José Natal — jornalista
Há quem diga, com acentuada dose de ironia, que o deputado Hugo Motta, ao assumir a presidência da Câmara dos Deputados, em fevereiro deste ano, tinha em mente que, para ele, Brasília tinha o peso político de João Pessoa, capital de seu estado, e o Brasil era o seu universo particular. Não vai aqui nenhum desrespeito à agradabilíssima capital nordestina, nem ao estado paraibano, xodó das tradições brasileiras, querido e amado por quem o conhece e o visita. Trata-se apenas, e com isso todos concordam, de uma aparente falta de dimensionamento da grandeza que o ato representa.
Segundo especialistas, e na leitura de quem entende de ciência política, Motta parece ter um dia sonhado ser piloto de Fórmula 1, mas, na autoescola, se limitou a aprender a dirigir veículos para amadores. Fácil entender a avaliação pessimista, ou negativa, que alguns fazem do parlamentar. Numa filtragem honesta, e severa, das atitudes e providências adotadas por ele no comando da Casa desde sua posse, a contagem de pontos não lhe dá o conforto de continuar na série A, fosse isso uma competição esportiva.
Ali, para se manter no posto, se exige coerência, competência e coragem para atacar e requer sabedoria e estatura para se defender. É visível, e quase palpável, a dificuldade do parlamentar no tratamento de questões de importância fundamental para o bom andamento do ambiente político e institucional, muitas vezes gerando reações incrivelmente desproporcionais, com reflexos no Parlamento e em outros Poderes.
Hoje, com 36 anos, Hugo Motta é o mais novo deputado a ocupar a presidência da casa. Antes dele, com 39 anos e conceituação política infinitamente diferente, Luís Eduardo Magalhães, precocemente falecido em 12 de abril de 1998, ocupou o cargo de 2 de fevereiro de 1995 a 5 de fevereiro de 1997, enaltecido, à época, por seus colegas de governo e oposição, como talentoso e sensível às demandas do Parlamento. No cargo desde o começo do ano, Motta (que também é médico) parece não ter encontrado ainda os mecanismos de ação que o retirem de uma constante e insistente turbulência administrativa.
Episódios recentes, como aqueles da ocupação da mesa da presidência da Casa e a decisão de votação de pedidos de cassação de parlamentares de forma açodada e desprovida de justas argumentações, estão frescos na memória de quem trafega pelo universo político. Também estão no painel de lembranças as cenas de gestos agressivos do deputado Glauber Braga, quando, em protesto, se apoderou da cadeira da presidência.
Mesmo sem o DNA de sua culpa no apagão das câmeras de filmagens do plenário da casa, cenário de tumulto, sopapos e outras "gentilezas" inéditas em ambiente onde se prega a harmonia, a digital de comando será sempre dele. Ou por descaso, ou por omissão. Como sempre acontece, e como tem que ser, a tropa de choque em defesa da causa atua em todas as frentes.
O corporativismo por ali, quando se trata de defender território abrangente, é impecavelmente eficiente. Ao contrário do que muitos imaginam, nada disso é encarado com muita preocupação. O palco aceita atores de todas as vertentes e, por mais que a mídia insista em escancarar verdades secretas, a indignação não dura mais do que algumas horas. Saudosistas — ou iludidos, como alguns são taxados — lamentam que o local que deveria ser um verdadeiro e real espantalho de mazelas e aves rapinas cada vez mais as receba com simpatia singular e comoventes votos de boas-vindas.
Como de hábito, em todo país democrático, os debates, as análises e as decisões que visem o bem comum da sociedade começam pela Câmara dos Deputados e, de lá, seguem seu curso. Motivo mais do que essencial e obrigatório para que quem a comanda se apodere de reflexões, autocrítica e busque, no balaio de informações, alguns rabiscos que lhe sirvam de orientação, bom senso e, mais do que nunca, eficiência e gestão imparcial.
Empossado no cargo afirmando ser profundo admirador e um dedicado seguidor dos ensinamentos de Ulysses Guimarães, exemplo inigualável do político brasileiro, Hugo Motta deve ter entendido bem o que isso representa. O tempo dirá.
