
Na periferia da capital, duas irmãs viram no chochê a oportunidade de sustento e estão redefinindo o conceito de moda com agulha e linha. Tamara Neiva, 24 anos, e Nikolly Santos, ou Niko, 21, são as mentes e mãos por trás da Slanvy Brasil, uma marca de crochê que não apenas veste, mas conta uma história de identidade, resistência e talento que brota do centro do país.
Tamara concilia o estágio na Presidência da República com a pesquisa em sociologia da moda, os estudos em ciências sociais e sua paixão por ensinar, além de ser a diretora criativa da Slanvy. Niko é a CEO da marca, autônoma, personal stylist, artista plástica e professora voluntária de crochê na Fundação Pedro Jorge, na Estrutural. Juntas, elas transformam os fios em arte, e sonhos em realidade.
A paixão de Niko pelo crochê nasceu cedo, aos 8 anos, aprendendo de forma autodidata com as revistas da mãe. O que começou como um hobby passou a gerar renda e ganhou forma profissional em 2022. "Eu já vendia tapetes, acessórios e amigurumis de crochê quando era criança. Sempre tive o sonho de comercializar meu trabalho profissionalmente", lembra Niko.
A virada veio durante o carnaval de 2022, quando Niko começou a postar suas peças temáticas no Instagram. No ano seguinte, Tamara entrou no negócio, impulsionando a divulgação. O perfil produtos da slanvy, então, transformou-se na Slanvy Brasil (@slanvy.brasil). A motivação inicial foi a necessidade financeira durante a pandemia, mas logo se tornou a realização de um sonho. "Sou artista de todas as formas. Eu já promovia a arte para mim, mas agora faz muito sentido promover para a minha cidade", explica Niko, destacando a conexão profunda da marca com suas raízes.
Um nome, um alterego
A marca, embora idealizada em 2021, só ganhou uma identidade visual e um plano de negócios sólido em 2023. Slanvy é o nome artístico criado, em 2020, por Nikolly, que não gosta do nome real. "É meu alterego", resume.
A visão para o futuro da Slanvy Brasil é tão vibrante quanto suas peças. "Queremos vestir artistas de todos os espaços e vamos continuar integralizando a arte independente de Brasília", afirma Tamara. O sonho é ver nomes como Duquesa, Don L, Pratanes e Dj Umiranda usando suas criações, mostrando que a moda periférica pode e deve ocupar todos os espaços.
As peças da marca são únicas e feitas sob medida. Personalidade, identidade e cores, tudo faz parte da composição das criações sob encomenda. No ano passado, por exemplo, a Slanvy vestiu a dupla Margaridas para o festival Meskla, tendo como inspiração as cores do festival, símbolos e personalidades das cantoras.
A exclusividade é a alma da Slanvy Brasil. "Sim! Cada peça é única!", garante Niko. Se um cliente pede algo que já foi feito, a sugestão é sempre mudar cores ou detalhes, garantindo a autenticidade de cada criação. Apenas alguns acessórios de cabeça, produzidos para feiras e eventos, são feitos em maior quantidade.
Para as irmãs, suas criações são intrinsecamente ligadas de onde vieram e quem são. "A periferia é o nosso quintal, nossa casa e nossa vida, entendemos que não é uma estética; a periferia nada mais é do que identidade e cultura", ressalta Tamara. "Não precisamos sair ou entrar em nenhuma bolha, nós somos a marginalidade e a radicalidade do que a periferia é de verdade."
Apesar da hostilidade e do preconceito que ainda enfrentam no mercado de moda independente de Brasília, as irmãs mantêm a força e a convicção. "Hoje, podemos dizer com mais liberdade que a periferia é o centro de Brasília com tanta cultura radical", celebra Tamara.
Resistência e autenticidade
A mensagem que a Slanvy Brasil quer passar é clara: "Nós, duas irmãs pretas e periféricas, que não temos nenhum bem e não somos herdeiras de nada, estamos aqui, resistindo e produzindo moda", declara Niko. A moda periférica, para elas, é um pilar da valorização cultural. "Não é diferente de quaisquer outros produtos necessários no dia a dia. A moda garante não só conforto, mas também uma identidade própria daquele que faz uso dela", completa Tamara. "A periferia não é uma estética ou uma moda passageira, usar kenner, blusa de time e Oakley não faz de você um periférico, mas faz de nós uma cultura."
A Slanvy Brasil tornou-se um exemplo de empreendedorismo feminino. "Empreendedorismo é uma palavra que vem carregada de desafios e, para ser empreendedor na quebrada, é preciso muito foco e garra", pontua Tamara.
Apesar de contarem com o apoio dos clientes e o cuidado incondicional da mãe, as duas trabalham sozinhas e de forma autônoma. As irmãs contam que são conscientes dos desafios do mercado independente, e priorizam a saúde mental, até mesmo dispensando encomendas quando necessário. "Ser empreendedora é, sobretudo, um risco.", diz Tamara.
A alta temporada de encomendas acontece em grandes festivais de Brasília, como Na Praia e Meskla, e o final e meio do ano são sempre agitados. O público-alvo, que começou com jovens periféricos e universitários, hoje inclui artistas como As Margaridas, Maria Rita, e clientes de todo o país.
A Slanvy Brasil é a principal fonte de renda de Niko e um pilar financeiro para a família; e as peças são tão diversas quanto a criatividade das irmãs: camisas, bermudas, saias, shorts, durags, luvas, buckets, quipás e o que mais a imaginação do cliente ousar pedir.
A divulgação da marca acontece nas redes sociais, mas a maior força está no boca a boca. "A nossa maior divulgação vem por parte dos nossos clientes que, sempre voltam e sempre indicam o nosso trabalho", finaliza Niko.
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte
Revista do Correio
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