Tragédia no Sul

Guaíba volta a subir e frio inibe trabalho de voluntários no RS

Expectativa para os próximos dias é de inundação sem precedentes. Temperaturas despencam, e rios voltam a transbordar na Serra

O mau tempo e o frio prejudicam o trabalho de resgate: ontem, poucos voluntários enfrentaram as águas barrentas do Lago Guaíba -  (crédito:  Henrique Lessa/DAPress)
O mau tempo e o frio prejudicam o trabalho de resgate: ontem, poucos voluntários enfrentaram as águas barrentas do Lago Guaíba - (crédito: Henrique Lessa/DAPress)

Porto Alegre — O Lago Guaíba voltou a subir — passou, ontem, dos 5m — e se aproxima dos níveis históricos registrados na semana passada. Porto Alegre, uma das cidades mais castigadas pela inundação, teve uma segunda-feira gelada, com poucos voluntários na água transportando mantimentos ou tentando convencer moradores a deixar as casas alagadas.

Uma massa de ar polar derrubou as temperaturas em todo o Rio Grande do Sul. Em alguns municípios, os termômetros chegaram a registrar 0ºC. Na maior parte do estado, a temperatura mínima ficou em torno de 10ºC. Associada à queda das temperaturas, a umidade fez a sensação térmica parecer ainda mais baixa na capital gaúcha. 

Apesar da trégua da chuva, a projeção da Defesa Civil e de especialistas é que o nível do Guaíba ultrapasse 5,5m. Segundo os modelos do órgão, essa elevação significará a maior cheia já registrada na história da capital gaúcha, superando os marcos da semana passada, quando o lago que banha a capital gaúcha chegou a 5,35m, superando em muito a cheia de 1941, que registrou 4,75m.

O número de mortes causadas pelas enchentes no Rio Grande do Sul subiu, ontem, para 147. Segundo balanço da Defesa Civil, 127 pessoas estão desaparecidas.

Voluntários

Na Usina do Gasômetro, que concentra a maior parte dos voluntários que chegaram de todo o país para ajudar no resgate de moradores e transporte de doações, o movimento, ontem, foi muito mais fraco do que o dos últimos dias. Poucos barcos navegaram nas turbulentas águas do Guaíba. Além das correntezas e do frio, pilotos relatam que está muito difícil convencer, principalmente, moradores das ilhas, que resistem em suas casas apesar dos apelos das autoridades e de socorristas. Nos últimos dias, o trabalho tem se concentrado no resgate de animais e na entrega de mantimentos a esses moradores.

Para um dos organizadores da estrutura de voluntários na orla do Guaíba, o empresário Marco Rocha, de 59 anos, a maior falha tem sido a falta de coordenação do grande volume de voluntários que chegou à capital levando suas próprias embarcações para ajudar nos resgates. "Imagina você se deslocar do seu estado e não ter ninguém para organizar o trabalho aqui. Isso deveria ser feito pelo poder público, o resto todo foi feito pela iniciativa privada", queixou-se o empresário ao Correio.

O corretor de seguros Ricardo Carrard dos Santos, que mora na Ilha das Flores, conta que é paciente oncológico e, mesmo descumprindo ordens médicas, vai continuar participando como voluntário. "Com o tratamento para o câncer, eu não conseguia ficar acordado por mais de seis horas por dia. Agora, não estou conseguindo dormir nem quatro. Há uma adrenalina enorme em fazer o bem", disse o corretor, que também aponta a deficiência na organização: "Não tem ninguém do governo para coordenar".

Sem orientação, um grupo de bombeiros civis voluntários de São Paulo e de Brasília, que chegou a Porto Alegre com cerca de 30 pessoas, não conseguiu atuar nos resgates por falta de embarcações disponíveis. A reportagem do Correio questionou a prefeitura de Porto Alegre e o governo estadual sobre as críticas dos voluntários, mas, até o fechamento desta edição, não obteve resposta.

Evacuação no sul

Pelotas, a quarta cidade mais populosa do estado, já registra a maior enchente em 83 anos, e avança no trabalho de evacuação dos moradores que vivem às margens da Lagoa dos Patos, que recebe as águas do Guaíba. O canal São Gonçalo, que liga as lagoas dos Patos e Mirim, ultrapassou o nível da cheia de 1941, de 2,88m. A prefeitura decretou, ontem, estado de calamidade no município.

Acima do nível

Dos 11 pontos de monitoramento de nível de rios e lagos, observados pela Secretaria de Meio Ambiente (Sema) do estado, oito estão acima do nível de inundação. O Rio Caí chegou à marca de 15,67m na manhã de ontem, um aumento de de mais de um metro em relação ao dia anterior (Leia mais na reportagem abaixo). Na cidade de São Sebastião do Caí, o rio ultrapassou a cota de inundação, de 10,5m. O Rio Taquari — que, assim como o Caí, o Jacuí e o dos Sinos, deságua no Guaíba (veja no mapa ao lado) — também está acima do nível de inundação.

Estragos na Serra

Gramado, na Serra Gaúcha, um dos principais destinos turísticos do país, também registrou estragos provocados pelas fortes chuvas do fim de semana. Um rua desmoronou, e parte dos moradores teve que sair de casa. Nos últimos 10 dias, a Defesa Civil vem retirando pessoas que moram em áreas sujeitas a deslizamentos de terra.

Também na Serra, Caxias do Sul soma oito mortes em consequência de deslizamentos causados pelas chuvas. Um pedido do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) foi atendido pela Justiça, autorizando a evacuação compulsória das áreas de risco no município.

Em publicação na rede social X, o governador Eduardo Leite (PSDB) informou que a situação vai piorar nos próximos dias. Ele renovou o alerta para que as pessoas que moram em áreas de risco deixem suas casas. 

 

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postado em 14/05/2024 03:55