Diversão e Arte

Como os filmes de Spike Lee dialogam com as discussões raciais do momento

Histórias contadas pelo diretor norte-americano podem não falar sobre atualidade, mas se relacionam com o memento

Correio Braziliense
postado em 07/06/2020 07:00
Spike Lee
A cultura sempre foi meio para críticas de como o racismo esteve presente estruturalmente na sociedade e o norte-americano Spike Lee foi um vanguardista no uso do cinema para denunciar o modo violento com que os negros eram e ainda são tratados.

O cineasta de 63 anos esteve presente na linha de frente da luta contra o racismo dentro do meio cultural. Foi ele, inclusive, um dos nomes que boicotou a indicação do Oscar apenas com indicados brancos. Anos depois, quando recebeu a primeira estatueta do prêmio, em 2018, Lee citou a escravidão dos Estados Unidos e falou que as eleições de 2020 nos EUA seriam “uma batalha de ódio vs. amor”.

O ano de 2020 chegou, mas Spike Lee não previu que não era o discurso do Oscar que melhor dialogaria com o período vivido nos Estados Unidos, mas as histórias que ele contou durante os mais de 40 anos de carreira no cinema.

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Os filmes do diretor possuem críticas que, na época dos respectivos lançamentos, eram pertinentes, assim como, agora, anos depois. O Correio lista três longas do cineasta que abrem revelam a relação do trabalho de Lee com as questões raciais dos Estados Unidos.

Faça a coisa certa

Filme Faça a coisa certa
O filme de 1989 é o primeiro grande sucesso de Spike Lee. O diretor, que também vive o protagonista Mookie, retrata na obra a história das pessoas que vivem em um quarteirão do Brooklyn, bairro novaiorquino majoritariamente composto por negros. O simples dia a dia de todos se entrelaça após Buggin Out reclamar que a pizzaria mais famosa da região só tem heróis brancos na parede de homenagens e organiza um boicote ao local.

O filme gira em torno de problemas sociais e pessoais em um microcosmo contando problemas comuns que os negros passam no cotidiano, na perspectiva de um homem negro. A forma como tudo é visto e exposto parte do próprio Lee, que entende a vivência dos personagens por ter sido um homem negro em Nova York.

No entanto, o filme vai além, o que parece ser apenas uma representação de coisas pequenas toma no desfecho outra proporção. O final trágico de Radio Raheem, um personagem antissistema que andava com um som tocando Fight the powerdo Public Enemy, é semelhante aos assassinatos de George Floyd e Eric Garner. A frase "I can’t breathe" (Não consigo respirar, em português) não é usada, mas a representação da brutalidade policial é comprova o motivo de tanta revolta com os casos da atualidade.

Pouco antes dos créditos finais, o filme já dizia com citações a grandes líderes negros, como Malcolm X e Martin Luther King, o que manifestantes tentam transmitir tomando ruas em cidades dos EUA. O sentimento é revolta pelos que perderam a vida nas mãos da polícia e foram incriminados primeiramente pela cor da pele, e não por qualquer delito que tenham cometido.

Faça a coisa certa prova uma atemporalidade mais de 30 anos depois a partir de representações de cenas que, infelizmente, ainda são cotidianas na atualidade.

Em um curta recente lançado no YouTube, ele compara as cenas do próprio filme com a forma como a polícia abordou George Floyd e Eric Garner.

Malcolm X

Cena do filme Malcolm X
No filme, Malcolm X, um dos fundadores da Organização para a Unidade Afro-Americana e um dos maiores defensores do nacionalismo negro, tem a história contada de forma completa e detalhista, com representação da importância da liderança do ativista.

O longa-metragem se torna imprescindível em um momento em que os grandes discursos são relembrados e em que as pessoas buscam amparo em um movimento pelos direitos que deveriam ser básicos. Malcolm X conseguiu unir negros e brancos e mostrar ao mundo que a discriminação racial era um tratamento criminoso.

Em tempos em que o que ele falava retorna a público, é necessário entender quem foi Malcolm X. Para fazer jus a imagem que salvou vidas, é primeiramente necessário conhecê-la, desde o princípio até a morte. Assim como Selma, filme de Ava DuVernay que mostra Martin Luther King, Malcolm X de Spike Lee é biografia necessária para entender a luta negra.

Infiltrado na Klan

Cena do filme Infiltrado na Klan
Infiltrado na Klan narra como um policial negro salvou vidas ao conseguir um meio de estar dentro da organização dos capuzes brancos, Kux Klux Klan. Este foi o trabalho que corou Spike Lee com o primeiro Oscar da carreira, no caso de Melhor Roteiro Adaptado.

O filme, que trata com bastante ironia os supremacistas religiosos brancos, também levanta o questionamento de até onde a liberdade de expressão pode chegar, e se é certo garantir a segurança de quem pode ser uma ameaça aos outros. 

Com críticas claras a diferença de tratamento da polícia com negros e brancos, a produção constrói um forte discurso de como o extremo ódio está presente na sociedade, mesmo que escondido do campo de visão das pessoas.

Além disso, dá destaque a cultura negra e faz referências claras ao Blackexploitation, movimento cinematográfico que popularizou cineastas e atores negros.

O futuro de Spike Lee

Cena do filme Destacamento Blood
O diretor de cinema permanece no trabalho de mostrar a perspectiva da comunidade negra nas telas. O novo longa,Destacamento Blood, que vai lançar junto a Netflix na próxima sexta-feira (12/6), promete mostrar a realidade de negros que vivenciaram a Guerra do Vietnã e a importância deles para o exército. O filme tem Chadwick Boseman (Pantera Negra) e Jean Reno (O profissional) no elenco. Spike Lee também é o presidente da edição de 2020 do icônico Festival de Cannes.

*Estagiário sob supervisão de Adriana Izel

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  • Filme Faça a coisa certa
    Filme Faça a coisa certa Foto: 40 Acres & A Mule Filmworks/Divulgação
  • Cena do filme Malcolm X
    Cena do filme Malcolm X Foto: Largo International N.V./Divulgação
  • Cena do filme Infiltrado na Klan
    Cena do filme Infiltrado na Klan Foto: Focus Features/Divulgação
  • Cena do filme Destacamento Blood
    Cena do filme Destacamento Blood Foto: Netflix/Divulgação

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