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Polícia Federal investiga esquema criminoso no fundo de pensão dos Correios

Operação Amigo Germânico, da PF, investiga crimes como lavagem de dinheiro, formação de organização criminosa, fraudes contra o sistema financeiro e corrupção cometidos contra o fundo de pensão dos funcionários dos Correios. Rombo é calculado em mais de R$ 16 milhões

Luana Patriolino
postado em 18/09/2021 06:00 / atualizado em 20/09/2021 13:57
Quadrilha que agia no Postalis criou um fundo de investimento e contou com o conluio de profissionais que emitiram pareceres jurídicos -  (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press - 5/9/16)
Quadrilha que agia no Postalis criou um fundo de investimento e contou com o conluio de profissionais que emitiram pareceres jurídicos - (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press - 5/9/16)

A Polícia Federal deflagrou, ontem, a Operação Amigo Germânico para investigar os crimes de lavagem de dinheiro, organização criminosa, crimes contra o sistema financeiro nacional e corrupção cometidos contra o Postalis, fundo de pensão dos Correios. A fraude consistia em que os gestores recebessem uma espécie de comissão em troca da indicação de empresas para gerir os ativos e atuar no aconselhamento técnico-jurídico da entidade.

Um efetivo de 44 agentes cumpriu 19 mandados de busca e apreensão no Distrito Federal, Paraná e em São Paulo. As apurações foram desenvolvidas em parceria com o Ministério Público Federal. As ordens foram expedidas pela Justiça Federal, que também determinou o bloqueio de bens dos investigados, até o valor de R$ 16.147.968,14 — montante que corresponde ao prejuízo já apurado pelos investigadores.

De acordo com a PF, após a criação de quatro Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios Não Padronizados (FIDC NP), “diversos ativos do Postalis foram reprecificados em valor diferente de zero, quando deveriam ter sido reavaliados a valor zero”. Os gestores do Postalis recebiam dinheiro para indicar empresas que seriam escolhidas como administradoras dos recursos desses fundos.

Essas firmas indicadas direcionavam as taxas de rebate — uma espécie de comissão recebida por assessores de investimentos, corretoras, bancos ou gestores para distribuir os fundos de investimento — e os valores eram divididos entre os responsáveis pelas indicações. A investigação ainda identificou que foram direcionadas outras vantagens indevidas para os gestores do fundo de pensão.

De acordo com os investigadores, os alvos da operação “respaldaram seus atos em pareceres jurídicos elaborados por pessoas que possuíam interesse direto na indicação das empresas que, posteriormente, seriam escolhidas como gestora e administradora dos recursos dos FIDC NP”. “A referida operação, cujos prejuízos foram previamente admitidos pelos alvos investigados, implicou no agravamento da situação já deficitária da entidade”, disse a PF, em nota. O nome da operação faz referência ao codinome de um dos investigados, que era referenciado pelos demais membros do grupo como “amigo alemão”.

Em nota, os Correios afirmaram que a gestão atual mantém uma parceria com os órgãos de controle das instituições públicas e que firmou um acordo de cooperação técnica com a PF. O comunicado também destacou que a operação de ontem é um desdobramento de uma força-tarefa iniciada em 2018. A PF aponta que os investigados podem responder por crimes cujas penas somadas podem chegar a 42 anos de reclusão. (Com Agência Estado).

Prejuízos

Os fundos de pensão são uma opção de investimento que visa complementar a aposentadoria do trabalhador. “Muitas vezes, as empresas têm um programa de previdência complementar para dar uma turbinada nas aposentadorias dos seus ex-funcionários. Isso também acontece nas principais empresas públicas federais. Então, os funcionários dos Correios podem aderir a um programa de aposentadoria complementar da própria empresa”, explica Vinícius do Carmo, economista da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

O prejuízo do rombo é para os cotistas. “O risco de uma má gestão é que você põe em risco a aposentadoria de tantos funcionários que contribuíram para o fundo. Pode ser que haja um problema de liquidez lá na frente, se esses recursos forem mal geridos”, destaca André Braz, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O instituto de previdência complementar dos Correios tem registrado preocupações, além da série de investigações. Em abril de 2017, o Tribunal de Contas da União (TCU) identificou prejuízo de mais de R$ 1 bilhão nos fundos de investimentos que integram o Postalis. À época, o órgão determinou a indisponibilidade de bens por um ano dos ex-diretores e ex-membros do Comitê de Investimentos do instituto.

“O fundo de pensão é uma opção de investimento para o trabalhador complementar a sua aposentadoria. Ao desviar esses recursos os acusados estão lesando o trabalhador e acabando com o sonho e tranquilidade de uma aposentadoria digna”, explica o advogado tributarista Renato Mainardi.

Segundo o especialista, os investigados podem responder pelos crimes de gestão fraudulenta de instituição financeira, corrupção passiva e ativa, organização criminosa e de lavagem de dinheiro. “Além disso, esse tipo de crime lesa de alguma maneira a União, já que é uma empresa pública, caso a fraude seja comprovada, os acusados poderão ter que ressarcir a população brasileira”, afirma Mainardi.

 

Usina de escândalos

Criado em 1981 para oferecer o benefício da previdência complementar aos funcionários dos Correios, o Postalis tem aproximadamente 134 mil filiados, com um patrimônio de aproximadamente R$ 8,7 bilhões. No entanto, a entidade sofre com os frequentes escândalos de corrupção:

» Em 2014, o Postalis foi vítima de uma fraude de R$ 250 milhões relacionada à compra de dívidas públicas da Argentina e da Venezuela. O caso foi investigado pela CPI dos Fundos de Pensão, no Congresso;

» Em junho de 2017, André Motta, que ocupava a presidência do Postalis, renunciou ao cargo depois de ter sido acusado por um ex-executivo da Andrade Gutierrez, que fechou acordo de delação premiada na Operação Lava-Jato, de ter recebido propina em nome do ex-deputado Rogério Rosso;

» Em 2016, a Operação Greenfield, da Polícia Federal, se debruçou sobre irregularidades cometidas por vários fundos de pensão ligados a estatais, entre eles o Postalis, por meio de aplicações feitos em Fundos de Investimentos em Participações (FIP).

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