
Em cerimônia realizada na quinta-feira (28/8), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, em Belo Horizonte, familiares da estilista Zuzu Angel e de outras 20 vítimas da ditadura militar receberam certidões de óbito oficialmente retificadas pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. O novo documento reconhece que as mortes foram violentas e causadas pelo Estado brasileiro, durante o período ditatorial entre 1964 e 1985.
A ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, participou do evento e destacou o caráter histórico da entrega. "É uma resposta que diz que a dignidade humana está acima da barbárie, e nós não nos afastaremos da luta por memória. Pois um amanhã mais justo depende do presente, depende da memória, depende das lutas coletivas", afirmou.
Ao todo, 63 certidões estavam aptas a serem entregues nesta etapa. Apenas os familiares presentes receberam os documentos durante a cerimônia, mas o ministério já planeja outras solenidades para concluir a entrega. A expectativa é que, até o fim do ano, mais de 400 certidões retificadas sejam emitidas.
A mudança nos registros atende à resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aprovada em dezembro de 2024, que determina que as certidões de pessoas mortas ou desaparecidas durante o regime militar devem registrar a causa da morte como "não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964".
Quem foi Zuzu Angel?
Estilista de projeção internacional, Zuzu Angel iniciou a carreira nos anos 1950, conquistando espaço com coleções inspiradas nas cores e culturas de Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro. Suas criações chegaram a ser usadas por nomes como Joan Crawford, Liza Minnelli e Kim Novak.
A trajetória profissional, no entanto, foi profundamente marcada pela busca pelo filho, Stuart Angel, estudante de economia e militante de esquerda, preso, torturado e morto em 1971 pelo regime militar. A partir daí, Zuzu transformou a arte em denúncia política: criou a coleção Moda Política, com peças que traziam manchas vermelhas, estampas de armas, anjos e gaiolas — símbolos do sofrimento causado pela repressão.
Em 1976, Zuzu morreu aos 54 anos, em um acidente de carro no túnel Dois Irmãos, no Rio de Janeiro. Anos depois, a passagem foi renomeada em sua homenagem. O caso, por muito tempo considerado acidental, passou a ser investigado como assassinato político após testemunhas afirmarem que o veículo da estilista foi fechado e lançado para fora da pista.
Antes da morte, Zuzu deixou registrado que qualquer suposto acidente deveria ser interpretado como ação de seus perseguidores. Em 2019, a filha conseguiu a emissão das certidões de óbito retificadas da mãe e do irmão, nas quais consta que ambos foram mortos de forma violenta pelo Estado, em razão da perseguição política.
A entrega das certidões representa um passo importante no processo de reparação histórica e de reconhecimento oficial dos crimes cometidos durante a ditadura. Para as famílias, é também um gesto simbólico de justiça e memória.
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