Punição

Grupo de 18 mulheres denuncia erros médicos de cirurgiã plástica do DF

Médica Milena Carvalho é acusada de negligência no pós-operatório em casos de necroses e manchas em pacientes após cirurgias plásticas. Profissional alega "absoluto zelo"

A cirurgiã plástica do Distrito Federal Milena Carvalho Almeida Galdino está sendo acusada de negligência no pós-operatório por um grupo de, no mínimo, 18 mulheres. As ex-pacientes afirmam que a profissional teria cometido erro médico após os procedimentos. Com quase 26 mil seguidores em uma rede social, ela tem registro profissional no Conselho Regional de Medicina do DF (CRM-DF) há 10 anos, tempo em que atende em uma clínica no Lago Sul.

De acordo com as denúncias, em cinco operações estéticas — a maioria nos seios e na barriga — , a profissional causou necroses e infecções nas pacientes.

Ao Correio, uma das vítimas, que não quis ser identificada, fala sobre o sofrimento que viveu e a luta para tentar reconstruir a aréola de uma das mamas, após um procedimento feito com Milena, em 20 de novembro de 2020.  “Ela era minha cliente de uma empresa, eu a conheci através de outra médica”, diz a vítima, que vendeu brindes corporativos à cirurgiã.

Por ter um filho pequeno, na época com 3 anos, a paciente preferiu marcar a cirurgia — orçada em mais de R$ 13 mil — para novembro, para conseguir comemorar o aniversário do filho, no fim de dezembro, após os 30 dias estimados para o repouso. “Decidi assim porque eu iria fazer um bolinho em casa para o meu filho”, explica.

No dia da cirurgia, após o procedimento, a médica perguntou à noite, por mensagem, como a paciente  estava durante o repouso, em um centro clínico particular no Jardim Botânico. “Falei que estava sentindo algum desconforto e ardência no peito. No dia 21, ela me deu alta da clínica e tirou a faixa dos meus seios, e vi que o bico do meu peito estava bem preto e já estava necrosado”, relembra.

Durante a conversa, a cirurgiã disse a ela para não se preocupar e tomar os medicamentos no pós-operatório, para circular o sangue na aréola. “Era para ter me encaminhado para a hiperbárica para resolver o problema”, diz a moça, ao se referir a uma cicatrização de feridas por meio de uma câmara de oxigênio.

Arquivo pessoal - Manchas em barriga de paciente vítima de erro médico após cirurgia plástica
Arquivo pessoal - Conversa de mensagens de médica com paciente

Aspecto queimado

A moça diz que tem a mama com aspecto queimado,  o aspecto seria, em boa parte, por conta do uso de um medicamento que trata infecções na pele. “Para mim, acho que ela tinha convicção do que estava passando. Depois fui descobrir que também é usado em cachorros”, relembra.

Segundo a mulher, o advogado conseguiu suspender o restante das parcelas do valor acordado para realização da cirurgia: R$ 13.235. Mas o prejuízo poderia ter sido maior, pois a médica ofereceu três opções de valores para a paciente fazer uma tatuagem em cima das feridas: uma de R$ 5 mil, outra de R$ 2 mil e uma de R$ 500.

Segundo relata a vítima, a profissional indicou uma pessoa especializada em tatuagens para mulheres que tiveram câncer de mama. “Ela entrou em contato comigo e falei que ela poderia conversar com o meu advogado. Ela ainda afirmou que a minha mama estava perfeita”, indigna-se. “Perguntei se ela não iria reconstruir, e ela disse que não, pois não iria me levar para o centro cirúrgico”, rememora.

O advogado da ex-paciente é Jadson Carvalho Lino, que também representa outras quatro vítimas da médica. Segundo ele, foi feita uma denúncia junto ao CRM-DF e a Polícia Civil. “Estamos entrando com as ações judiciais por danos morais, materiais e estéticos”, esclarece.

Do sonho ao pesadelo

Uma semana depois da operação, a médica não reconheceu que o peito da paciente estava necrosado. “Quando procurei outros profissionais, descobri que o meu peito estava necrosado. Ela me mandou um print dizendo ‘ta lindona’. Meus pontos começaram a abrir, e eu não podia levantar o braço, o meu filho queria ir no colo e eu não podia", lembra.

A paciente decidiu contratar uma enfermeira para cuidar das mamas. Ela recorda que, assim que a profissional constatou a necrose, pediu urgência para tratar da infecção. Entretanto, a cirurgiã plástica que fez o procedimento inicial dificultou a autorização para o atendimento. Após muita insistência, ela conseguiu com que Milena autorizasse e seguiu sob os cuidados da enfermeira. O seio só cicatrizou em junho deste ano. “A médica nunca fez curativo em mim”, desabafa.

As sequelas ficaram, ela acabou perdendo a aréola da mama direita e ficou muito abalada emocionalmente. Agora, ela recebe atendimento psicológico e psiquiátrico (confira abaixo), e faz terapia com o filho por conta da depressão desencadeada. “Foi um sonho que virou pesadelo, pois ele perguntava por que eu não podia pegá-lo no colo”, recorda a mãe da criança.

Arquivo pessoal - Encaminhamento médico de paciente com depressão pós-operatório a psicólogo e psiquiatra
Arquivo pessoal - Encaminhamento médico de paciente com depressão pós-operatório a psicólogo e psiquiatra

Em setembro deste ano, a médica ainda fez contato por mensagem com a antiga paciente. “Ela queria brindes corporativos, falava como se nada tivesse acontecido”, espanta-se.

Com o episódio, a vítima orienta que outras mulheres pesquisem bem sobre os cirurgiões antes de marcarem consultas ou cirurgias. “Seu sonho pode custar sua vida. Meu filho talvez hoje não poderia me ter viva ao lado dele. Agradeço a Deus a oportunidade de estar viva. É muito doloroso me olhar no espelho depois do resultado”, desabafa a mulher.

Reações imediatas

Com o desejo de melhorar a aparência, outra paciente da cirurgiã plástica, que também preferiu manter a identidade em sigilo, fez uma abdominoplastia com lipo em 1º de julho deste ano. Ao sair da sala de recuperação, identificou manchas arroxeadas no abdômen. "Com o passar dos dias foram ficando pretas", relata.

Ao ver as reações na cliente, a médica afirmou que as manchas e a abertura na pele eram normais no pós-operatório. "Ela me falava que estava fina e com bom resultado", afirma a denunciante.

Segundo a vítima, ela ficou com uma infecção ainda em cicatrização. "Tive apoio da família e de uma enfermeira (de hospital particular) no cuidado com curativo e ferida", diz. A mulher se emociona ao lembrar os oito dias que ficou internada na UTI de um Centro Clínico e mais quatro em um apartamento da unidade de saúde. "Fiz um enxerto que não deu certo, precisando do curativo fora do hospital", conta.

Saiba Mais

O que diz a médica?

Em nota, a médica Milena Carvalho afirma que repudia veementemente as acusações anônimas de não ter prestado apoio pós-operatório. A médica diz seguir rígidos protocolos de cuidados e acompanhar os pacientes antes, durante e depois dos procedimentos, “mesmo naqueles casos em que os pacientes não cumpriram o necessário protocolo, ela sempre esteve inteiramente à disposição para atender e solucionar qualquer situação que tenha ocorrido”, reforça.

Na nota, a médica assegura que os retornos pós-operatórios seguem um protocolo rígido e são orientados a serem realizados na clínica semanalmente no primeiro mês, após três meses, seis meses e um ano, ou em qualquer outra ocasião. “Nos retornos são procedidas avaliações presenciais, curativos, realizadas fotografias de registro e orientações”, garante.

A médica conta que está “abalada com as acusações anônimas e infundadas e teme as consequências desse massacre midiático para sua vida, já que hoje ela se encontra grávida de quatro semanas e enfrenta uma gestação de risco”, informa no texto.

A Polícia Civil do Distrito Federal apura o caso. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) também investiga a denúncia. O Conselho Regional de Medicina do DF (CRM-DF) comunica, em nota, que foi notificado da denúncia através do Ministério Público e está apurando os fatos.

Uma das principais mídias sociais da médica ficou indisponível nesta quinta-feira (26/11) após a divulgação do caso na imprensa.

Suspensão

Em agosto deste ano, ela foi suspensa pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) por infringir o “regimento interno” da entidade. A instituição destaca que a suspensão da médica dos quadros da instituição não se refere aos casos atuais.

A SBCP afirmou entender que qualquer pré-julgamento acerca de fatos não comprovados, se trata de mera especulação e exploração sensacionalista de um momento delicado como tal. "Não obstante, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, aguarda o pronunciamento conclusivo dos órgãos oficiais acerca dos fatos, para que possa se manifestar tecnicamente sobre o ocorrido e, agir no âmbito de suas funções", conclui a instituição.