Anuário de segurança

Subnotificação é mais um drama enfrentado pela comunidade LGBTQIA+, diz anuário

Anuário de segurança constata que há uma defasagem de 45% entre registros oficiais e os de entidades ligadas à comunidade

Tainá Andrade
Isabel Dourado*
postado em 29/06/2022 06:00
Monumentos de Brasília, como o Supremo Tribunal Federal, prestaram homenagem à comunidade LGBTQIA com as cores da bandeira -  (crédito:  Carlos Vieira/CB)
Monumentos de Brasília, como o Supremo Tribunal Federal, prestaram homenagem à comunidade LGBTQIA com as cores da bandeira - (crédito: Carlos Vieira/CB)

As ocorrências de violência contra a comunidade LGBTQIA apresentam uma subnotificação de pelo menos 45%, quando se compara os números oficiais com o de organismos da sociedade civil que monitoram o assunto. A constatação está no Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e divulgado ontem — quando se celebrou o Dia do Orgulho LGBTQIA .

Os registros oficiais demonstram um aumento da violência na faixa dos 20% contra esta população, porém o levantamento apontou que oito das 27 unidades da Federação não souberam dizer quantos integrantes da comunidade foram vítimas de homicídio em seu território. Já os dados compilados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), um dos incluídos no Anuário, sinaliza um aumento expressivo da brutalidade (41%).

"Isso dá uma dimensão do descaso do Estado no registro dessas ocorrências e nessa tomada de responsabilidade para si no que diz respeito à proteção da população LGBTQIA . Sem dados não tem como qualificar políticas públicas. A ausência de informações é uma ótima desculpa para não elaborar uma política pública, e isso acaba se tornando um ciclo vicioso", assegura Dennis Pacheco, pesquisador do FBSP.

Para ele, isso cria várias lacunas, dentre as quais a não resolução de problemas pontuais relacionados à diferenciação identitária da população LGBTQIA . "O Brasil é um país que tem tradição em entender a política pública específica como uma forma de alimentar o problema da desigualdade. Na produção acadêmica de administração e gestão pública existe o entendimento de que é por meio de iniciativas específicas do Estado o único modo de enfrentar as desigualdades de alguns grupos. Sem dados qualificados, não é possível fazer as diferenciações", ressaltou.

O Anuário faz uma crítica contundente ao "apagão" de informações sobre a comunidade LGBTQIA : "Vivemos em um momento de aumento da visibilidade de pessoas negras e LGBTQIA nos meios de comunicação de massa, o que possui impactos simbólicos importantes. Essas transformações culturais não chegaram, contudo, ao cerne da intervenção estatal sobre a sociedade", observa.

Neste ano, e pela primeira vez, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), divulgou os dados oficiais sobre a comunidade LGBTQIA . De acordo com o levantamento, 2,9 milhões de pessoas, a partir de 18 anos, se declaram lésbicas, gays ou bissexuais.

No entanto, o IBGE alertou que os números podem estar subnotificados, pois não foram incluídas perguntas que indicariam as outras orientações sexuais existentes. Para os especialistas, a metodologia que tem sido utilizada para esses levantamentos evidencia a falta de vontade dos gestores públicos em contornar as dificuldades para garantir os direitos à causa.

Para Roberto Muniz, ex-assessor especial da Secretaria de Estado de Políticas para Mulheres, Igualdade Social e Direitos Humanos do DF, a pauta de costumes que passou a fazer parte da vida do país a partir do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) é mais um complicador para o desenvolvimento de iniciativas públicas em favor da comunidade LGBTQIA .

"O maior problema, hoje, é que apesar de existir muitos direitos, políticas públicas podem não ser desenvolvidas por conta de moralismo, de processos ideológicos", observou.

*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi

 

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