O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) decidiu, em segunda instância, que o Executivo local deverá garantir a uma mulher o tratamento cirúrgico para retirada do contraceptivo intrauterino Essure, da empresa alemã Bayer. A sentença determina que a remoção do dispositivo, implantado na paciente em 2014, ocorra na rede pública de saúde e conte com os procedimentos pré-operatórios necessários à intervenção.
A determinação é dessa terça-feira (17/8) e altera a decisão da primeira instância, que negou o pedido da paciente. Em caso de indisponibilidade para realização do procedimento na rede pública de saúde, ele deverá ser feito na rede privada, em até 30 dias úteis, sob pena de multa diária. Cabe recurso da decisão aos tribunais superiores.
Em um parecer, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) havia ressaltado que o entendimento dos órgãos técnicos sobre os danos que o dispositivo causa à saúde está consolidado. A instituição defende que as provas apresentadas no processo demonstram o perigo da manutenção do Essure no corpo da paciente, com risco "real e iminente de perfuração" por deslocamento do item.
O Correio procurou a Secretaria de Saúde (SES-DF), mas não recebeu um posicionamento até a mais recente atualização desta reportagem. A Bayer afirmou que "se solidariza com todos que possam ter tido algum problema de saúde ao usar qualquer produto, independentemente da causa." Leia abaixo a nota completa da empresa.
Controle
No Distrito Federal, as denúncias feitas pelas mulheres que implantaram o dispositivo da Essure por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) ganharam destaque em 2020, em função do aumento dos pedidos judiciários de intervenção para retirada. Na capital federal, cerca de 100 pacientes inseriram o contraceptivo da marca. Algumas apresentaram complicações severas.
O Essure é uma alternativa ao procedimento de ligadura das trompas. Uma de cada lado, as duas molas de 4cm feitas de aço inoxidável interrompem o processo de fecundação. Nos primeiros estudos médicos, o dispositivo, que não precisa de anestesia geral para ser instalado, apresentou taxa de complicações baixa, similar à da laqueadura.
O método foi aprovado por órgãos de controle da Europa, em 2001, e dos Estados Unidos, em 2002. Desde então, o uso do Essure se difundiu para vários países, inclusive o Brasil, em 2009. Em 2015, o órgão norte-americano responsável pela avaliação de novos tratamentos iniciou um processo de revisão quanto à segurança do item, após uma petição pública mencionar efeitos adversos nas mulheres.
Em 2016, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou dois alertas sobre o uso do item. No ano seguinte, a autarquia suspendeu a importação, a distribuição, a comercialização, o uso e a divulgação do Essure, determinando o recolhimento do produto.
Acompanhando países como Canadá, França e Estados Unidos, a agência reavaliou os estudos clínicos associados ao registro inicial do dispositivo. Oito meses depois, a Anvisa liberou novamente a comercialização do Essure, após receber detalhes sobre os riscos do uso.
Pedidos
Em maio de 2020, a Promotoria de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Provida) do MPDFT cobrou agilidade na tramitação dos processos que envolvem o contraceptivo permanente. Além disso, a Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (Prosus) pediu à SES-DF que defina e regule os cuidados necessários às pacientes que implantaram o contraceptivo na rede pública.
Em junho de 2020, a 5ª Vara da Fazenda Pública e Saúde, do TJDFT, concedeu liminar para obrigar o Distrito Federal a garantir a cirurgia de retirada do contraceptivo de uma paciente que teve complicações desde a colocação do dispositivo. Em outubro, a decisão se manteve, na 1ª Turma Recursal da corte.
Empresa
"A prioridade da Bayer é a segurança e eficácia dos nossos produtos. Nos solidarizamos com todos que possam ter tido algum problema de saúde ao usar qualquer um deles, independentemente da causa.
Em 2018, a Bayer anunciou uma interrupção voluntária das vendas e distribuição do Essure nos Estados Unidos, que se seguiu a uma ação semelhante em todos os outros mercados um ano antes; em ambos os casos, a decisão foi baseada na queda nas vendas do Essure nos últimos anos e na conclusão de que o negócio do Essure não era mais sustentável. Vários fatores contribuíram para o declínio do interesse no Essure, incluindo a redução do uso de anticoncepcionais permanentes em geral e o aumento do uso de outras opções de controle de natalidade, como anticoncepcionais reversíveis de ação prolongada (LARCs).
A suspensão breve e temporária no Brasil em 2017 ocorreu em decorrência de questão administrativa ocasionada por atraso na apresentação de documentos pela COMMED (Comercial Commed Produtos Hospitalares Ltda), detentora do registro do produto no Brasil e responsável pela distribuição exclusiva à época. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) restaurou a comercialização do Essure® no Brasil após a resolução dessa questão administrativa.
A empresa defende a segurança e eficácia do Essure, demonstradas por um corpo robusto de estudos científicos. Esse conjunto de dados inclui os resultados de 10 ensaios clínicos e mais de 70 estudos observacionais acompanhando pacientes em situação de uso real, conduzidos pela empresa e pesquisadores independentes nos últimos 20 anos, envolvendo mais de 270 mil mulheres. Os resultados de diversos grandes estudos comparando pacientes com Essure a pacientes que fizeram laqueadura mostram de forma consistente que o perfil de segurança do Essure é comparável ao da laqueadura. Sete entre oito estudos mostram que os pacientes com Essure apresentam menores taxas de dor pélvica do que os pacientes com laqueadura, e seis entre seis estudos mostram que os pacientes com Essure têm menos probabilidade de serem submetidas a histerectomia do que as pacientes com laqueadura.
Mulheres com Essure podem continuar confiando nele para sua saúde reprodutiva e devem conversar com seus médicos se tiverem alguma dúvida ou preocupação."
*Matéria atualizada em 20 de agosto, às 21h22, para incluir a resposta da Bayer.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.