Pandemia

Covid-19: morte de bebê de 1 ano e 4 meses reforça gravidade da ômicron

Menino de 1 ano e quatro meses não resistiu enquanto aguardava um leito de UTI. Especialista alerta que a vaga na terapia intensiva pode mudar o destino do paciente. Cinco crianças de até 10 anos perderam a vida no DF desde o início da crise sanitária

Samara Schwingel
postado em 03/02/2022 05:49 / atualizado em 03/02/2022 05:51
Bebê de 1 ano e quatro meses morreu no Hospital Regional do Paranoá na segunda-feira (31/1) -  (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press)
Bebê de 1 ano e quatro meses morreu no Hospital Regional do Paranoá na segunda-feira (31/1) - (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press)

A morte de uma criança de 1 ano e quatro meses à espera de um leito de unidade de terapia intensiva (UTI) acendeu um alerta no Distrito Federal. O menino morreu no Hospital Regional do Paranoá. A confirmação de infecção pelo novo coronavírus veio um dia após o óbito. Nessa quarta-feira (2/2), a ocupação de UTIs pediátricas e adultas chegou a 100%. Entre novembro de 2021 e janeiro de 2022, os casos de crianças de até 10 anos com covid-19 aumentaram 1.640% — passando de 220 para 3.828. Especialistas destacam a necessidade de se ter disponibilidade de leitos para atender à população.

À noite, a rede pública de saúde operava com 94,95% dos leitos de UTI-covid ocupados, sendo que dos 118 disponíveis, cinco estavam capacitados para atendimento, inclusive um neonatal. Nos hospitais particulares, a lotação de vagas estava em 89,41% — dos 141 leitos, 29 estavam liberados. Em ambos os casos, todos os leitos pediátricos tinham pacientes. Segundo o InfoSaúde, portal de transparência da Saúde do DF, há nove crianças de até 10 anos internadas com covid-19 na capital federal em em tratamento intensivo. Dessas, cinco têm menos de 1 ano.

A infectologista Ana Helena Germoglio, que atua em unidade de terapia intensiva, explica que o atraso na internação em uma UTI pode mudar o destino do paciente. "É uma fila única. Quando o paciente é atendido e o médico demanda para a central um leito, ele entra na fila de acordo com a prioridade. Qualquer paciente que precise de uma UTI tem um motivo, e o atraso no encaminhamento pode sim mudar o desfecho do paciente", ressalta. A médica afirma que o tipo de atendimento é diferente em uma UTI e que uma pessoa, independentemente da idade, pode ficar algumas horas sem o suporte, mas que é preciso celeridade no processo.

Estado grave

Segundo a Secretaria de Saúde, o bebê de 1 ano e quatro meses morreu na noite de segunda-feira (31/1) por causa de um quadro respiratório agudo. A criança deu entrada no Hospital Regional do Paranoá durante a madrugada com suspeita de pneumonia. Recebeu tratamento com antibióticos e iniciou a oxigenação. Ao mesmo tempo, foi testada para covid-19. No decorrer do atendimento, o quadro evoluiu com instabilidade respiratória. A equipe médica inseriu a criança na fila de espera por leitos com classificação de prioridade 2, indicada para pacientes que necessitam de suporte ventilatório, porém sem intubação.

Às 18h, a criança apresentou piora abrupta no quadro clínico e sofreu uma parada cardiorrespiratória. Os médicos tentaram reanimá-la por 40 minutos, mas não conseguiram reverter a situação. O resultado positivo para covid-19 foi confirmado um dia depois. Em nota, a pasta lamentou o ocorrido, mas disse que não houve desassistência à criança.

O superintendente da Região de Saúde Leste, responsável pelo hospital em que o menino morreu, Sidney Sotero, explica que o bebê chegou em estado grave. “Tinha um indicativo de quadro de pneumonia. Por volta de 11h, ele foi inserida na fila e, às 18h, foi inserida para prioridade 1”, conta. Segundo ele, a criança não apresentava comorbidades, mas, há alguns dias, toda a família estava com sintomas gripais. “Principalmente, a mãe. E é a pessoa que fica mais próxima do bebê nesta idade”, completa. Na unidade em que o menino morreu, há mais cinco crianças com suspeita de covid-19 e uma com infecção confirmada. Segundo Sidney, nenhuma delas precisa de UTI.

O governador Ibaneis Rocha (MDB) lamentou a tragédia. "O Secretário de Saúde me disse, ainda hoje (quarta-feira), que não houve falta de atendimento, o atendimento foi dado e que, infelizmente, o bebê acabou falecendo. A gente lamenta muito a morte dessa criança", declarou o chefe do Executivo local em agenda realizada na Estrutural.

Colaborou Ana Isabel Mansur

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O vírus em crianças


“Crianças novas têm tanto risco de pegar covid-19 quanto as pessoas mais velhas. O que acontece é que a criança teria uma probabilidade menor de desenvolver os casos graves e vir a óbito. No entanto, normalmente, crianças menores de 2 anos são muito frágeis. Ou seja, qualquer doença, para esse público é um fator de risco para morte.

Para menos de 5 anos, ainda não tem nenhuma vacina aprovada, mas o ideal é que tenha e que entre no calendário vacinal das crianças. Algumas já estão testando, mas nenhuma aprovada nem fora do Brasil.

A terapia intensiva (UTI) é um local de suporte à vida. No pronto-socorro, tem-se um suporte, mas não é o ideal. Quanto mais cedo o paciente for para a UTI, melhor é, porque tem uma equipe destinada ao suporte de pessoas que estão em estado grave. Este cenário de alta ocupação de leitos é extremamente preocupante e não pode permanecer.”

Dalcy Albuquerque, infectologista da Sociedade Brasileira de Infectologia

Mais de 5,3 mil infectados

A taxa de transmissão do vírus no Distrito Federal caiu pela oitava vez seguida, nessa quarta-feira (2/2), e chegou a 1,2 — ou seja, 100 pessoas infectadas podem contaminar outras 120. Apesar da diminuição, a Secretaria de Saúde registrou 5.382 casos de covid-19 e 11 mortes em 24 horas. O DF acumula 617.945 infectados e 11.197 vítimas da doença. A média móvel de ocorrências cresceu 82,5% nas duas últimas semanas e está em 6.666; a de óbitos subiu 275% e está em nove.

O que fazer quando não há vagas em UTI

  • As recomendações valem para qualquer tipo de necessidade de UTI, não só em casos de covid-19. É um direito do cidadão que deve ser respeitado pelo Estado, de acordo com o Artigo nº 196 da Constituição Federal de 1988.
  • O fornecimento de saúde é mais do que só um leito de UTI, mas quando focamos na urgência em momentos de crise, como agora, a única medida possível para garantir esse direito é a via judicial.
  • Há duas formas de buscar: por meio da Defensoria Pública ou procurar um advogado.
  • Na Defensoria Pública, será necessário apresentar documentação que comprove impossibilidade de arcar com custos judiciais.
  • É interessante procurar um advogado que seja especialista na área, para apontar os melhores caminhos para conseguir, efetivamente, a liminar de forma mais rápida.
  • Desde o início da pandemia, o Judiciário não defere a internação imediata, mas define que o leito seja disponibilizado da forma mais rápida possível, além de pedir consulta à fila de espera, que considera fatores referentes a urgência dos pacientes e necessidades específicas.
  • Em média, atualmente, esse tipo de liminar no DF tem levado entre 24h e 48h para ser atendido. Não há prazo para concessão de liminares.
  • Depois, a depender da determinação judicial, a Secretaria de Saúde deve prestar informações e comprovar que está fazendo esforços para atender.
  • Via de regra, o DF, depois da liminar, as pessoas têm conseguido uma vaga. Não é possível prever o tempo, porque, para mensurar, seria necessário saber quando haverá vagas ou abertura de leitos.
  • O direito constitucional brasileiro dá acesso à saúde, que não inclui apenas UTIs, mas também medicamentos, tratamentos e terapias. A saúde é muito mais do que apenas cura de doenças, é um direito biopsicossocioespiritual.

Fonte: Alexandra Moreschi, advogada e presidente da Comissão de Direito à Saúde da OAB-DF

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