Aprender a nadar, andar de bicicleta ou iniciar uma prática corporal como o balé costuma ser associado à infância. No entanto, cada vez mais adultos têm buscado desenvolver habilidades que, por diferentes motivos, não fizeram parte de suas trajetórias quando eram crianças. Seja por falta de acesso, experiências traumáticas ou inseguranças acumuladas ao longo dos anos, esses aprendizados ficam adiados, até que o desejo de mudança fala mais alto.
A busca por novas habilidades na vida adulta envolve mais do que técnica. Ela exige enfrentamento emocional, paciência e, principalmente, disposição para lidar com o medo do erro. Em muitos casos, o primeiro desafio não está no corpo, mas na mente, marcada por cobranças, comparações e pela ideia de que "já passou da idade".
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A funcionária pública aposentada Marina Bahia, de 67 anos, decidiu aprender a nadar já adulta por uma motivação familiar. "O que me motivou aprender nadar já adulta, foram meus filhos. Quando eu tinha 32 anos os coloquei na natação e queria saber pra dar o exemplo. Pra acompanhá-los." O desejo de estar presente e de servir como referência foi o impulso inicial para entrar na piscina.
O começo, porém, foi atravessado por um sentimento comum entre adultos iniciantes. "A maior dificuldade enfrentada, foi o medo da água." Esse medo, segundo profissionais da área, é recorrente em pessoas que não tiveram contato com aulas de natação na infância ou que passaram por experiências negativas ao longo da vida.
No processo, Marina também lidou com a dúvida sobre sua própria capacidade. "Tive vontade de desistir, porque achava difícil aprender a nadar. Pensava que não ia conseguir aprender." A sensação de limitação aparece com frequência entre adultos que iniciam novas práticas corporais, especialmente aquelas que exigem coordenação e controle respiratório.
Com o tempo e a continuidade das aulas, a relação de Marina com a água mudou completamente. "Minha rotina mudou. Antes eu não entrava em piscina funda. Depois que aprendi a nadar, que foi numa piscina no Defer Brasília, treinei muitas vezes na piscina de campeonato de natação de lá, com oito metros e meio de profundidade, onde as competições aconteciam, e eu amava." O que antes representava medo passou a ser um espaço de prazer e superação.
Histórias como a de Marina se repetem em diferentes faixas etárias. O analista judiciário Angelo Faleiro, de 48 anos, também decidiu aprender a nadar recentemente. Para ele, a motivação estava ligada a um incômodo social e pessoal. "Era um pouco constrangedor chegar nos lugares e ser quase o único a não saber nadar. De certa forma, isso te limita e eu queria poder me sentir mais à vontade e seguro em piscinas e no mar. Além disso, queria tentar algo diferente."
No início, Angelo encontrou dificuldades específicas do aprendizado tardio. "Respirar. A respiração durante a natação tem um ritmo diferente e exige um pouco de coordenação motora que, particularmente, eu não tenho muita." A adaptação do corpo a novos movimentos é um dos principais desafios relatados por adultos iniciantes.
Apesar disso, ele conta que não chegou a cogitar abandonar as aulas. "Não passei por isso. Mas vi gente na minha turma que não voltava mais." Segundo Angelo, a paciência é um fator determinante nesse processo. "Aprender a nadar exige um pouco de paciência, ainda mais quando se é adulto, porque exige alguns movimentos que nem sempre estamos acostumados a fazer."
Com a prática, a atividade passou a ocupar um lugar importante em sua rotina. "Nadar, para mim, é como um momento de meditação em que me desligo de tudo e fico comigo mesmo." Além do aspecto mental, ele percebe ganhos na percepção do próprio corpo. "A gente meio que consegue saber melhor onde o corpo está desconfortável em certo dia porque, para nadar, a gente precisa 'sentir' todas as partes do corpo — ainda mais quando estamos aprendendo."
Do ponto de vista dos professores, a procura de adultos por aulas de natação é cada vez mais comum. "A natação traz muitos benefícios na fase adulta, tanto físico quanto mental", afirma o professor de natação Caíque Darlan. Ele destaca que a modalidade trabalha todos os grupos musculares ( braços, pernas, tronco e core ) e contribui para a melhora do condicionamento cardiovascular.
Segundo o professor, os bloqueios emocionais costumam aparecer logo no início. "O início da prática dessa atividade acaba causando um pouco de ansiedade e medo da água ao qual chamamos de aquafobia." Esse medo, explica, pode ter diferentes origens, desde experiências traumáticas até a falta de contato com a prática na infância.
"O medo de perder o controle: sensação de não conseguir respirar, flutuar e se manter seguro" é um dos mais relatados. Ainda assim, o processo de aprendizagem é estruturado para respeitar essas limitações. "Para adultos iniciantes essa também será a base do início de trabalho, porém com atividades educativas de pernadas e braçadas inclusas para uma evolução um pouco mais rápida", destaca Caíque Darlan.
A professora Dra. Gisele Kede Flor Ocampo, do curso de Educação Física do Centro Universitário Uniceplac, reforça que essas demandas não se restringem à natação. "Sim, é bastante comum que adultos procurem aulas para aprender a nadar ou andar de bicicleta, mesmo sendo habilidades tradicionalmente associadas à infância." Segundo ela, muitos alunos não tiveram acesso a essas vivências quando crianças.
Os bloqueios emocionais aparecem com frequência. "Entre os mais frequentes, destacam-se o medo de se machucar (quedas, afogamento, dor), vergonha de errar, traumas anteriores, ansiedade e insegurança." Para a professora, crenças limitantes também interferem no processo, mas podem ser superadas com acompanhamento adequado.
Ela explica que o aprendizado adulto é diferente do infantil. "As crianças tendem a aprender de forma mais espontânea, lúdica e sem medo do erro, já os adultos aprendem de forma mais racional, questionando mais." Apesar da menor plasticidade motora, adultos apresentam maior consciência corporal e disciplina.
Por isso, o ambiente das aulas precisa ser acolhedor, sem julgamentos. O cuidado emocional é parte fundamental do treino, assim como o respeito ao ritmo individual de cada aluno.
Os benefícios, segundo a professora, vão além do condicionamento físico. "Aprender a nadar ou andar de bicicleta na vida adulta vai muito além da habilidade em si, trata-se de um processo de crescimento pessoal, superação de limites e promoção da saúde integral."
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