A situação do deputado Rodrigo Maia (RJ) no DEM ficou insustentável, depois de uma troca de acusações com o presidente do partido, ACM Neto, e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM). Inconformado por ter sido abandonado pela sigla na eleição para a presidência da Câmara, ele disse que Neto entregou "a nossa cabeça numa bandeja para o Planalto". Afirmou também que pedirá desfiliação do DEM para fazer oposição ao presidente Jair Bolsonaro.
“O partido voltou ao que era na década de 1980, para antes da redemocratização, quando o presidente do partido aceita inclusive apoiar o Bolsonaro”, disse o ex-presidente da Câmara, em entrevista ao jornal Valor Econômico, publicada nesta segunda-feira (8/2). Maia acrescentou que “o DEM decidiu majoritariamente por um caminho, voltando a ser de direita ou extrema-direita, que é ser um aliado de Bolsonaro”.
O deputado responsabiliza o DEM pela derrota de Baleia Rossi (MDB-SP) na eleição na Câmara. Na ocasião, o partido decidiu adotar a neutralidade, abandonando o bloco criado por Maia em torno da candidatura de Rossi. Com votos da maioria dos deputados do DEM, Arthur Lira (PP-AL), apoiado por Bolsonaro, venceu a disputa.
Durante a entrevista, Maia afirma que vai fazer o pedido de desfiliação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para “dormir tranquilo”. "Hoje posso dizer que sou oposição ao presidente Bolsonaro. Quando era presidente da Câmara, não podia dizer. Mas agora quero um partido que eu possa dormir tranquilo de que não apoiará [o presidente]", disse.
Maia afirmou também que "falta caráter" a ACM Neto e a Caiado. “Foi um processo muito feito do Neto e do Caiado. Ficar contra é legítimo, falar uma coisa e fazer outra não. Falta caráter, né?”, afirmou.
Na entrevista, o parlamentar disse que a criação do bloco em torno da candidatura de Baleia Rossi foi discutida com o ACM Neto e com o líder da bancada na Câmara, Efraim Filho (DEM-PB). Segundo ele, ambos trataram a ideia como uma das estratégias para viabilizar também a eleição do candidato Rodrigo Pacheco (DEM-MG) no Senado, esvaziando uma possível frente do MDB em favor de Simone Tebet (MDB-MS).
Rodrigo Maia diz ainda que percebeu a "traição" do DEM em 31 de janeiro, um dia antes da eleição, durante reunião de líderes. “Não podia imaginar que um amigo de 20 anos ia fazer um negócio desses”, disse Maia sobre ACM Neto. “Mesmo a gente tendo feito o movimento que interessava ao candidato dele no Senado, ele entregou a nossa cabeça numa bandeja ao Palácio do Planalto.”
O ex-presidente da Câmara disse que os líderes estão transformando o DEM em “um partido sem posição”. Ele fez essa declaração ao criticar uma entevista em que ACM Neto diz que pode ir “do Bolsonaro ao Ciro Gomes” — e sem projeto de país. “Deste partido eu não tenho mais como participar porque não acredito que esse governo tenha um projeto primeiro, democrático, e, segundo, de país”, afirmou o deputado.
Ele também não descartou a possibilidade de uma aproximação ainda maior entre o partido e o presidente da República. “Não descarto nem a hipótese de Bolsonaro acabar filiado ao DEM”, disse Maia.
O deputado ainda não decidiu sobre o partido ao qual pretende se filiar após deixar o DEM. No domingo, ele se encontrou com o governador de São Paulo, João Doria, que o convidou para ingressar no PSDB. O parlamentar também vem conversando com o Cidadania e com o PSL.
Risco
Caso Maia decida deixar o DEM, ele poderá correr o risco de perder o mandato. A Justiça Eleitoral entende que, nos cargos do sistema proporcional (vereadores e deputados estaduais e federais), o mandato pertence ao partido. Essa perda só não ocorre quando o parlamentar comprova que deixa a legenda por uma justa causa, como por exemplo, mudança de conteúdo programático e perseguição pessoal.
As declarações do ex-presidente da Câmara foram rebatidas por ACM Neto, que divulgou uma nota. Segundo ele, Maia tenta transferir a responsabilidade por seus erros políticos para a presidência do partido após ter tentado, até a última hora, “conseguir o aval do Supremo Tribunal Federal (STF) para se perpetuar no cargo de presidente da Câmara”.
“Infelizmente, o deputado Rodrigo Maia tenta transferir para a presidência do Democratas a responsabilidade pelos erros que ele próprio cometeu durante a condução do processo de eleição da Mesa Diretora da Câmara”, diz a nota do presidente do DEM. “No empenho em transferir as responsabilidades pelo seu fracasso, Rodrigo Maia tenta negar que insistiu, até o último momento, na possibilidade de conseguir o aval do Supremo Tribunal Federal (STF) para se perpetuar no cargo de presidente da Câmara”, acrescenta o comunicado.
ACM Neto diz também que “todos sabem que Rodrigo Maia tinha um único candidato à presidência da Câmara, que era ele mesmo. Quando o STF derrubou a possibilidade de reeleição, o deputado perdeu força para conduzir sua sucessão e chegou ao final do processo contando com o apoio de apenas um terço da bancada do seu próprio partido”.
A nota do ex-prefeito de Salvador (BA) afirma que "Rodrigo, que tinha a fama de grande articulador, fracassou nessa empreitada. Essa é a realidade". E acrescenta: "Ao invés de escutar quem sempre esteve ao seu lado, e fazer com serenidade e honestidade o exercício da autocrítica, o deputado Rodrigo Maia se encastelou no poder conquistado e, agora, demonstra surpreendente descontrole. A falta de grandeza e a deslealdade causam profundo estranhamento".
O líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), respondeu, por meio de nota, às declarações do ex-presidente da Câmara. Ele disse que Maia merece respeito mas que sua saída do DEM irá pacificar a legenda. Ele afirma também que "o Democratas é um partido plural e não tem dono", que "a bancada da Câmara não tem dono".
"O líder é eleito pela vontade expressa da maioria. Essa mesma maioria, que torna a decisão legítima, faltou a Rodrigo Maia para compor o bloco de centro-esquerda na disputa pela presidência", diz o líder do DEM. "Na verdade, ao tentar levar o partido para essa posição, sem consultar a bancada sobre o que desejava, Rodrigo se viu isolado e perdeu o comando do processo, e muitas vezes o alertamos sobre essa dificuldade. Era a sua sucessão, cabia a ele construir os consensos e conduzir o processo. Na democracia, maioria não se impõe, maioria se conquista", acrescenta.
Para Caiado, Maia ataca porque não conseguiu ainda superar a perda de poder. “O deputado Rodrigo Maia, infelizmente, foi acometido por uma síndrome que atinge com muita frequência as pessoas que não aceitam deixar o poder: ‘síndrome da ansiedade de poder'”, diz Caiado. “A foto escolhida pelo Valor Econômico identifica a face de desequilíbrio do paciente. E o mais grave: ele faz questão de deixar claro que está saindo do Democratas e colocando seu nome a leilão. A sua entrevista não deve ser considerada pela classe política porque é indicadora de internação hospitalar”, acrescenta o governador de Goiás.
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