A explosão de cores nas prateleiras dos supermercados é inegável. De iogurtes rosa-choque a salgadinhos laranja-vibrante e bebidas em tons fluorescentes, os alimentos ultraprocessados seduzem pelo apelo visual, especialmente as crianças. Mas de onde vêm essas cores tão intensas e qual o custo delas para a nossa saúde?
Na maioria das vezes, a resposta está nos corantes artificiais, substâncias sintéticas, muitas vezes derivadas do petróleo, usadas pela indústria para tornar os produtos mais atraentes. Este artigo mergulha em um tópico complexo e controverso: as evidências científicas que sugerem uma ligação entre o consumo desses aditivos, a saúde da nossa microbiota intestinal e alterações de comportamento.
O que a ciência e os especialistas dizem sobre os corantes?
A discussão sobre os efeitos dos corantes artificiais não é nova, mas tem ganhado força com novas pesquisas. No que diz respeito ao comportamento, o debate se intensificou após um estudo de 2007 da Universidade de Southampton, publicado na prestigiada revista The Lancet. A pesquisa sugeriu uma associação entre o consumo de certos corantes, como a tartrazina (Amarelo 5) e o amarelo crepúsculo (Amarelo 6), e um aumento nos níveis de hiperatividade em um grupo de crianças. Embora os resultados sejam debatidos, eles levaram a União Europeia a exigir rótulos de advertência nesses produtos. Órgãos como a Anvisa, no Brasil, e o FDA, nos EUA, consideram os corantes aprovados como seguros para a população geral, mas reconhecem que um subgrupo de crianças pode ser mais sensível.
Mais recentemente, uma nova frente de pesquisa começou a investigar o impacto desses aditivos na microbiota intestinal. Por serem substâncias sintéticas, o corpo pode ter dificuldade em metabolizá-las. Estudos preliminares, muitos ainda em animais, sugerem que o consumo regular de corantes artificiais pode alterar o delicado equilíbrio das bactérias que vivem em nosso intestino. Essa disbiose (desequilíbrio da microbiota) está associada a processos inflamatórios e a um possível aumento da permeabilidade intestinal.
Quais os benefícios de uma dieta com menos corantes artificiais?
Reduzir o consumo de corantes artificiais pode trazer benefícios que vão além da simples eliminação de um aditivo. Para o grupo de crianças que demonstra sensibilidade, pais e alguns estudos relatam uma melhora notável no comportamento. A redução pode levar a um aumento da capacidade de foco, diminuição da irritabilidade e da agitação, promovendo um dia a dia mais tranquilo tanto para a criança quanto para a família.
Do ponto de vista digestivo, evitar esses compostos sintéticos pode ser um ato de cuidado com a sua microbiota intestinal. Um intestino com uma comunidade de bactérias mais equilibrada e saudável funciona melhor, otimizando a absorção de nutrientes, fortalecendo a barreira intestinal e contribuindo para a saúde do sistema imunológico como um todo.
Talvez o benefício mais importante e inegável seja uma melhora geral na qualidade da alimentação. Alimentos que contêm corantes artificiais são, quase invariavelmente, ultraprocessados, pobres em fibras e nutrientes e ricos em açúcar, sódio e gorduras de má qualidade. Ao decidir evitar os corantes, você naturalmente passa a consumir mais alimentos in natura e minimamente processados, o que é a base para uma saúde robusta.
Como identificar e evitar os corantes no dia a dia?
Aprender a ser um “detetive de rótulos” é a principal habilidade para reduzir o consumo desses aditivos. A tarefa pode parecer difícil no início, mas com algumas dicas, torna-se um hábito.
- Leia os ingredientes com atenção: A legislação da Anvisa obriga os fabricantes a declararem o uso de corantes. Procure no rótulo a declaração “COLORIDO ARTIFICIALMENTE” e, na lista de ingredientes, busque por nomes como Tartrazina (ou INS 102), Amarelo Crepúsculo (ou INS 110), Vermelho 40 (ou Vermelho Allura, INS 129), Azorrubina (INS 122) e Azul Brilhante (INS 133).
- Desconfie de cores que não existem na natureza: Use a lógica visual. Um suco de uva com um roxo luminoso ou um salgadinho de queijo com um laranja quase fosforescente são sinais claros da presença de corantes. As cores dos alimentos naturais são mais suaves e variadas.
- Priorize a “comida de verdade”: A forma mais garantida de evitar os corantes é basear sua alimentação em frutas, vegetais, legumes, grãos integrais, carnes e ovos. Cozinhar mais em casa, preparando os lanches da semana em vez de comprar opções prontas, dá a você total controle sobre os ingredientes.
- Procure alternativas com corantes naturais: A indústria alimentícia está, aos poucos, respondendo à demanda por produtos mais limpos. Já é possível encontrar no mercado opções que utilizam corantes naturais, como o urucum, a cúrcuma, o carmim de cochonilha, o suco de beterraba ou o extrato de clorofila.
A visão regulatória e a importância da individualidade
É importante ressaltar que os corantes artificiais permitidos pela Anvisa passaram por testes de segurança e são considerados seguros para o consumo dentro dos limites de ingestão diária aceitável (IDA) para a população em geral. O debate científico atual não se concentra em uma toxicidade aguda, mas nos efeitos do consumo crônico e na sensibilidade individual, que pode variar enormemente.
Se você suspeita que seu filho ou mesmo você possa ter sensibilidade a esses aditivos, a abordagem mais segura é conversar com um profissional. Um pediatra, médico ou nutricionista pode orientar um diário alimentar para observar possíveis reações ou, se for o caso, conduzir uma dieta de exclusão de forma segura e estruturada, sem risco de deficiências nutricionais.
Comendo o arco-íris da natureza
A discussão em torno dos corantes artificiais nos convida a uma reflexão mais ampla sobre o que escolhemos colocar em nosso prato. Enquanto a ciência segue evoluindo, a decisão de ser um consumidor mais consciente e informado está em nossas mãos. A busca não deve ser pelo medo, mas pela informação.
A estratégia mais segura, nutritiva e, no fim, mais saborosa, é simples: buscar comer o arco-íris que a natureza nos oferece. Priorizar as cores vibrantes de frutas, legumes e verduras de verdade é o melhor caminho para nutrir não apenas um intestino saudável e um cérebro focado, mas a saúde do corpo inteiro.
