
Na última quarta-feira (26), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão nacional das ações judiciais que tratam de indenizações por atrasos e cancelamento de voos por motivos de força maior, como mau tempo. A decisão visa apoiar o momento que as companhias aéreas enfrentam, com um quadro de judicialização crescente, marcado por milhares de ações repetitivas e decisões divergentes entre os tribunais, o que dificulta a previsibilidade jurídica e encarece a operação das empresas.
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A decisão foi tomada após uma ação em que a Azul Linhas Aéreas foi condenada pela Justiça do Rio de Janeiro ao pagamento da indenização por danos morais e materiais pelo atraso e alteração do voo de um passageiro. O caso discute a responsabilidade civil das empresas aéreas por danos materiais e morais.
A análise desse contexto foi reforçada por dados apresentados pelas sócias do Albuquerque Melo Advogados, citados pelo Ministro como parte da fundamentação da decisão sobre o Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.560.244. As sócias, Julia Lins e Renata Belmonte, destacam que o Brasil vive um cenário completamente destoante do restante do mundo. “O Brasil registra cinco mil vezes mais processos judiciais que os Estados Unidos. A proporção é de uma ação para cada 227 passageiros no Brasil, enquanto nos EUA esse número é de uma para cada 1,2 milhão.” Essa proporção demonstra o efeito sistêmico da judicialização, que já não se limita a reparar eventuais falhas, mas tornou-se um componente estrutural dos custos do setor.
Como observam, “há uma articulação clara de litigância predatória, praticada por meio do que se tem chamado de aplicativos abutres, que identificam ‘problemas’ em voos e estimulam os passageiros a ingressarem, de forma rápida, fácil e sem custos, com um processo judicial, na promessa de ganharem indenizações vultosas.” Para o Ministro Dias Tóffoli, que citou parte dos dados em sua decisão, esse padrão contribui diretamente para o crescimento explosivo de ações semelhantes, muitas vezes ajuizadas independentemente da análise de danos concretos.
A controvérsia, tratada no Tema 1.417 da Repercussão Geral, busca definir qual norma deve prevalecer em casos de cancelamento, alteração ou atraso de voos: o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) ou o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Para a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o CBA?deve ser o normativo que orienta as relações entre companhias aéreas e passageiros, inclusive porque ele reflete orientações de organismos mundiais que regem a aviação civil e respeita os acordos internacionais, dos quais os Brasil é signatário.
A falta de uniformidade na aplicação dessas normas contribui para decisões contraditórias e para a insegurança jurídica destacada pelo ministro. Segundo destacaram Julia e Renata, “isso ocorre muito por conta do uso indiscriminado do Código de Defesa do Consumidor em casos que envolvem companhias aéreas, ignorando muitas vezes as normas que regulamentam o setor, além das convenções internacionais das quais o Brasil é signatário.”
Diante desse conjunto de fatores, Toffoli concluiu que a suspensão nacional dos processos é necessária para frear a multiplicação de ações repetitivas, evitar distorções decisórias e permitir que o STF defina, de forma definitiva, o regime jurídico aplicável. A Corte também pretende dar previsibilidade ao sistema, reduzindo custos ligados à litigância e promovendo maior estabilidade regulatória enquanto o julgamento do mérito é preparado.
A Agência reforça ainda que o excesso de judicialização no setor aéreo onera diretamente o custo das passagens aéreas no Brasil e impede a entrada de novos operadores no país. “Todos os passageiros acabam pagando, direta ou indiretamente, os custos dessas ações, que são repassados pelas companhias aéreas para o consumidor final. Ou seja, uns ganham, muitas vezes os escritórios de advocacia, e todos pagam”, avalia o diretor-presidente da Anac, Tiago Faierstein.
Ele também ressalta os impactos do excesso de judicialização na competitividade do setor aéreo nacional. “Recentemente, uma companhia aérea low cost argentina me disse que o gasto com contendas jurídicas no Brasil é maior do que o lucro dela nas rotas que vêm para cá. Não tem negócio no mundo que aguente uma carga dessas”.
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A expectativa é que, até a definição final do Supremo, a suspensão alivie o volume de novas ações, reduza a litigância predatória e estabeleça bases mais seguras para consumidores e empresas. No médio prazo, a uniformização da jurisprudência tende a trazer maior clareza sobre direitos e deveres no transporte aéreo, além de contribuir para um ambiente de maior racionalidade regulatória e econômica no setor.
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