Bolsonaro diz que hidroxicloroquina poderia evitar os 100 mil mortos por covid

Presidente diz ser ''a prova viva'' de que o medicamento funciona, a despeito de não haver nenhuma comprovação científica da eficácia do remédio contra o novo coronavírus

Ingrid Soares
Augusto Fernandes
postado em 13/08/2020 12:13 / atualizado em 13/08/2020 12:30
 (crédito: Alan Santos/PR)
(crédito: Alan Santos/PR)

O presidente Jair Bolsonaro falou, nesta quinta-feira (13/8), pela primeira vez sobre a marca de mais de 100 mil mortos por covid-19 no Brasil desde que o número foi atingido no último fim de semana. Contudo, em vez de se solidarizar com as famílias das 104.201 vítimas da pandemia no país até o momento, ele disse que todos os óbitos seriam evitados caso os pacientes tivessem se medicado com hidroxicloroquina desde o início do diagnóstico.

Mesmo reconhecendo que não nenhum estudo científico que comprove a eficácia da medicação contra a covid-19, o presidente comentou que ele é a "prova viva" de que o remédio pode combater a enfermidade. Em julho, Bolsonaro contraiu o novo coronavírus e fez um tratamento à base da hidroxicloroquina. Ele recebeu o diagnóstico em 7 de julho e se disse curado da doença em 25 de julho.

A fala do presidente aconteceu durante cerimônia, em Belém (PA), que marcou a inauguração do Parque Urbano Belém Porto Futuro. “Destinamos a esse estado maravilhoso, mesmo sem comprovação científica, mais de 400 mil unidades de hidroxicloroquina para o tratamento precoce da população. Sou a prova viva que deu certo. Muitos médicos defendem esse tratamento e sabemos que mais de 100 mil pessoas morreram no Brasil. Caso tivessem sido tratadas lá atrás, poderiam essas vidas terem sido evitadas. E mais ainda: aqueles que criticaram a hidroxicloroquina não apresentaram alternativa”, declarou Bolsonaro.

Crise sanitária

Durante o discurso, Bolsonaro também destacou que o governo federal destinou apenas para o Pará mais de R$ 2 bilhões para ações de combate ao novo coronavírus. Ele falou, ainda, sobre os prejuízos que a crise sanitária pode causar para a economia do Brasil no futuro.

“Desde o início eu já dizia: temos dois problemas pela frente. O vírus e o desemprego. E ambos devem ser tratados com a devida responsabilidade. Nessa esteira, o governo rolou dívidas, adiantou recursos, compensou perdas de ICMS e de ISS para estados e municípios, combatemos o desemprego. Sabemos que a vida não tem preço, mas o desemprego leva à depressão e leva também à doença e à morte”, frisou o chefe do Executivo.

Estudos

Apesar da fala do presidente, o país já registrou casos de pessoas que contraíram a covid-19 e morreram mesmo depois de usarem hidroxicloroquina. Uma das vítimas foi o deputado estadual fluminense Gil Vianna (PSL-RJ), aliado de Bolsonaro, que morreu em maio. Um mês antes, o médico baiano Gilmar Calasans Lima também teve a vida interrompida em decorrência do novo coronavírus. Ele fazia um tratamento em que combinava a hidroxicloroquina com a azitromicina.

No mês passado, a maior pesquisa conduzida no Brasil sobre o uso da hidroxicloroquina para tratar a covid-19, feita pelo grupo Coalizão Covid-19 Brasil, mostrou que o medicamento é ineficaz em casos leves e moderados da doença. Além disso, o remédio não reduz a taxa de óbito e está ligado a maior risco de arritmia e lesão hepática.

Participaram da pesquisa 667 pacientes, com em média 50 anos, atendidos em 55 hospitais brasileiros. Por sorteio, os voluntários foram divididos em três grupos: 217 receberam a combinação de hidroxicloroquina, azitromicina e suporte clínico padrão; 221, hidroxicloroquina mais suporte clínico padrão; e 227, apenas suporte clínico padrão (grupo controle). Quinze dias depois do tratamento, que durou uma semana, os cientistas concluíram que as duas primeiras abordagens não promoveram melhoria na evolução clínica dos pacientes.

Quanto aos efeitos adversos, dois fenômenos chamaram a atenção dos pesquisadores. Pacientes tratados com a hidroxicloroquina, com ou sem azitromicina, apresentaram alterações mais frequentes nos eletrocardiogramas, que sinalizam maior risco de ocorrência de arritmias. O mesmo ocorreu em exames de sangue que indicam o risco de lesão hepática.

O grupo está à frente de outro estudo que avalia se a hidroxicloroquina previne o agravamento da covid-19 em pacientes que não precisam de internação hospitalar. Nesse caso, 454 pessoas são acompanhadas. Essas análises ainda não foram concluídas, mas os pesquisadores esperam uma resposta semelhante à da primeira pesquisa.

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