Coronavírus

Covid: Apesar de maior número de infecções, mulheres morrem menos; entenda

Apesar de serem maioria entre os diagnosticados com covid-19 no DF, há menos mortes de mulheres pela doença do que de homens. Não há conclusões definitivas, mas acredita-se que composição hormonal e defesas biológicas femininas influenciam

Ana Isabel Mansur
postado em 29/05/2021 06:00
 (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press - 14/5/21)
(crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press - 14/5/21)

No Distrito Federal, as mulheres representam a maior parcela dos infectados por covid-19, mas ocupam proporções menores entre as mortes pela doença. Até ontem, as mulheres constituíam 54,6% dos casos, enquanto os óbitos tinham representação feminina de 42,9%. Não há, segundo especialistas, um único motivo para a maior presença delas entre os infectados, mas, ao contrário do que era sabido no início da pandemia, a explicação para a menor participação feminina no número de óbitos está em fatores biológicos.

Uma das justificativas para a menor parcela de mortes de mulheres entre os casos da doença pode residir no fato de, no geral, mulheres serem mais atentas aos cuidados com a saúde do que os homens e não demorarem para buscar atendimento. “Desde o ano passado, o padrão é esse. Apesar de não haver comprovação, a hipótese é de que a maior busca por unidades de saúde leva a mais diagnósticos, o que justificaria mais mulheres entre as notificações de casos da doença, mas não necessariamente entre os infectados. Pode estar ligado à maior procura delas por atendimento”, alega o professor de epidemiologia da Universidade de Brasília (UnB) Mauro Sanchez.

Segundo o pesquisador, alguns fatores de risco, como doenças cardiovasculares, costumam ser mais frequentes em homens. “Talvez a mortalidade se iguale quando o grupo das comorbidades terminar de ser vacinado. Homens costumam ser mais resistentes aos cuidados com a saúde”, reflete o professor. É o caso do marido de Selma Coelho, Clóvis Torres. Os dois começaram a sentir sintomas da covid-19 em agosto mas, ao contrário da esposa, Clóvis, de 57 anos, resistiu em buscar atendimento médico. “Ele dizia que não precisava ir ao médico, que era só uma gripe e que logo ia melhorar, tomando chá e suco de limão. Mesmo depois que o resultado do exame deu positivo, ele demorou para ir a uma unidade de saúde. Só procurou quando começou a piorar os sintomas, com febre, muita tosse e cansaço extremo”, relata a artesã, de 53 anos.

Ao buscar atendimento em uma unidade de Taguatinga Sul, o morador do Lúcio Costa foi logo encaminhado ao Hran, onde descobriu que estava com 15% do pulmão comprometido. Ainda assim, e contra a indicação médica, Clóvis não quis se internar e voltou para casa. Quando os sintomas voltaram a piorar, ele retornou ao hospital, onde ficou internado por 15 dias. Felizmente, não precisou ser intubado e ficou apenas fazendo uso do oxigênio. “Graças a Deus, ele ficou bem. Eu estava me cuidando bastante e ele também, mas homem às vezes pode ser meio desligado”, completa a moradora do Lúcio Costa.

Exposição

A infectologista do Hospital Regional da Asa Norte (Hran) Ana Helena Germoglio acredita que podem haver outras explicações envolvidas. “A proporção de infecções é variável de acordo com o local. Se infecta mais quem se expõe mais”, observa a médica. Júlia Pereira, gerente de Estudos e Análises de Proteção Social (Geprot) da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), acrescenta outro fator comportamental à hipótese da médica. “As mulheres, de forma geral, estão mais nas atividades de cuidado, inclusive não profissionalmente. Se, por exemplo, um filho se infecta com covid-19, provavelmente quem vai cuidar dele será a mãe, não o pai. Há também a quantidade de empregadas domésticas que permaneceram no trabalho durante a pandemia e acabaram se infectando com os patrões. São muitas possibilidades do porquê as mulheres se infectam mais, mas são apenas conjecturas, ainda não há respostas definitivas”, ressalta a gerente.

Letalidade

A infectologista Ana Helena Germoglio aponta que a menor taxa de mortes por covid-19 entre as mulheres pode ser explicada por fatores hormonais e imunológicos. A médica traz o conceito do envelhecimento do sistema imune. “A imunossenescência, que leva o organismo a responder menos às agressões externas como doenças virais e bacterianas, é mais tardia na mulher do que no homem. Mas isso explica somente a maior morte de homens idosos, não dos jovens”, continua. De fato, dados da Codeplan para a razão entre a proporção de faixas etárias por gênero na população geral aponta maiores números apenas nas idades acima de 60 anos — o que significa dizer que, na parcela de todas as mulheres idosas do DF, a proporção de mortes por covid-19 é maior do que aquela presente no quinhão de homens idosos da capital federal.

“Existe, também, a regulação hormonal do estrógeno, um hormônio basicamente feminino, que influencia o sistema imunológico. O estrógeno tem um fator que regula a imunidade e melhora a resposta imune feminina. Em contrapartida, a testosterona, hormônio presente em maiores quantidades no homem, tem menor efeito protetor. O estrógeno regula de forma positiva as células do sistema imunológico e influencia, principalmente, a imunidade inata, a primeira linha de defesa do organismo e a primeira resposta a qualquer estímulo agressor, tornando-a mais eficiente do que no homem. O estrógeno também aumenta a produção da proteína celular onde o vírus se liga, que todos temos. Isso eleva o efeito anti-inflamatório do hormônio e reduz a inflamação secundária à covid-19. Então a imunossenescência tardia somada ao efeito benéfico do estrógeno leva ao menor índice de mulheres entre os casos graves e as mortes pela doença”, completa a infectologista Ana Helena Germoglio.

Recuperação leve

A auxiliar administrativa Marlene Barros costumava voltar do trabalho de carro com o marido, Marlucio Marques, ambos de 45 anos. Porém, por conta de mudanças de horários, a moradora de Sobradinho passou a retornar para casa de ônibus. “Eu usava álcool em gel e ficava sempre de máscara, com três reservas na bolsa”, relata. Ainda assim, foi diagnosticada com covid-19 em 18 de fevereiro. “Não faço ideia de onde posso ter pegado, é difícil saber, pode ter sido em qualquer lugar”, afirma Marlene, que se isolou em casa após o resultado do teste.

“Quando comecei a sentir alguns sintomas, eu e meu marido continuamos dormindo juntos e, mesmo assim, ele não pegou”, relata. A auxiliar se recuperou com 20 dias em casa, medindo a pressão e aferindo a saturação sanguínea, com oxímetro de dedo, todos os dias, e fazendo o tratamento indicado pela unidade de saúde. “Graças a Deus, eu não fiquei grave, mas ainda hoje sinto algumas coisas por causa da doença. Meu cabelo está caindo muito, ganhei um pouco de peso e tenho tido ansiedade e dificuldade para dormir. Minha médica me disse que outras pessoas também têm reparado as mesmas coisas”, completa Marlene.

 

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Casos de covid-19 no DF

Homens: 183.041
Mulheres: 220.134

Mortes por covid-19 no DF
Homens: 4.908
Mulheres: 3.692

Casos entre mulheres por faixas etárias
15 a 29 anos: 55,2%
30 a 59 anos: 54,6%
60 anos ou mais: 55,4%

Regiões Administrativas com maiores proporções de casos entre elas:
Varjão: 63,4%
Fercal: 61,1%
Itapoã: 60,3%

Óbitos entre homens por faixas etárias:
15 a 29 anos: 56,5%
30 a 59 anos: 62,7%
60 anos ou mais: 55,1%

Regiões Administrativas com maiores proporções de óbitos entre eles:
Arniqueiras: 73,5%
Águas Claras: 67,3%
Lago Sul: 66,2%

Fontes: Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) e Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan)

 

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