REVOLTA DA CHIBATA

Filho do "Almirante Negro" rebate comandante da Marinha: "Volta da ditadura"

Ao Correio, Adalberto Cândido reage ao almirante Olsen, que classificou atuação de João Cândido, líder da Revolta da Chibata, como "reprovável exemplo de conduta"

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Filho do "Almirante Negro" rebate Comandante da Marinha: "Volta da ditadura" - (crédito: Arquivo pessoal)

Um dia depois do conhecimento das críticas do comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, ao projeto que inscreve João Cândido Felisberto, o "Almirante Negro", no Livro dos Heróis da Pátria, o único filho vivo do líder da Revolta da Chibata, ocorrida em 1910, conversou com o Correio e reagiu à manifestação do almirante.

Adalberto do Nascimento Cândido, de 85 anos, o Candinho, é o caçula dos sete irmãos dos três casamentos de Cândido. Ele rebateu os ataques à atuação do pai dele feitos por Olsen, que classificou os marinheiros envolvidos na revolta de "abjetos" e o episódio de "vergonhoso" e "deplorável". João Cândido liderou a rebelião ocorrida na Marinha em novembro de 1910, num protesto contra os castigos físicos de chibatadas que os militares de baixa patente sofriam.

Candinho disse à reportagem que a Marinha tem que agradecer ao pai dele e afirmou que as declarações de Olsen remetem aos tempos da ditadura. "A Marinha tem é que agradecer ao meu pai e os demais companheiros da época. A Marinha só se modernizou depois, porque houve aquele movimento. Os marinheiros não tinham formação nenhuma. Os oficiais eram filhos de fazendeiros, que entravam na Marinha sem capacidade nenhuma", afirmou Candinho ao Correio. Hoje ele mora em São João de Meriti (RJ), localidade que o pai dele passou os últimos 40 anos de vida.

"Essas declarações nos faz lembrar a volta a ditadura. Mas estamos numa democracia. Se fizer um plebiscito, o nome de João Cândido será aprovado como um herói. E não um herói da Marinha, mas popular. Um herói do povo brasileiro", completou o filho do "almirante negro".

Candinho ainda classificou a crítica do comandante da Marinha a seu pai como o "absurdo dos absurdos" e que, tanto tempo depois, a perseguição a João Cândido ainda persiste.

"O que foi dito é o absurdo dos absurdos. É o que estão querendo fazer. Meu pai já faleceu há mais de 50 anos (em 1969) e, pela lei, pode se tornar um herói da Pátria. E essa Marinha continua com essa perseguição contra ele. Até hoje. Nem quando ele faleceu a patrulha era tanta, e vivíamos uma ditadura. Meu pai foi perseguido e foi absolvido. Passou dois anos preso, em 1912, e foi impedido depois de trabalhar na Marinha Mercante".

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva no batismo do navio petroleiro João Cândido, em 2010.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva no batismo do navio petroleiro João Cândido, em 2010. (foto: Ricardo Stuckert/PR)

Candinho lembrou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em julho de 2008, sancionou a lei concedendo anistia póstuma ao líder da Revolta da Chibata e aos companheiros, mas vetou concessão de benefícios financeiros.

Em maio de 2010, Lula batizou com o nome de João Cândido um navio petroleiro, com cerimônia de batismo no Porto de Suape, em Pernambuco. O filho do "almirante negro" diz que o comentário do comandante da Marinha é uma afronta até aos atos e gestos do presidente da República.

"O presidente fez esse reconhecimento, além da aprovação da lei pelo Congresso Nacional. A postura do comandante é uma afronta ao presidente Lula", disse.

Autor do projeto que concede a João Cândido o título de Herói da Pátria, o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) e a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), relatora da proposta na Comissão de Cultura, se encontram nesta sexta (26/4) com Candinho, em São João de Meriti. Será um gesto em solidariedade à família de João Cândido, após as manifestações da Marinha.

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postado em 25/04/2024 18:45 / atualizado em 25/04/2024 19:30
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