbosa enche o pé esquerdo para estufar a rede, decretar a virada e o bicampeonato rubro-negro.
No ano seguinte, Alexi Stival, o Cuca, surta à beira do campo. O técnico do Santos atrai a atenção para si em um desentendimento com Marcos Rocha depois de tentar reter a bola para atrasar a sequência da partida, recebe cartão vermelho nos acréscimos do tempo regulamentar, distrai o time e na sequência vê o atacante Breno Lopes fazer o gol do bi do Palmeiras.
Na versão de 2021, a disputa pela Glória Eterna ficou marcada pelo erro individual de Andres Pereira. O meia era o melhor jogador do Flamengo no Estádio Centenário, em Montevidéu, no Uruguai, até tropeçar na bola e tê-la roubada por Deyverson. O centroavante fez 2 x 1 e assumiu o papel de protagonista do tricampeonato do Palmeiras.
A falta grave do volante Gregore em Fausto Vera, aos 29 segundos do primeiro tempo, deixou o Botafogo com 10 jogadores e obrigou o Botafogo a se desdobrar durante o jogo inteiro com um jogador a menos para derrotar o Atlético-MG em um triunfo épico.
Piscou, dançou. Filipe Luís foi alvo de Abel Ferreira em 2021. O português conta no livro Cabeça Fria, Coração Quente como o português tramou o lance do gol de Raphael Veiga justamente no setor esquerdo em cima de Bruno Henrique e de Filipe Luís. Não sei qual é a armadilha do dia nem quem vai errar. Só quero curtir a final. Que seja eterna enquanto dure.
