Decisão

STJ mantém afastamento de Wilson Witzel do governo do Rio de Janeiro

Colegiado decidiu, por 14 votos a 1, que governador deve ficar afastado, confirmando determinação da semana passada do ministro Benedito Gonçalves

Sarah Teófilo
postado em 02/09/2020 18:33 / atualizado em 02/09/2020 21:10
 (crédito: Mauro Pimentel/AFP)
(crédito: Mauro Pimentel/AFP)

Por 14 votos a 1, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta quarta-feira (2/9) pela manutenção do afastamento do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), confirmando decisão do ministro relator, Benedito Gonçalves. Na última sexta-feira (28), o ministro determinou de forma monocrática (individual) pelo afastamento do gestor estadual pelo prazo de 180 dias e, em seguida, levou a questão à discussão do colegiado.

A Corte Especial é formada por 15 ministros, incluindo o presidente, Humberto Martins. Apenas o ministro Napoleão Nunes Maia Filho teve voto favorável ao governador. O ministro criticou a ação da Corte, pontuando que ao afastá-lo desta forma já estavam "julgando e condenando o governador". Para ele, o STJ está atuando em uma área que é de competência do Legislativo.

 "Os políticos que devem cuidar das coisas de política. Nós, magistrados, devemos cuidar das coisas da Justiça", disse. Assim, no entendimento de Napoleão, a questão cabe à análise da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), onde há um processo de impeachment contra Witzel.

O restante dos ministros, no entanto, viram as suspeitas contra Witzel como fortes e graves. Francisco Falcão, por exemplo, pontuou que os fatos “merecem apuração”, lembrando que o país vive um cenário de pandemia em que mais de 123 mil pessoas morreram de covid-19. “É impossível que alguém que esteja sendo acusado e investigado possa continuar a exercer um cargo tão importante, de maior dirigente do estado do Rio de Janeiro”, disse.

Nancy Andrighi ressaltou a robustez da investigação, dizendo que uma das cautelares possui 12 mil páginas e o pedido do MPF, 485 páginas. De acordo com ela, o afastamento do governador é “cabível e suficiente para garantir a ordem pública e a instrução criminal”.

Os ministros Maria Thereza de Assis Moura e Raul Araújo seguiram o relator, mas fizeram um contraponto em relação à decisão de Benedito, afirmando que ela deveria ter sido discutida pelo colegiado, e não poderia ter sido tomada de forma individual.

"Trata-se aqui de governador de estado, eleito com mais de 4,6 milhões de votos. Embora exista expressa previsão regimental acerca da possibilidade da concessão de forma monocrática, como fez o relator, acredito que em se tratando do afastamento de autoridade com prerrogativa de foro, eleita pelo voto popular, a submissão dessa matéria à corte especial constitui a meu ver uma medida de prudência, que me parece, ostenta maior compatibilidade com o princípio democrático", disse Thereza.

O relator, por sua vez, citou em seu voto o Código de Processo Penal (CPP), dizendo que ele prevê cautelares, e frisou que tomou a decisão perante à urgência da matéria. No dia em que o ministro determinou o afastamento de Witzel, foi realizada a operação do Ministério Público Federal (MPF), em parceria com Polícia Federal e Receita Federal.

O ministro Og Fernandes, ao proferir seu voto, avaliou como adequada a decisão do colega relator. "Às vezes nós apanhamos da caneta ou do computador para firmar uma decisão que nós não gostaríamos como pessoas de ter que tomar. E é exatamente porque nós não somos eleitos pelo voto popular que a nossa legitimidade como poder do Estado se estabelece exatamente pela possibilidade de decidirmos matérias sem sofrermos o ônus de uma consequência popular ou populista", disse.


180 dias

O ministro Raul Araújo afirmou que as denúncias “maculam” a imagem de Witzel, e que pela gravidade, o afastamento se justifica. Ele ponderou, no entanto, que o afastamento não precisaria durar 180 dias. O presidente Humberto Martins colocou o tema a ser discutido ao final da sessão, mas o relator manteve o prazo e foi seguido pelos colegas.


Um dos integrantes, Sérgio Kukina, ao seguir o voto do relator, foi além, opinando que o governador deveria ser preso preventivamente, como foi solicitado pelo MPF. Ele frisou que na denúncia o órgão de investigação apontou que Witzel seria o "cabeça da sofisticada organização criminosa" - o que ele diz concordar, com base no que há na denúncia.

Em seu perfil na rede social Twitter, Witzel disse compreender “a conduta dos magistrados diante da gravidade dos fatos apresentados”. “Mas, reafirmo que jamais cometi atos ilícitos. Não recebi qualquer valor desviado dos cofres públicos, o que foi comprovado na busca e apreensão. Continuarei trabalhando na minha defesa para demonstrar a verdade e tenho plena confiança em um julgamento justo”, escreveu.

Eleito vice-governador do estado, Cláudio Castro (PSC) se mantém como governador em exercício. Diferente de Witzel, sua relação não é de embate com a família Bolsonaro.


Denúncias

Witzel foi afastado no âmbito da operação Tris in Idem, com atuação do MPF e PF. Na ocasião, foram cumpridos ainda mandados de busca e apreensão contra o governador, o vice-governador, Cláudio Castro, e o presidente da Alerj, André Ceciliano (PT).

A investigação aponta, segundo o MPF, que a partir da eleição de Witzel, se estruturou uma organização criminosa no governo, dividida em três grupos, que disputavam o poder por meio de pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos. Eles seriam liderados por empresários e lotearam secretarias estaduais, como a da Saúde.

Conforme apurado, o governador teria recebido propinas e utilizado o escritório de advocacia da sua esposa, Helena Witzel, para lavagem de dinheiro.


Julgamento sigiloso

A defesa de Witzel pediu para que sessão ocorresse internamente, em sigilo, sem transmissão ao vivo pelo YouTube. O relator, Benedito Gonçalves, frisou que se fosse feita presencialmente, a sessão seria pública, e que em tempos de pandemia, fazer a transmissão ao vivo em plataforma aberta é a forma de dar publicidade ao processo.


Impedidos

Declararam-se impedidos para o julgamento quatro ministros: Felix Fischer (ex-assessor advoga para pessoas investigadas na operação que resultou no afastamento de Witzel), João Otávio de Noronha (filha advoga para pessoas investigadas na mesma operação), Herman Benjamin e Jorge Mussi. Os ministros convocados para o lugar deles são: Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva e Marco Buzzi.

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