JUSTIÇA

Bolsonaro é condenado a pagar R$ 100 mil por dano moral coletivo a jornalistas

Justiça entendeu que presidente ultrapassa limite da liberdade de expressão e incita violência contra profissionais da imprensa

Luana Patriolino
postado em 07/06/2022 21:56 / atualizado em 07/06/2022 22:32
 (crédito: Isac Nóbrega/PR)
(crédito: Isac Nóbrega/PR)

O Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, comemorado nesta terça-feira (7/6), ganhou um significado ainda maior com a decisão da juíza Tamara Hochgreb Matos, da 24ª Vara Cível da Comarca de São Paulo, que condenou o presidente Jair Bolsonaro (PL) a pagar R$ 100 mil a título de indenização por dano moral coletivo aos jornalistas.

A magistrada destacou diferentes ataques de Bolsonaro aos profissionais e afirmou que o comportamento do presidente incita a violência contra a categoria.

"Com efeito, tais agressões e ameaças vindas do réu, que é nada menos do que o Chefe do Estado, encontram enorme repercussão em seus apoiadores, e contribuíram para os ataques virtuais e até mesmo físicos que passaram a sofrer jornalistas em todo o Brasil, constrangendo-os no exercício da liberdade de imprensa, que é um dos pilares da democracia", diz nos autos.

A ação chegou à Justiça por meio do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP). No dia 7 de abril do ano passado, a entidade pediu o presidente fosse coibido de realizar novas manifestações com “ofensa, deslegitimação ou desqualificação à profissão de jornalista ou à pessoa física dos profissionais de imprensa, bem como de vazar/divulgar quaisquer dados pessoais de jornalistas", além pagar a indenização — que deve ser destinada para investimentos no Instituto Vladimir Herzog.

Na sentença, a juíza Tamara Hochgreb Matos citou que a liberdade de expressão não pode ser confundida com ofensa a terceiros.

“Evidentemente, a liberdade de expressão não é um direito absoluto, como, aliás, nenhum direito o é. Havendo colisão com outros valores de igual envergadura, tais como os direitos da personalidade (honra, imagem, privacidade), torna-se necessário um juízo de ponderação, conforme as circunstâncias do caso concreto”, disse.

“Dessarte, o legítimo exercício da liberdade de expressão individual e/ou coletivo encontra balizas, como todos os demais direitos fundamentais, nos limites dos demais direitos, dentre os quais, ao que interessa nesta lide, no legítimo exercício da liberdade de imprensa, expressão fundamental do direito público subjetivo de informação, bem como o direito à imagem, à honra e à vida privada dos demais indivíduos, inclusive os jornalistas”, reiterou a magistrada.

Ataques misóginos e homofóbicos

Desde que assumiu a Presidência da República, Jair Bolsonaro faz uma série de ataques à imprensa profissional. Ele acusa os jornalistas de perseguição e já se envolveu em episódios polêmicos de falas machistas e preconceituosas.

Em 2019, o presidente foi perguntado por um repórter a respeito dos desdobramentos da investigação do Ministério Público do Rio sobre o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), um dos filhos dele. O chefe do Executivo, então, disse que o profissional tinha “cara de homossexual terrível”.

"Você tem uma cara de homossexual terrível. Nem por isso eu te acuso de ser homossexual. Se bem que não é crime ser homossexual", respondeu.

Em outro caso, o presidente insultou a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S. Paulo, com uma insinuação sexual. “Ela [repórter] queria um furo. Ela queria dar o furo [risos dele e dos demais]", disse, em entrevista diante de um grupo de apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada. Bolsonaro ainda concluiu: "a qualquer preço contra mim”.

A juíza Tamara Matos citou as declarações homofóbicas e misóginas de Bolsonaro contra jornalistas e condenou o comportamento do presidente.

“Restou, destarte, amplamente demonstrado que ao ofender a reputação e a honra subjetiva de jornalistas, insinuando que mulheres somente podem obter um furo jornalístico se seduzirem alguém, fazer uso de piadas homofóbicas e comentários xenófobos, expressões vulgares e de baixo calão, e pior, ameaçar e incentivar seus apoiadores a agredir jornalistas, o réu manifesta, com violência verbal, seu ódio, desprezo e intolerância contra os profissionais da imprensa, desqualificando-os e desprezando-os, o que configura manifesta prática de discurso de ódio, e evidentemente extrapola todos os limites da liberdade de expressão garantida constitucionalmente."

Série de ofensas 

Uma pesquisa da Agência Lupa, divulgada em dezembro do ano passado, identificou que ao longo de 2021, o presidente Jair Bolsonaro fez, ao menos, 78 ataques à imprensa durante as lives semanais na internet. O levantamento mostrou que o chefe do Executivo atacou o trabalho dos jornalistas em 86% das transmissões ao vivo. O número corresponde a 42, do total de 49, lives feitas durante todo o ano.

Em 2020, um monitoramento realizado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) também revelou que naquele ano o presidente proferiu 175 ataques à imprensa em lives e declarações públicas.


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  • Presidente da República, Jair Bolsonaro, durante a missa de sétimo dia da mãe dele
    Presidente da República, Jair Bolsonaro, durante a missa de sétimo dia da mãe dele Foto: Sergio Lima/AFP
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    06/06/2022--O presidente Jair Bolsonaro (PL) discursa nesta 2ª feira (06.jun.2022) sobre o preço dos combustíveis no país. Fala a jornalistas é realizada depois de reunião do chefe do Executivo com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP), o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente da Petrobras, Caio Mário Paes de Andrade Foto: Ed Alves-D.A Press
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