
Vinícius Pinheiro — diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para o Brasil
No balanço geral da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP30), realizada em Belém, uma entrega merece um destaque especial: a criação de um mecanismo de transição justa para apoiar os países na proteção dos trabalhadores e das comunidades à medida que transitam para energias limpas.
Esse avanço é uma demonstração concreta de que a crise climática transcendeu a esfera estritamente ambiental, consolidando-se como um desafio estrutural que afeta o futuro do trabalho em escala global. O aumento das temperaturas globais impõe uma ameaça direta ao bem-estar dos trabalhadores e à produtividade.
- Leia também: Adeus ao novembro inesquecível
Segundo estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 70% da força de trabalho no mundo pode ser afetada pelo chamado estresse térmico derivado das mudanças climáticas. As consequências são graves e multidimensionais, abrangendo o aumento de doenças cardiovasculares, de pele, renais, respiratórias e a deterioração da saúde mental, além da expansão de vetores de doenças transmissíveis. A dimensão econômica dessa vulnerabilidade também é alarmante. O custo em horas de trabalho perdidas pode chegar a US$ 2,4 trilhões em 2030, ou cerca de 1% do PIB mundial.
Diante desse cenário, o imperativo de uma transição justa para um modelo de desenvolvimento sustentável emerge como a única via equitativa e eficaz. É crucial ressaltar que essa transição não é apenas uma necessidade de mitigação; é uma fonte substancial de oportunidades.
- Leia também: Um ciclo se fechou
O setor de energias renováveis tem se mostrado como um dos mais dinâmicos do mundo, batendo recordes de geração de emprego a cada ano. Os últimos dados do relatório da Agência Internacional de Energia Renovável (Irena) e da OIT mostram que, em 2023, o número de empregos no setor de energias renováveis chegou ao nível recorde de 16,2 milhões, um salto de 18% na comparação ao ano anterior, liderado por economias como China, União Europeia e Brasil.
Celebrado com entusiasmo em Belém na plenária de encerramento da COP 30, o texto dedicado à transição justa coloca formalmente o tema do trabalho no centro da governança climática global, ao decidir pela criação de um mecanismo, a ser entregue na próxima COP31, que deverá considerar, em particular, quatro pontos fundamentais.
Primeiro, a promoção do diálogo social, dos direitos trabalhistas e do trabalho decente como elementos fundacionais da transição. Segundo, o reforço dos direitos humanos e a necessidade de inclusão e participação plena de grupos vulneráveis afetados, incluindo mulheres, povos indígenas, pessoas com deficiência, migrantes e trabalhadores na economia informal.
- Leia também: A fixação pelo atraso: o caso do delivery
Terceiro, a importância da adequação dos sistemas educacionais e de formação profissional para responder às necessidades de transição no mercado de trabalho e necessidade de engajamento do setor privado, em especial das micro e pequenas empresas. E, finalmente, a promoção da extensão de sistemas de proteção social e a formalização do emprego, além do reconhecimento da importância da economia de cuidados.
O texto ressaltou, ainda, o papel essencial das Diretrizes da OIT para uma Transição Justa e do Acelerador Global das Nações Unidas para Empregos e Proteção Social, sinalizando um alinhamento inédito entre a agenda climática e a agenda social.
A participação ativa de atores do mundo do trabalho — ministérios do trabalho, organizações de empregadores e de trabalhadores — na COP30 reforçou a compreensão de que a estabilidade do clima é inseparável da estabilidade e da dignidade laboral.
A "transição justa" não é uma opção, mas uma exigência ética e econômica para garantir que a crise climática não se converta em uma crise social e de emprego. O desafio reside agora na implementação eficaz e financiada desses compromissos, assegurando que o desenvolvimento sustentável seja, de fato, um motor para a criação de emprego decente e para a realização da justiça social.

Opinião
Opinião
Opinião