INFLUÊNCIA

Para jurista, produção de requerimentos da CPI no Palácio do Planalto é crime

Na CPI da Covid, senadores governistas protocolaram documentos que teriam sido elaborados pelo Executivo. Jurista ouvido pelo Correio afirma que ação configura crime de responsabilidade

Luiz Calcagno
postado em 29/04/2021 00:30 / atualizado em 29/04/2021 00:35
Pedidos de convocação de especialistas têm assinatura dos senadores Jorginho Mello (foto) e Ciro Nogueira -  (crédito: Waldemir Barreto/Agencia Senado)
Pedidos de convocação de especialistas têm assinatura dos senadores Jorginho Mello (foto) e Ciro Nogueira - (crédito: Waldemir Barreto/Agencia Senado)

Requerimentos de senadores governistas elaborados para a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid teriam sido produzidos em computadores do Palácio do Planalto. Ao menos é o que indicam registros eletrônicos referentes a sete documentos que convocam cinco especialistas para criticar o lockdown e defender o tratamento precoce nas sessões. A intervenção médica, amplamente propagandeada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), não tem eficácia comprovada.

Jorginho Mello (PL-SC) e Ciro Nogueira (PP-PI) são os senadores responsáveis por protocolar as convocações, que só passam a valer depois de votação em plenário. O registro dos documentos está em nome de uma funcionária da Secretaria de Governo. Entre os convocados aparecem a médica Nise Yamaguchi e o infectologista Francisco Eduardo Cardoso Alves — ambos defensores do uso da cloroquina para tratamento contra a covid-19.

Além deles, há o psicólogo e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Bruno Campello de Souza, crítico do lockdown; do médico do Hospital Militar de São Paulo Paulo Mácio Porto de Melo; e o prefeito de Chapecó (SC), João Rodrigues (PSD). Os parlamentares governistas apresentaram, ao todo, 14 requerimentos, sendo que só a metade deles foi elaborada no Senado, como revelado pelo jornal O Globo.

Para Renato Ribeiro, professor, advogado na área de direito eleitoral e integrante da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), o uso de equipamentos ou de funcionários do Executivo para conduzir ou influenciar os trabalhos de uma CPI corresponde a crime de responsabilidade praticado pelo presidente da República. "É uma intromissão indevida de um poder sobre o outro. Se fosse uma coisa que acontecesse em um país como os Estados Unidos, haveria reprimendas muito fortes. E o Brasil deveria adotar medidas cabíveis, pois o Executivo é fiscalizado pelo Legislativo. Ainda mais em uma CPI voltada para essa investigação", criticou.

O jurista destaca que, ao ordenar, possibilitar ou permitir que os requerimentos fossem produzidos pelo Executivo para serem protocolados em nome dos senadores, o presidente viola a Constituição Federal, por impedir "o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e Poderes Constitucionais das unidades da Federação".

Questionado sobre a liberdade de parlamentares governistas protocolarem requerimentos sob orientação do governo para defender o presidente, por exemplo, Renato Ribeiro explicou que a forma é fundamental nesse caso: "Você pode ser governista, apoiar o governo federal, ter atitudes para blindar o governo, mas isso não pode ser suficiente para as pessoas usarem instrumentos do próprio governo na colocação da verdade. É o uso de equipamentos para frustrar uma investigação ou favorecer o interesse do governo (pelo colegiado que o fiscaliza). Para fazer isso do próprio gabinete, o parlamentar é livre e tem estrutura para fazê-lo", destacou o advogado.

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