Com aprovação quase unânime no Senado, na última quinta-feira, a proposta de emenda à Constituição (PEC) 1/2022, que amplia benefícios sociais, tramitará na Câmara a partir da próxima semana. O texto deve ser votado junto com a PEC 15, dos biocombustíveis. Segundo o líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PP-PR), a matéria não deve sofrer alterações.
"A proposta é apensar na PEC 15 e votar sem alterações os textos aprovados no Senado", disse. Ele acredita que o rito de tramitação será decidido na reunião de líderes, agendada para segunda-feira. "Esse é o caminho para entregar o mais breve possível os benefícios que a população espera neste momento de crise. Vamos trabalhar duro para votar antes do recesso", acrescentou, numa referência à pausa dos trabalhos do Congresso, a partir de 18 de julho.
A PEC aumenta o valor do Auxílio Brasil, de R$ 400 para R$ 600; cria o voucher-caminhoneiro, de R$ 1 mil; prevê benefícios a taxistas e suplementação financeira para o Alimenta Brasil, entre outros pontos. As medidas, em caráter emergencial, têm vigência apenas até dezembro deste ano. A proposta é classificada como eleitoreira pela oposição que, no entanto, votou a favor no Senado.
Aliado do governo, o vice-presidente da Câmara, Lincoln Portela (PL-MG), defendeu que o Parlamento não se apegue a discussões ideológicas ou sobre a proximidade das eleições. "Por mais que o governo ajude e contribua com as pessoas no sentido de auxílios, o trabalhador quer ver a geladeira cheia, ele quer usar o fogão e ter botijão de gás. O governo tem de se desdobrar para ajudar", enfatizou. "Se a gente conseguir, na ponta, baixar o diesel e os combustíveis, isso terá reflexo no preço dos alimentos, e os trabalhadores poderão ter uma vida mais digna. É fundamental que o Parlamento participe disso ativamente, sem questões doutrinárias e ideológicas. A nossa ideologia é o povo brasileiro. Precisamos do pão na mesa do povo brasileiro."
Do outro lado, partidos contrários ao governo planejam estratégias com cautela. O líder do PSB na Câmara, Bira do Pindaré (MA), disse não haver possibilidade de a oposição se contrapor a uma tese que sempre defendeu, principalmente o aumento do Auxílio Brasil para R$ 600. Apesar disso, o parlamentar salientou que a proposta é oportunista. "Sabemos que essa medida, no contexto atual, tem caráter claramente eleitoreiro. Vamos questionar e exigir que haja uma tramitação em rito normal. É preciso que todas as forças políticas tenham a oportunidade de debater a questão. Não podemos aceitar que essa decisão seja tomada de maneira açodada", frisou.
A avaliação é de que lançar mão do estado de emergência na PEC abre precedentes para outras ações. "Modificar a Constituição com esses objetivos é algo temerário, sem dúvida alguma. Por isso, precisamos discutir com cautela", destacou o deputado.
O líder do PT na Casa, Reginaldo Lopes (PT-MG), definiu a PEC como "um flagrante crime eleitoral" e endossou o argumento de que a proposta tem de seguir o rito normal. "Não podemos rasgar o regime interno, já rasgaram a Constituição e as leis eleitorais da democracia brasileira", criticou.
Já o Partido Novo avalia ingressar com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a PEC, em caso de aprovação na Câmara, por desrespeito aos princípios constitucionais que regem as eleições e que embasam a Lei Eleitoral.
"Nosso jurídico já está trabalhando na tese, mas é impressionante a velocidade com que o Congresso faz remendos casuísticos e, ao mesmo tempo, é de uma letargia também impressionante quando se tratam das reformas estruturais", declarou Eduardo Ribeiro, presidente da legenda.
Na avaliação do secretário-geral e fundador da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, o governo e o Congresso agem com "desespero eleitoral", e as medidas em torno do pacote de bondades podem gerar uma bomba fiscal, trazendo ainda mais prejuízos após o período eleitoral.
"A PEC abre um precedente perigoso. Em função de dificuldades socioeconômicas, será decretado o estado de emergência a três meses das eleições, de forma a romper as limitações do teto de gastos, da regra de ouro, da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei Eleitoral", ressaltou. "Se a moda pegar, teremos estado de emergência a toda hora. O problema é que a carruagem de hoje pode se transformar em abóbora amanhã."
De acordo com o economista, as medidas vão prejudicar a governança da próxima gestão. "Alguém imagina que o novo presidente terá condições políticas de governar sem tais benefícios, que terminariam em dezembro deste ano? Benefícios são vantagens fáceis de implementar e difíceis de serem retiradas. As consequências decorrentes da sinalização para o populismo fiscal são a alta da inflação, a elevação dos juros, a redução dos investimentos e o desemprego", listou.
Impulso modesto
O cientista político Christopher Garman, diretor-geral para as Américas do Eurasia Group, afirmou que o presidente Jair Bolsonaro (PL) está dando um tiro no pé com a PEC, no desespero de sair gastando a qualquer custo para tentar garantir a reeleição, mas o impulso eleitoral deve ser modesto.
"Primeiro, os brasileiros que recebem o benefício (Auxílio Brasil) são mais leais ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com um alto percentual dizendo que já decidiu seu voto. Além disso, após a aprovação do auxílio emergencial de 2021, houve uma defasagem de três meses entre o lançamento de um novo benefício e o aumento nos índices de aprovação de Bolsonaro", destacou, em relatório enviado aos clientes ontem.
Segundo ele, esses fatores sugerem que a PEC, provavelmente, teria um impacto modesto nos números de Bolsonaro — aumento de um a três pontos percentuais, no máximo —, o que não é suficiente para alterar as chances de 70%, conforme a Eurasia Group, de triunfo do petista em outubro. "A chave para uma vitória de Bolsonaro (de 25% a 30% de chances) continua sendo melhorias adicionais no mercado de trabalho e uma campanha negativa muito eficaz contra Lula antes da votação", frisou.
Presidente da CCJ quer avaliar proposta na terça
A redução de impostos continua provocando baixa no preço dos combustíveis e chegou a R$ 6,43 em alguns revendedores de Brasília. Esse era o valor cobrado pelo litro da gasolina em um posto ao lado do Palácio do Buriti. Segundo o presidente do Sindicombustíveis-DF, Paulo Tavares, a queda se deve à zeragem do PIS/Cofins, que são tributos federais, e à redução do ICMS, um imposto estadual.
Ele observou que a Lei Complementar 192/2022 determinou o cálculo do ICMS com base na média dos últimos 60 meses. A lei definiu, ainda, que o ICMS incidirá uma única vez sobre os combustíveis, com alíquota única em âmbito nacional.
A medida foi contestada pelos estados no Supremo Tribunal Federal (STF). Em 17 de junho, o ministro André Mendonça reafirmou a validade da lei, que entrou em vigor ontem. Os governadores, porém, recorreram.
O presidente do Sindicombustíveis-DF, lembrou que, no caso dos impostos federais, a redução vale apenas até 31 de dezembro. Em janeiro do ano que vem, volta para o preço", disse. "Temos também a queda devido ao ICMS, ou seja, o governo passou a arrecadar menos R$ 0,50 por litro de gasolina a partir de hoje."
Tavares explicou que, até o momento, o impacto da queda das alíquotas de impostos gira em torno de R$ 1. "A queda vai depender da distribuidora repassar tudo aos revendedores, e dos estoques", afirmou. "Agora, se vai permanecer caindo ou não, depende do STF."
De acordo com o presidente do Sindicombustíveis-DF, se o STF julgar que a Lei Complementar é inconstitucional, porque obriga os governadores a terem uma alíquota de ICMS única, não haverá novas quedas de preço. "Mas se ele disser que é constitucional, os preços vão cair mais uns R$ 0,40, ou seja, a gasolina poderá ficar entre R$ 5,99 e R$ 6,50, dependendo do revendedor."
Segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP), a nível nacional, o preço do litro da gasolina caiu do recorde histórico de R$ 7,390, na semana passada, para R$ 7,127. O preço médio em São Paulo passou de R$ 6,974 para R$ 6,697 nas duas últimas semanas. Em Goiás, também houve redução da gasolina: de R$ 7,478 para R$ 7,078.
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