NAS ENTRELINHAS

Análise: Suspensão das emendas secretas foi um chega pra lá em Arthur Lira

Na segunda-feira, o presidente da Câmara solicitara uma audiência ao presidente do Supremo, Luiz Fux, para pressionar a Corte. Lira agiu como um velho "coronel" de Arapiraca (AL) a intimidar o juiz da comarca.

Luiz Carlos Azedo
postado em 10/11/2021 03:00
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

Embora não tenha encerrado o julgamento até o fechamento da coluna, por maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou a decisão provisória da ministra Rosa Weber que suspendeu as chamadas "emendas de relator" ao Orçamento da União, conhecidas como orçamento secreto, que estão sendo anabolizadas com aproximadamente R$ 20 bilhões pela PEC dos Precatórios.

É jogo jogado, mesmo que o julgamento venha a ser interrompido. Tecnicamente, garantiram a maioria os seguintes ministros: Rosa Weber, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes.

Foi um chega para lá no presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que, na segunda-feira, solicitara uma audiência ao presidente do Supremo, Luiz Fux, para pressionar a Corte. Lira agiu como um velho "coronel" de Arapiraca (AL) a intimidar o juiz da comarca.

Ao contrário das emendas individuais, que seguem critérios bem específicos e são divididas de forma equilibrada entre todos os parlamentares, as emendas de relator não seguem regras transparentes, são destinadas de forma arbitrária, no bojo de articulações de bastidor com propósitos eleitorais, sem fiscalização, o que também facilita superfaturamentos e desvios de recursos públicos. Arapiraca, reduto eleitoral do ex-senador Benedito Lira (PP), atual prefeito, e seu filho, que hoje preside a Câmara, foi o município mais contemplado com verbas federais.

A PEC dos Precatórios foi aprovada em primeira votação na semana passada, mas ainda restam emendas a serem apreciadas, além do segundo turno de votação (por se tratar de emenda constitucional, precisa ser aprovada duas vezes, na Câmara e, depois, no Senado).

Para obter 312 votos, quatro a mais do que os 308 necessários para modificar a Constituição, Lira contou com apoio de aliados nos partidos de oposição, o que provocou forte constrangimentos para suas lideranças nacionais, como Ciro Gomes, pré-candidato a presidente do PDT, que peitou os 15 dos 24 deputados que votaram a favor da PEC.

No PSDB, foram 22 dos 31 deputados, o que constrangeu os governadores de São Paulo, João Doria; e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que disputam as prévias da legenda para escolha do candidato tucano à Presidência. Houve reação da cúpula dos partidos, que pressionaram as respectivas bancadas a mudarem de posição. Se não houver ajustes na PEC, por meio de destaques, a emenda constitucional pode morrer na praia.

Um dos ajustes, por exemplo, foi a manutenção da chamada "regra de ouro", que impede o governo de contrair dívida para pagar despesas correntes, como salários de servidores e benefícios previdenciários, além de outros gastos da máquina pública, que era um tremendo trem da alegria embarcado na PEC.

Ou seja, o governo só pode fazer novas dívidas para pagar dívidas antigas ou fazer investimentos, que podem depois se refletir em crescimento da economia e em aumento da arrecadação. Não pode ficar rolando dívidas de custeio e pessoal com novas dívidas, como se fazia antigamente, farra que acabou com a Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada no final do governo de Fernando Henrique Cardoso.

O xis da questão na PEC dos Precatórios é o rombo no teto de gastos, oficialmente estimado em R$ 86 bilhões, mas que pode chegar a R$ 100 bilhões, segundo estimativa dos especialistas em contas públicas. O teto de gastos ancora o equilíbrio das contas públicas, com reflexos em toda a economia.

O governo fez uma manobra no cálculo do teto, que era de junho a junho e passou a ser de janeiro a dezembro, e deu um calote no pagamento das dívidas judiciais da União, para criar do nada a folga fiscal de R$ 86 bilhões. Em termos de geração de riqueza, esses recursos não existem; a alternativa mais eficaz seria cortar despesas supérfluas de custeio e pessoal, o que seria perfeitamente possível em se tratando de um orçamento de R$ 1 trilhão.

O pano de fundo de tudo isso são as eleições. O maior interesse do governo é viabilizar recursos para o programa de Bolsonaro que vai substituir o Bolsa Família, herança do governo Lula, que deixou de existir, além de outros benefícios, com propósitos eleitorais, como o vale gás e o subsídio de R$ 400 para os caminhoneiros.

Acontece que o Centrão também quer uma parte do "extra teto" para contemplar aliados políticos e redutos eleitorais. É um jogo desesperado, que pode virar uma rajada no próprio pé: mais inflação, juros mais altos, dólar mais caro, menos crescimento e menos empregos. Para Arthur Lira (PP-AL), agora, a única saída é dar transparência às emendas, ou seja, revelar seus acordos de bastidores, e pagar para o ver o resultado nas eleições, inclusive em Alagoas.

 


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