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Lava-Jato é para os outros, diz Bolsonaro; força-tarefa lamenta declarações

Ao explicar por que "acabou" com a força-tarefa, presidente diz que o combate à corrupção não se aplica a seu governo. Em alerta a governadores, cita o "Covidão". Procuradores de Curitiba lamentam as declarações do chefe do Executivo

Jorge Vasconcellos
Ingrid Soares
Augusto Fernandes
postado em 09/10/2020 06:00 / atualizado em 09/10/2020 06:17
 (crédito: Marcos Correa/pr)
(crédito: Marcos Correa/pr)

Eleito presidente da República em 2018 com o apoio irrestrito à Operação Lava-Jato e o compromisso de combater a corrupção, Jair Bolsonaro envolveu-se em mais uma controvérsia em relação à força-tarefa. Na quarta-feira, o presidente referiu-se à operação nestes termos. “É um orgulho, é uma satisfação que eu tenho, dizer a essa imprensa maravilhosa que eu não quero acabar com a Lava-Jato. Eu acabei com a Lava-Jato, porque não tem mais corrupção no governo.”

Ontem, membros da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba afirmaram, em nota, que declarações de Bolsonaro sobre o fim da operação refletem “desconhecimento” e reforçam a “percepção sobre a ausência de efetivo comprometimento com o fortalecimento dos mecanismos de combate à corrupção” por parte do governo federal.

“Os membros do Ministério Público Federal integrantes da força-tarefa da Lava-Jato no Paraná lamentam a fala do Presidente da República sobre ter 'acabado' com a operação Lava-Jato. O discurso indica desconhecimento sobre a atualidade dos trabalhos e a necessidade de sua continuidade e, sobretudo, reforça a percepção sobre a ausência de efetivo comprometimento com o fortalecimento dos mecanismos de combate à corrupção”, diz um trecho do comunicado.

“A Lava-Jato é uma ação conjunta de várias instituições de Estado no combate a uma corrupção endêmica e, conforme demonstram as últimas fases dos trabalhos, ainda se faz essencialmente necessária. Ainda ontem (7), na mesma data da declaração do Presidente, foi deflagrada a 76ª fase da operação, na qual houve a apreensão do equivalente a quase R$ 4 milhões em espécie em endereços de investigado pela prática de delitos contra a Petrobras”, acrescenta a nota.

Ainda segundo o texto, os procuradores reforçam o compromisso com o combate à corrupção e a defesa da coisa pública, “papel constitucional do Ministério Público, apesar de forças poderosas em sentido contrário”.

“Figura de linguagem”

Atento à repercussão de suas declarações sobre a Lava-Jato junto a parte de seu eleitorado, Bolsonaro retomou o assunto. Ontem, durante uma live, o presidente procurou explicar o que diz dizer na quarta-feira. E, de novo, criticou a imprensa. “Vou tocar pela última vez no assunto de 'acabei com a Lava-Jato'. É impressionante a hipocrisia de muita gente, de grande parte da imprensa. No meu governo não tem mais Lava-Jato; nós não temos nenhuma notícia de corrupção. Para nós, a Lava-Jato não tem finalidade, graças a Deus. Agora, para os demais órgãos do Brasil, alguns municípios e estados, vai continuar funcionando normalmente. Ontem (quarta-feira) mesmo tivemos Operação Lava-Jato, quase diariamente temos. O Covidão nem começou ainda. Tem estados aí que o governador já recebeu três visitas da PF. Então, o pessoal fala que eu estou acabando com a Lava-Jato. Quem fala isso aí ou é desinformado ou está agindo de má-fé, ou está com dor de cotovelo. Um ano e dois meses sem corrupção em nosso governo. O cara fala: 'É obrigação'. Eu sei que é obrigação, mas no passado vocês não tinham isso”, destacou.

E acrescentou: “Acabei com a Lava-Jato? Isso é para pessoas, obviamente, que como disse, não conseguem acompanhar o raciocínio, uma figura de linguagem que a gente usa. Tenho muito orgulho de estar à frente do Executivo com 23 ministros no qual nenhuma suspeita de corrupção, até o momento, pairou sobre nós”, assegurou.

Ataque a Moro

Os comentários de Bolsonaro em relação à Lava-Jato reacendeu a rivalidade entre ele e o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro, que foi um dos principais símbolos da operação à época em que atuou como juiz federal em Curitiba. Depois da declaração do presidente, Moro reagiu em uma rede social dizendo que “as tentativas de acabar com a Lava-Jato representam a volta da corrupção”. “É o triunfo da velha política e dos esquemas que destroem o Brasil e fragilizam a economia e a democracia. Esse filme é conhecido. Valerá a pena se transformar em uma criatura do pântano pelo poder?”, ponderou Moro.

Em resposta, Bolsonaro disse ontem pela manhã que, atualmente, tem um ministro da Justiça e Segurança Pública muito melhor do que Moro. “Temos um compromisso de combate à corrupção. Eu tenho colaborado com a Polícia Federal, ajudando ao escolher ministros não por critério político ou por apadrinhamentos, mas por critério de competência, como temos o ministro da Justiça André Mendonça. Me desculpem, muito, mas muito melhor do que outro (Moro) que nos deixou há pouco tempo. A prova está aí: recorde de apreensão de drogas, de recursos e de prisões de bandidos, entre outros”, afirmou o presidente, durante cerimônia de encerramento do curso de formação profissional de agentes da Polícia Federal.

As investidas de Bolsonaro contra o ex-ministro acontecem desde abril, quando Moro deixou o governo acusando o presidente de tentar interferir na Polícia Federal. Os dois entraram em conflito por conta da vontade do chefe do Executivo de querer promover mudanças na superintendência da corporação no Rio de Janeiro, onde um dos filhos dele, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), é alvo de uma investigação pela suposta prática de rachadinha quando era deputado estadual no Rio.

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