hotelaria

Desafios da hotelaria ante a reforma tributária

A Reforma Tributária aprovada no Brasil que, na prática já vigora, mudará completamente a apuração e a maneira de pagar-se impostos sobre a comercialização de produtos e serviços. Isso mexe totalmente no modelo de negócio também da hotelaria. Estamos adequadamente preparados?

Desafios da hotelaria ante a reforma tributária -  (crédito: Uai Turismo)
Desafios da hotelaria ante a reforma tributária - (crédito: Uai Turismo)
Desafios da hotelaria ante a reforma tributária (Foto: Freepik)

A Reforma Tributária brasileira, inaugurada pela Emenda Constitucional nº 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2025, promove uma profunda reorganização da tributação sobre o consumo no país. Para o setor da hotelaria, seus efeitos vão além da simples substituição de tributos, alcançando diretamente a estrutura de custos, a competitividade e a governança operacional dos empreendimentos.

Fique por dentro das notícias que importam para você!

SIGA O CORREIO BRAZILIENSE NOGoogle Discover IconGoogle Discover SIGA O CB NOGoogle Discover IconGoogle Discover

Segundo especialistas consultados pela coluna, 2026 será o ano para “Olhar para Dentro”, rever processos, avaliar oportunidades de ajustes e se capacitar mergulhando profundamente no entendimento das novas regulações tributárias em especial das Notas Técnicas, fazer experimentações e ajustar os lay outs fiscais de seus empreendimentos. Já o ano seguinte, 2027, este será de fato o “Ano da Virada”. A partir dele de fato não haverá mais margens para equívocos ou desconhecimentos. Todos os profissionais envolvidos nos processos tanto dentro como fora dos hotéis deverão estar versados nas novas atribuições e regulamentações.

Conhecimentos ainda apenas elementares   

Analisando as mudanças já colocadas em prática a partir do último mês de novembro, como por exemplo o fim do AIDF (Autorização de Impressão de Documentos Fiscais) que encerra a era e o uso de notas fiscais em formato impresso, deduz-se que em muitas localidades ainda se desconhece grande parte das mudanças implementadas. Escritórios de contabilidade e gestores administrativos e financeiros de meios de hospedagens ainda precisam se familiarizar com as novas normativas e dedicar mais tempo no entendimento pleno da Lei Federal 214/2025 que trata do tema. Cada veze menos haverá espaço para “jeitinho” na hora de ajustar fechamentos e fazer reversões contábeis ou fiscais. Uma das práticas mais comuns nas operações, os estornos de lançamentos errados em sistema não serão mais possíveis. “Equívocos nas emissões de notas não poderão mais ser simplesmente cancelados. A partir de agora somente através de um processo administrativo específico sujeito a avaliação da Receita Municipal, Estadual ou Federal conforme o caso.” esclarece Viviane Cruz, diretora da JVC Contabilidade em Belo Horizonte. Empresa que oferece serviços e soluções para inúmeras empresas do setor.    

Para Beatriz Ribczuk, sócia da Ribczuk Advogados em Curitiba, que igualmente atende com primazia grande número de hotéis e meios de hospedagem, a percepção sobre o setor, tendo em vista conversas com seus clientes, é que muitos sistemas de gestão hoteleira (PMS’s) ainda estão em fase de adaptação. “Há preparação básica, mas pouca implementação avançada de lógica de IBS/CBS. Em termos gerais, o setor está apenas parcialmente preparado. Processos básicos de emissão e CFOC em adaptação (eletrônicos) e times fiscais revisando cenários e simulando seus impactos futuros sem ainda bases analíticas bem fundamentadas”.

O diagnóstico resumido aponta, portanto, que no segmento hoteleiro ainda falta preparação ampla em simulações de cargas tributárias com o IBS/CBS modelo; mais robustez nos testes de fluxo de receitas e créditos tributários; melhores integrações com fornecedores e parceiros e mais capacitação tributária para lidar com os novos campos fiscais (layouts) em emissões e apurações.    

Os principais pilares que os gestores precisam estar atentos na reforma tributária

Revisão da formatação de preços de serviços e produtos

Ao longo da implementação paulatina da Reforma Tributária será essencial as equipes comerciais trabalharem em consonância com os gestores administrativos e financeiros para que entendam corretamente os reflexos da nova carga tributária nos resultados dos empreendimentos. Desta forma a estratégia mercadológica da precificação dos serviços e produtos ofertados se fará mais transparente e de melhor compreensão entre todos os envolvidos facilitando sua implementação e argumentação junto aos clientes finais, plataformas de vendas entre outros. Recomendo que os tarifários dos exercícios 2026 e 2027 sejam estipulados considerando menor prazo de validade para que eventuais ajustes não provoquem desgastes prematuros com compradores. A reforma também tende a reduzir distorções concorrenciais entre a hotelaria formal e modelos de locação temporária intermediados por plataformas digitais.

LEIA TAMBÉM: Entra em vigor regra de diárias 24 horas nos hotéis

À medida que esses agentes passem a se submeter às mesmas regras de incidência e fiscalização, a vantagem tributária historicamente existente tende a diminuir, ainda que a efetividade dessa equiparação dependa da atuação fiscalizatória dos entes competentes. Somam-se a isso os desafios do período de transição, que ocorrerá gradualmente entre 2026 e 2033. Esse intervalo exigirá revisão de contratos, políticas de precificação, sistemas contábeis e planejamento tributário contínuo. Nesse cenário, o PMS (Property Management System) assume papel estratégico. Mais do que uma ferramenta operacional, torna-se elemento central de governança tributária, integrando faturamento, escrituração, apuração de tributos e conformidade regulatória. A correta parametrização desses sistemas será determinante para reduzir riscos fiscais, evitar inconsistências e sustentar a posição do contribuinte em um ambiente de fiscalização cada vez mais digitalizado.

Domínio de alíquotas e novas nomenclaturas

Uma vez que vários impostos atuais serão transformados em outros sob novas nomenclaturas, será de suma importância que todos os gestores estejam a par das novas nomenclaturas como por exemplo o IVA (Imposto sobre Valor Agregado). A substituição de tributos como ISS, ICMS, PIS e Cofins pelo modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA), materializado pela CBS (federal) e pelo IBS (estadual e municipal), traz maior racionalidade ao sistema. Contudo, essa simplificação vem acompanhada de regras específicas e mudanças de alíquotas que exigem atenção redobrada por parte dos contribuintes do setor.

Peculiaridades da hotelaria

O artigo 277 da LC nº 214/2025 instituiu regime específico de incidência do IBS e da CBS para os serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos. Na prática, isso significa que o setor passa a operar sob:

  • regras próprias de definição de alíquotas;
  • disciplina diferenciada para apropriação de créditos;
  • apuração alinhada às particularidades da atividade.

A LC nº 214/2025 adotou um conceito amplo e atualizado de serviço de hotelaria, conferindo maior segurança jurídica a modelos modernos de exploração do setor. Nos termos do artigo 278, considera-se serviço de hotelaria o fornecimento de alojamento temporário, bem como de outros serviços incluídos no valor cobrado pela hospedagem, prestados:

  • em unidades de uso exclusivo dos hóspedes, por estabelecimento destinado a essa finalidade; ou
  • em imóvel residencial mobiliado, ainda que de uso não exclusivo dos hóspedes.

O parágrafo único do referido dispositivo esclarece que não descaracteriza o serviço de hotelaria a divisão do empreendimento em unidades hoteleiras com titularidade jurídica autônoma, desde que a destinação funcional seja exclusivamente a hospedagem. Trata-se de regra fundamental para empreendimentos mistos, flats, condo-hotéis, multipropriedade e estruturas semelhantes, reduzindo litígios históricos sobre enquadramento tributário.

Regime de não-cumulatividade e geração de créditos 

Créditos CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) unificam impostos estaduais e municipais como o ICMS e o ISS. Fica, no entanto, vedado o acesso aos referidos créditos pelos adquirentes de serviços de hotelaria, conforme o Artigo 282 da Lei Complementar (LC 214/2025) em sua apropriação. Isso significa que os tomadores de serviços hoteleiros sejam eles pessoas físicas ou jurídicas não poderão se beneficiar de créditos fiscais ao contratarem serviços de hospedagem. Essa vedação gera impactos diretos para empresas que frequentemente contratam hospedagens para seus funcionários em viagens de negócios ou eventos corporativos.

Já nas aquisições de bens e serviços contratados pelos hotéis junto a seus fornecedores os hotéis poderão, conforme reza o mesmo artigo da Lei Complementar, compensar os impostos pagos na aquisição de insumos usados nas operações hoteleiras ao contrário o regime até então que trazia restrições aos créditos de PIS e Cofins. Esse ponto é particularmente sensível para setores intensivos em deslocamento e estadias recorrentes, como engenharia, consultoria, logística, petróleo e gás, transporte marítimo e infraestrutura. Estudos indicam que a vedação pode representar um aumento significativo do custo tributário efetivo da hospedagem para empresas, com impactos diretos na cadeia de negócios.

Combate contra a sonegação

Um dos principais objetivos da Reforma Tributária, que pretende modernizar a estrutura fiscal e de controles é, certamente, o de combater e inviabilizar a evasão de tributos sob forma de sonegação. Significa dizer que o aprimoramento dos sistemas a serem implantados visam dificultar omissões e manipulações financeiras e contábeis através de controles mais rígidos nos mecanismos de recebimento e transações de valores auferidos nas operações dos hotéis, estejam eles sob regime do Simples ou mesmo sob forma de Lucro Real ou Presumido.  

LEIA TAMBÉM: Hotéis investem em estações para carros elétricos e impulsionam turismo sustentável

Conclusão

A Reforma Tributária representa um avanço estrutural relevante, mas não isento de contradições. Para o setor da hotelaria, o verdadeiro desafio não reside apenas na redução ou aumento da carga tributária nominal, mas na compreensão estratégica do novo modelo, na adaptação de processos internos e no uso da tecnologia como aliada para preservação da competitividade e da segurança jurídica em um cenário regulatório mais complexo e certamente também mais exigente.

“Para o exercício orçamentário de 2026 os hotéis, em sua maioria, mantiveram os parâmetros anteriores na composição de suas projeções já que os efeitos reais da Reforma Tributária ainda são uma incógnita até mesmo para os especialistas”.

Maarten Van Sluys (Consultor Estratégico em Hotelaria – MVS Consultoria)

Instagram: mvsluys

LinkedIn: maartenvs1

E-mail: mvsluys@gmail.com

Siga o @portaluaiturismo no Instagram e no TikTok @uai.turismo

  • Google Discover Icon
Uai Turismo
Maarten Van Sluys - Uai Turismo
postado em 23/12/2025 06:24
x