ARTIGO

Por que o Brasil ainda não é uma potência turística?

O turismo gera empregos, dinamiza economias locais, fortalece identidades culturais e promove conservação ambiental. Um país com nosso potencial não pode continuar preso à improvisação

Parque Nacional do Iguaçu combina gestão privada e regulação pública -
Parque Nacional do Iguaçu combina gestão privada e regulação pública -

» RENATO DE SÁ TELES, Coordenador do PROFMAT/Unifesp-Diadema

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O Brasil é um país de dimensões continentais, com biodiversidade única, um vasto litoral e uma riqueza cultural que funde influências diversas. Temos o Pantanal, a Amazônia, o sertão, as Cataratas do Iguaçu, metrópoles vibrantes e cidades históricas. Em tese, possuímos todos os elementos para figurar entre as maiores potências turísticas. Entretanto, quando nos comparamos com o resto do mundo, o cenário revela um desperdício que se repete há décadas.

Em 2024, a França recebeu cerca de 100 milhões de visitantes. A Espanha atraiu aproximadamente 94 milhões, e o México, com 45 milhões, mostrou como planejamento consistente transforma ativos naturais e culturais em riqueza. O Brasil, mesmo registrando seu melhor resultado histórico — 7,68 milhões de turistas internacionais entre janeiro e outubro de 2025 —, permanece muito aquém de sua capacidade. A disparidade não é mero detalhe estatístico: ela simboliza uma incapacidade crônica de converter potencial evidente em desenvolvimento, empregos e receita.

O turismo é uma das atividades econômicas que mais geram emprego e distribuem renda, exigindo investimentos relativamente baixos por vaga criada. Cada real movimenta uma ampla cadeia econômica. Ainda assim, o país perde bilhões de dólares por não estruturar adequadamente esse setor, comprometendo a renda de curto prazo e, sobretudo, o desenvolvimento sustentável de regiões que poderiam ter no turismo sua principal vocação.

O cerne do problema está na gestão. Décadas de negligência, instabilidade institucional e burocracia excessiva impedem que parques, museus, praças e patrimônios recebam manutenção adequada. Em muitas regiões, o visitante encontra estruturas deterioradas, sinalização deficiente, serviços escassos e insegurança, fatores que prejudicam a experiência e afetam a imagem internacional do país.

Quando ativos públicos são administrados por concessões bem estruturadas, o contraste é evidente. O Parque Nacional do Iguaçu e o acesso ao Corcovado são exemplos de como a combinação entre gestão privada qualificada e regulação pública eficiente resulta em infraestrutura aprimorada, geração de empregos, aumento de arrecadação e preservação ambiental. Esses casos demonstram que ampliar concessões com responsabilidade é parte fundamental da solução, integrando, também, educação, conservação e participação comunitária.

Experiências regionais reforçam esse diagnóstico. Gramado e Blumenau construíram ecossistemas turísticos sólidos baseados em planejamento, empreendedorismo local e eventos de grande porte, como o "Natal Luz" e a "Oktoberfest". Esses municípios mostram que continuidade e profissionalização transformam destinos em motores econômicos e culturais.

Outro obstáculo estrutural é a precariedade do transporte. Apesar dos 21,1 milhões de deslocamentos domésticos em 2023, viajar pelo país continua caro e limitado. O preço médio das passagens aéreas está entre os mais altos da América Latina e faltam alternativas eficientes. O Brasil carece de uma rede ferroviária moderna que conecte regiões turísticas; não possui linhas marítimas regulares de transporte de passageiros em seu litoral; e tampouco desenvolveu uma política integrada de mobilidade turística que garanta deslocamentos mais baratos, seguros e sustentáveis.

A ausência de trens de passageiros é grave. Em países que levam o turismo a sério, o trem é parte da experiência. Aqui, poucas linhas sobrevivem. A ligação Curitiba-Morretes, considerada uma das viagens ferroviárias mais belas do mundo, comprova que turismo e trilhos funcionam juntos e geram receita. O mesmo vale para a Amazônia: abandonar a malha fluvial é desperdiçar o modal mais adequado, sustentável e integrado à realidade regional, justamente no momento em que o ecoturismo cresce globalmente.

Superar esse quadro exige abandonar ações fragmentadas e construir uma política nacional contínua, com metas claras e investimentos garantidos. O Brasil precisa recuperar e conceder patrimônios com regulação eficiente; investir em aeroportos regionais; reintroduzir e modernizar o transporte ferroviário e fluvial; qualificar profissionais; promover o país de forma estratégica; e estimular o turismo interno com alternativas de mobilidade acessíveis.

O turismo gera empregos, dinamiza economias locais, fortalece identidades culturais e promove conservação ambiental. Um país com nosso potencial não pode continuar preso à improvisação. Ainda há tempo para mudar — falta apenas coragem política e compromisso com um pacto nacional que trate o turismo como prioridade estratégica.

 

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Por Opinião
postado em 15/12/2025 05:08
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