SÃO PAULO

Por que não há mais luminárias japonesas em rua da Liberdade?


Artefatos foram retirados da Rua dos Aflitos na semana do último Dia da Consciência Negra, em novembro de 2024

Por Lara Perpétuo
Reprodução/TV Globo

‘Bairro japonês’

Lembrado hoje em dia pela influência oriental na cidade de São Paulo, o bairro da Liberdade, no centro da capital, é caracterizado por ruas cheias de lojas, restaurantes e lanternas tradicionalmente japonesas

Tet/CC/Wikimedia Commons

Nesta rua não

Em 18 de novembro do ano passado, porém, as famosas luminárias foram completamente retiradas de uma rua específica, que guarda história de muito tempo antes

Reprodução/TV Globo

Centro histórico

Fundado em 1554 — de acordo com o que a gestora em turismo Naomy Carvalho Pires pesquisou em trabalho de conclusão de curso sobre turistificação do bairro da Liberdade —, o centro histórico de São Paulo era ocupado por chácaras

Debret/Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo

Formação do bairro

Desta forma — conforme cita a historiadora Laís Guimarães —, a estruturação do bairro ocorreu devido à presença de chácaras em que viviam famílias abastadas, que deram origem a ruas estreitas e becos para escravos, quitandeiras e tropeiros

Debret/Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo

Nomes antigos

Segundo artigo de Henrique Archanjo e Letícia Calixto publicado pela Universidade Federal de Uberlândia em 2021, antes de se chamar Liberdade, o bairro teve outros nomes por volta da década de 1750: Largo da Pólvora e Largo da Forca

Revista Trip Uol

Significados

Se o primeiro fazia alusão ao comércio de explosivos, o segundo era referência à forca que existia no local onde, durante o século XVIII, escravizados eram executados após condenação à pena de morte

Jornal empoderado

Capela Nossa Senhora dos Aflitos

Localizada onde hoje é a Rua dos Aflitos, da qual foram retiradas as luminárias japonesas em 2024, a Capela Nossa Senhora dos Aflitos centralizava os sepultamentos dos mortos a poucos metros dali

Graser (1939)

Cemitério dos Aflitos

Com a superlotação da capela, em 1775, foi construído o Cemitério dos Aflitos, primeiro cemitério público de São Paulo, destinado ao sepultamento de ingentes, indígenas e escravos

Joalpe/CC/Wikimedia Commons

Francisco José das Chagas

Em 1821, durante a execução de um homem negro alforriado chamado Francisco José das Chagas, condenado à forca por organizar uma revolta em Santos devido ao não recebimento de salários, a corda arrebentou três vezes

Reprodução

Liberdade?

Em meio ao suplício, o público que assistia ao assassinato passou a gritar por 'liberdade' — o que se tornou uma das hipóteses associadas à criação do nome do bairro

Reprodução/Invisível/Marília Marz

Igreja das Almas

Em 1887, a Igreja Santa Cruz das Almas dos Enforcados, ou Igreja das Almas, passou a ser construída no mesmo local em que foi erguida cruz em homenagem a Francisco José das Chagas, onde hoje é o centro da praça da Liberdade

Associação Paulista dos Empreendedores do Circuito das Compras

Bairro negro

Segundo Archanjo e Calixto, a Liberdade 'era um bairro negro, característica essa que não se encontra mais na região, possivelmente por conta das políticas de Estado a fim de embranquecer tanto a população quanto o centro de São Paulo'

CC/Wikimedia Commons

Urbanização

A chegada dos primeiros navios do Japão, em 1908, casou com o desmembramento de chácaras da região, a partir de 1889, e a consequente urbanização da região

CC/Wikimedia Commons

Japoneses

Assim, apesar da instalação de imigrantes japoneses no bairro a partir de então, a Liberdade, em especial a Rua dos Aflitos, carrega história anterior que não diz somente à cultura oriental

Francisco Antunes/CC/Wikimedia Commons

Movimento negro

A decisão de retirar as luminárias da Rua dos Aflitos, que até hoje preserva a capela e o cemitério em que costumavam ser enterrados os escravizados, ocorreu após pressão de entidades ligadas ao movimento negro

CC/Wikimedia Commons

Contexto histórico

Em nota replicada pelo ‘g1’, a Prefeitura de São Paulo diz que a mudança foi tomada devido a 'preocupações quanto à adequação das lanternas Suzuranto ao contexto histórico da região'

Arquidiocese de São Paulo

Inadequadas

'As lanternas, que remetem à imigração japonesa, foram consideradas inadequadas para o local, uma vez que o Beco dos Aflitos abriga a Capela de Nossa Senhora dos Aflitos, um marco histórico da época da escravidão no Brasil', diz a administração

CC/Wikimedia Commons

Equilíbrio e memória

'A decisão buscou equilibrar o respeito às diferentes camadas históricas e culturais presentes no bairro, garantindo que a memória de cada grupo seja adequadamente representada.'

CC/Wikimedia Commons

Restante do bairro

As lanternas Suzuranto permanecem no restante do bairro, preservando também, portanto, a herança da imigração japonesa

Ricardo Migliani/CC/Wikimedia Commons