
O Podcast do Correio entrevistou ontem o deputado e presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação, Rafael Brito (MDB-AL), que falou sobre as dificuldades enfrentadas para se votar pautas no Congresso Nacional este ano. Entretanto, segundo ele, a educação conseguiu se tornar prioridade das Casas, que aprovaram matérias importantes. Brito comemorou a sanção do Sistema Nacional da Educação (SNE) e comentou sobre o Plano Nacional da Educação (PNE), ainda por ser votado. Confira a entrevista.
O Plano Nacional da Educação está atrasado. Qual a previsão para a votação na Câmara?
Nós tínhamos uma previsão de votar agora esta semana. Mas houve uma mudança de entendimento para votar na próxima. Ele está atrasado. Nós temos um atraso de dois anos. A meta do Plano Nacional anterior era até 2024. A presidência do biênio anterior da Câmara dos Deputados achou melhor não discutir o PNE, pois o ambiente estava muito complicado. Ou seja, pegou-se uma lei importantíssima da educação do país e deixou-se em segundo plano. Quando o presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) assumiu, logo designou o relator e uma comissão especial. Ele fez o que era necessário para o plano andar. Reconheço que atrasou, a gente já deveria ter votado, mas foi pelo volume de trabalho e de emendas.
Qual vai ser o diferencial do Sistema Nacional da Educação, sancionado este ano, para o PNE?
É a primeira vez que a gente tem um Plano Nacional de Educação juntamente com o Sistema Nacional da Educação — o SUS da Educação. E uma das funções da comissão tripartite e da comissão bipartite do SNE é o acompanhamento das metas do PNE. Isso é muito importante. Há, agora, uma responsabilização social implícita no texto para os gestores. Nós vamos obrigar os gestores a apresentarem um relatório a respeito do que eles têm feito para cumprir as metas que cabem ao seu ente federado a cada dois anos. Isso é muito importante para um controle social e dos órgãos de controle como a Controladoria-Geral da União (CGU), Tribunal de Contas da União (TCU), Tribunal de Contas do Estado (TCE), e para a sociedade civil. Dessa forma, eles poderão acompanhar o que o gestor do seu estado e do país tem feito para que aquele Plano Nacional saia do papel e passe para a entrega.
Como o SNE pretende mudar e melhorar a educação do país?
O sistema está previsto desde 1988 na Constituição Federal. O Brasil agora ganha uma ferramenta para que cada ente da federação, do município, do estado e do governo federal possa, nesse sistema de governança, saber o que precisa fazer para melhorar a sua educação. Nós criamos três instâncias, uma comissão bipartite, tal qual existe na saúde, no âmbito estadual, uma comissão tripartite no âmbito federal, a qual existe na lei do Sistema Único de Saúde (SUS). Nós imitamos tudo que deu certo no SUS, que é um grande sucesso. Além disso, criamos a Infraestrutura Nacional de Dados da Educação.
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O que a infraestrutura nacional de dados da educação vai fazer?
Quando queremos um dado sobre educação, pesquisamos o censo escolar, mas não é um dado confiável. Ele é respondido uma vez no ano, de qualquer jeito, pois os diretores de escola não têm tempo para estar preenchendo o censo escolar. As escolas não têm secretário escolar, não tem apoio técnico-administrativo, ele recebe um senso para responder e o cara vai lá no desespero, porque nem função dele é. Ou seja, nós não sabemos quem abandonou a escola, quem está com proficiência ruim em matemática, quem está ruim em português, qual é o professor que está em sala de aula, quem saiu de sala de aula e quem está afastado. Essa infraestrutura nacional de dados, tal qual existe no SUS, fará com que tenhamos os dados da educação em tempo real, desde a creche até o ensino superior, independentemente de ser rede pública ou privada. O histórico do aluno será totalmente preservado tal qual um prontuário médico.
Pensando também nos eventos climáticos, uma cidade que sofreu uma enchente e perdeu a estrutura consegue recuperar esses dados depois?
Com certeza, a infraestrutura nacional de dados lhe dá condição de ter um processo de tomada de decisão mais embasado. Outra coisa, o sistema vai fazer com que um secretário da educação de Alagoas, por exemplo, entenda quais são as escolas que melhor estão performando e quais são as que pior estão performando em matemática. Com isso, ele pode fazer um intercâmbio, uma troca, levar os professores, fazer um workshop, agindo antes de terminar o ano. O que tem acontecido é que o aluno termina o ano com um conteúdo que não adquiriu, e começa um outro ano sem o conteúdo passado, virando uma bola de neve. E nós terminamos entregando um aluno concluindo o ensino médio, sabendo aproximadamente 9% do que ele precisa saber em matemática. O sistema será um parceiro de primeira hora no processo de tomada de decisão para quem é gestor de educação em todas as esferas. É um subsídio de dados total, assim como acontece no SUS. Então é muito mais fácil tomar medidas, fazer ações legislativas ou não, para que nós possamos melhorar a nossa educação.
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Outra medida que foi votada na Câmara é o PL 3.824 de 2023, que criou Mais Professores para o Brasil. Qual é proposta?
Essa é uma proposta extremamente importante. Foi relatada na Câmara pela deputada Socorro Neri (PP-AC), e induz alunos para a docência, que é uma coisa muito importante. Ou seja, alunos que tirarem acima de 650 no Enem e forem para a licenciatura recebem uma bolsa de R$ 1.050 mil por mês durante toda a graduação. Isso é muito importante porque o mundo está vivendo um período de apagão de professores. Essa política pública faz com que bons alunos se atraiam por áreas que eles se destacaram durante a sua jornada escolar. Além disso, aqueles que já são professores de rede e quiserem se qualificar também receberão uma bolsa durante o período da qualificação. É uma política pública de colocar dinheiro na educação e colocar dinheiro para atrair pessoas para a docência.
O professor não é valorizado no Brasil. Isso é uma verdade. Mas, se o aluno carente que vai ser professor de matemática e tem um bom resultado escolar, receber a bolsa por mês durante a universidade, é uma garantia de que ele terá condições de concluir a universidade. E se ele entrar logo na sua carreira docente com piso do magistério, hoje irá receber R$ 4.860 mil. É um salário inicial que precisamos evoluir durante a carreira, ampliar.
Outra conquista foi a aprovação, na Câmara, do projeto que iguala o piso salarial do professor temporário com o efetivo. Qual a importância do projeto?
Estamos vendo uma epidemia de professores contratados. Há um tempo atrás, na série histórica, a relação era 80% efetivo e 20% temporário. Mas não é o professor contratado o problema, ele tem a mesma condição de dar aula do professor efetivo, a mesma capacidade. Porém, alguns gestores que veem nesse espaço um caminho para economizar recursos têm feito contratação temporária a mais e não têm feito mais concurso público. Então, hoje a relação que era está 53% a 47%. E o que é que acontece com os 47% de professores que são temporários? Além de não receberem o plano de cargos e carreiras, não evoluirem na carreira e não receberem nem o piso do magistério em alguns casos.
Nós estamos contratando de qualquer jeito. Além disso, esse professor é contratado por 10 meses por ano, que é um absurdo. Ele não tem direito a férias, ao 13º e, na maioria dos casos, do planejamento pedagógico da escola, ele não cria vínculo escolar com a escola em que vai trabalhar. Não conhece os colegas, não conhece o histórico dos alunos, não conhece a família dos alunos. Isso atrapalha muito no processo de educação na ponta. Trabalha totalmente às cegas, vá para lá, tua sala de aula é essa, o conteúdo é esse e tchau. E ele se sente um estranho no ninho com toda a razão.
Este ano, a polarização tomou conta de todas as pautas, inclusive em educação. A tendência é continuar nos próximos anos?
Acho que atrapalha muito, mas na educação essa polarização é um pouco menor. Ela está sempre nos mesmos assuntos, homeschooling, escolas cívico-militares e professor doutrinador. Por exemplo, falar de escolas cívico-militares. Algumas apresentam realmente resultados melhores que as escolas convencionais. Mas por quê? Porque têm ordem, porque tem disciplina? Nada disso, é porque é feita uma seleção para entrar. Se é feita uma seleção para entrar, já entram os melhores alunos. Isso é óbvio. Não tem que ter seleção nenhuma. Essa é uma das coisas que nós precisamos discutir bastante, que é muito fácil escola cívico-militar apresentar a melhor nota, claro, faz seleção para entrar, se faz seleção para entrar, entram os alunos com melhor nível de aprendizagem até aquela etapa.

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