Porto Alegre (RS) — Depois de dois dias de sol e o recuo no nível do Lago Guaíba, parte da população da capital gaúcha se mostrava mais confiante na normalização da vida na metrópole de 1,2 milhão de habitantes. Mas com as chuvas deste final de semana que ultrapassaram as previsões, os alertas de evacuação de áreas afetadas pelas cheias voltaram a ser feitos na cidade.
Até o momento, a tragédia do Rio Grande do Sul deixou meio milhão de pessoas desalojadas. O número de mortos chegou a 145 pessoas. Parte da população começou a retornar para suas casas. Porém, pesquisadores e autoridades alertam que as chuvas desse fim de semana pode trazer riscos para os moradores.
A projeção realizada, com simulações diárias, conduzida por pesquisadores voluntários do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), apontou para um repique da enchente com a possibilidade de ultrapassar o nível, já recorde, da semana passada.
O doutor em hidrologia e professor do IPH/UFRGS Rodrigo Paiva, disse ao Correio que as chuvas do último final de semana foram de volumes maiores que os anteriormente previstos pela meteorologia. Com isso, os dados mostram que a capital gaúcha ainda não chegou ao pior momento desta cheia.
"De sexta para domingo choveu bastante e se aproximou das piores previsões, mas como demora um pouco para esse pico chegar em Porto Alegre, o repique das chuvas deve acontecer entre hoje e terça-feira", alertou o pesquisador. Segundo a simulação, mesmo que as precipitações do fim de semana não tivessem se confirmado, já era esperado que voltasse a subir o nível das águas do Guaíba para a cota de cerca de 5 metros.
Nas regiões afetadas
Com um alerta tão grave, os prefeitos da capital e da região metropolitana apelam que a população de alguns bairros mantenham a evacuação das casas nessas regiões de risco. Na capital gaúcha, o bairro Lomba do Sabão, uma região alta da cidade, começou a registrar, ontem, alagamentos com as chuvas do final de semana depois do transbordamento de uma represa na região. Especialistas têm alertado que existe o risco de um rompimento da barragem. Caso aconteça, pode registrar um volume de água bem maior e até ondas destrutivas no bairro.
Em Canoas, uma das cidades mais atingidas pelas chuvas, o prefeito Jairo Jorge (PSD), reforça o apelo para que a população não retorne para as residências e até carros de som circulem pelas ruas do bairro Niterói, que corre o risco de ser alagado com o rompimento de um dique. "As águas retornarão e, se a pessoa ficar, provavelmente, terá que ser resgatada", alertou o prefeito.
Em São Leopoldo, o prefeito Ary Vanazzi (PT), disse que nos próximos três dias a expectativa é que o Rio dos Sinos, que corta a cidade deve voltar a subir aos níveis de inundação da semana passada e apelou para que a população não retorne para as áreas de alagamento.
Técnicos apontam que a expectativa é que as águas subam em uma velocidade similar ao registrado na semana anterior, o que significa uma ampliação das inundações rápidas, mas com a possibilidade das pessoas tomarem as medidas necessárias de proteção.
Tornado
Um tornado atingiu a zona rural da cidade de Gentil, no norte Rio Grande do Sul, no sábado. O fenômeno ocorreu em meio às fortes chuvas que atingem o estado. O momento foi registrado em vídeo por moradores. O tornado derrubou várias árvores na região.
De acordo com o MetSul, quando um corredor de vento forte entre 1.000 e 1.500 metros de altitude está atuando e há o avanço de uma frente fria, cria-se uma situação em que ventos sopram em sentidos divergentes na parte baixa da atmosfera e isso favorece a formação de tornados.
"Deveria curtir a gravidez"
Canoas (RS) — Foram meses planejando a primeira gravidez, a casa ideal para aumentar a família e comprando as primeiras roupinhas do bebê. As chuvas transformaram todo o plano da mãe de primeira viagem em incerteza, medo e preocupação.
"Os planos que nós tínhamos foram totalmente modificados pelas circunstâncias que foram acontecendo. E eu não sei se a gente volta para lá", desabafa, ao Correio, a advogada Paula Carriero Lopes, 39 anos, que mora em Canoas. Ela teve o primeiro andar inteiro da casa inundado, após comporta do Guaíba estourar e inundar a cidade, deixando muitas pessoas ilhadas.
Pedro Alberto Samuel, 38, também advogado e marido de Paula, conta como ficou ao saber que o dique que ficava a dois quilômetros de distância da casa deles tinha estourado e estava inundando as ruas. "Fiquei desesperado, juntamos umas roupas e levei a minha mulher para a casa da mãe", relembra Pedro.
Paula conta que, enquanto arrumava as coisas para sair de casa, ela lembrou das primeiras roupinhas do bebê e colocou para cima do guarda-roupa, na esperança de que a chuva não as alcançasse. Até o momento, o que eles sabem é que o primeiro andar da casa foi todo alagado.
Pedro ainda ficou na casa em que eles moravam por mais um dia. Ele colocou os móveis para cima da mesa, subiu com itens para o segundo piso, fez uma barricada com sacos de areia e torceu para que funcionasse. "É cena de guerra, parece filme. Não tinha luz, água tinha cortado, só ouvia o barulho de helicóptero, sirenes, pessoas chorando", descreve a situação que durou cerca de 12 horas.
A mãe de primeira viagem diz que sente muita "incerteza e insegurança" com a situação em que está. "Considerando todas as incertezas do momento para todo o mundo, com certeza a questão da economia vai ter um grande impacto, que acaba me preocupando. É um momento que acaba dando muita tensão, num momento que não deveria estar assim, que eu deveria curtir a gravidez", finaliza.
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