
Especial para o Correio — José Manuel Diogo
Os gestos na política, especialmente os carregados de simbologia, têm o poder de moldar narrativas e reacender memórias coletivas. No entanto, quando mal utilizados ou mal-interpretados, esses gestos podem tornar-se perigosos instrumentos de polarização e perpetuação de ideologias ultrapassadas.
O exemplo mais evidente disso ocorreu nos anos 1930, quando o regime nazista na Alemanha transformou a estética em um pilar estratégico de sua propaganda. A exploração simbólica, desde uniformes a coreografias públicas, transformou a política em um espetáculo cuidadosamente calculado, mascarando tragédias humanas sob uma fachada de grandeza. Essa apropriação estética marcou profundamente a história, servindo como um alerta sobre o impacto que gestos simbólicos podem ter na sociedade.
Nos dias de hoje, resgatar elementos dessa estética em contextos políticos modernos provoca reações ambíguas. Em vez de promover o progresso ou a reconciliação histórica, tais gestos frequentemente reabrem feridas e reforçam divisões. Por exemplo, em recentes discursos e eventos públicos, vemos líderes utilizando retórica e adereços que remetem a ideologias extremistas, mesmo que de forma inconsciente. Esses atos geram confusão, especialmente em sociedades polarizadas, onde as nuances são frequentemente substituídas por interpretações radicais.
A estética, quando mal compreendida, pode gerar polêmicas que transcendem fronteiras e afetam a construção de uma narrativa coletiva inclusiva. Quando um líder se utiliza de símbolos carregados de história — seja para agradar uma base política, seja para desafiar normas estabelecidas —, ele não está apenas expressando uma opinião. Ele está moldando percepções, validando discursos e, muitas vezes, perpetuando desigualdades.
É fundamental que os novos líderes políticos compreendam o peso de seus gestos. Na política, ao contrário do ambiente corporativo, não há espaço para ações que sejam vistas como meras estratégias de mercado. O impacto de um gesto simbólico na política é incomensuravelmente maior porque atinge não apenas indivíduos, mas sociedades inteiras. A transição entre os dois mundos — negócios e política — exige sensibilidade cultural e histórica, além de uma compreensão profunda do papel transformador que a política deve desempenhar.
Se olharmos para o século 21, podemos identificar exemplos de como a estética política pode ser ressignificada para promover inclusão e diálogo. A eleição de figuras como Nelson Mandela e Barack Obama demonstrou que gestos podem ser utilizados para curar nações e inspirar mudanças. Mandela, ao vestir a camisa tradicional sul-africana em vez de um terno presidencial, ressignificou sua imagem como um símbolo de união e resistência. Por outro lado, líderes que ignoram o impacto de suas ações simbólicas, muitas vezes, minam sua própria legitimidade, alimentando uma atmosfera de desconfiança e divisionismo.
Nesse contexto, surge uma pergunta inevitável: qual é a responsabilidade dos novos líderes na construção de narrativas estéticas que promovam o progresso social? A resposta está na conscientização sobre o poder transformador que a política possui. Isso inclui rejeitar a tentação de usar símbolos apenas para ganhos políticos imediatos e adotar uma abordagem que priorize a inclusão e o respeito à memória coletiva.
O desafio para os novos políticos é aprender com os erros do passado. Ao abraçar gestos que simbolizam união e reconciliação, eles podem reescrever narrativas e moldar um futuro mais justo. Em tempos de rápida transformação social e tecnológica, é imprescindível que os líderes compreendam o impacto duradouro de suas ações, sejam elas intencionais ou não. Como guardiões das memórias coletivas e agentes de mudança, eles têm a responsabilidade de liderar com integridade, garantindo que a estética na política sirva como um catalisador para a paz e o progresso, e não como um retrocesso.
Gestos, como aquele que Elon Musk fez no comício nos Estados Unidos, não são apenas expressões momentâneas; eles são declarações poderosas que moldam o curso da história. O peso da responsabilidade sobre figuras públicas exige um equilíbrio entre a tradição e a inovação, resgatando lições do passado sem perpetuar os erros.
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