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Especialistas alertam que não existe limite seguro para álcool e direção

Mesmo com mais um caso de atropelamento por condutor alcoolizado, motoristas insistem em beber e dirigir

A cada 13 horas, uma pessoa foi vítima da combinação de álcool e direção no Distrito Federal, conforme um levantamento feito pelo Correio. Em menos de três dias, foram cinco ocorrências, sendo duas fatais. A mais recente vítima é Gilberto Bezerra de Siqueira, 63 anos, que morreu na noite do último sábado, após ser atropelado por um carro, na DF-475. O motorista, Gilberto Torres Coelho Júnior, 50, havia ingerido bebida alcoólica. A prática, que é considerada um crime há 14 anos, conforme o Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Ainda assim, a imprudência e a crença de conhecer o limite para a ingestão de bebidas são desafios para o poder público que segue tentando convencer os condutores de que não há limite seguro para a prática.

Nos meses de janeiro e fevereiro, foram registradas 5.145 infrações pelo Departamento de Trânsito (Detran-DF), Departamento de Estradas de Rodagem (DER-DF) e Polícia Militar (PMDF), no Distrito Federal. O número indica aproximadamente 84 flagrantes por dia na capital e, em alguns dos casos, a alcoolemia chega a níveis acima do esperado. No caso de Gilberto, o motorista foi submetido ao teste de bafômetro, cujo resultado foi 1,34 miligramas de álcool por litro de ar expelido (mg/L), valor acima do permitido, que é de 0,33mg/L, o que indica embriaguez. A hipótese foi corroborada segundo o histórico da ocorrência, que indica que o motorista do veículo estava com "a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool".

O sinistro de trânsito ocorreu em frente a uma distribuidora de bebidas, na DF-475, em Ponte Alta, no Gama. A perícia foi solicitada para o local, e a ocorrência está a cargo da 20ª Delegacia de Polícia (Gama). De acordo com o delegado do caso, a vítima foi atropelada e encaminhada para o Hospital Regional do Gama, mas não sobreviveu. O motorista, que chegou a ser preso, mas pagou a fiança, arbitrada no valor de R$2 mil, e deve responder em liberdade. "Com relação ao homicídio culposo, ainda estamos em apuração, uma vez que merece melhor aprofundamento para entender a ocorrência dos fatos. A perícia foi feita no local, e quando emitirem o laudo, ou conseguirmos qualquer outro elemento que sirva de prova para a investigação, esse motorista pode vir a responder pelo crime", explica. O Correio tentou contato com o motorista, mas não teve sucesso. O espaço segue aberto para pronunciamento.

Sensação de poder

Assumir o risco, acreditar no domínio do corpo é algo comumente visto em casos de crimes dessa natureza, conforme explica Malthus Galvão, professor de medicina legal da UnB, e ex-diretor do Instituto Médico Legal (IML). O especialista explica que dentre as alterações produzidas pelo álcool, estão, principalmente, a falta completa de percepção e a perda de habilidades necessárias no trânsito, como tempo de reação, percepção visual e noção de autodomínio. "Pessoas não embriagadas também cometem equívocos mas, estatisticamente, está comprovado que quem bebe perde, por completo, a capacidade e também a noção de que perdeu essas habilidades, apesar do álcool dar a sensação de poder", cita.

De acordo com o especialista, há uma diferença entre alcoolemia e embriaguez. "A alcoolemia é um número, não um valor, que é medido tanto através do sangue como na respiração. A embriaguez, por outro lado, é o conjunto das alterações produzidas pelo álcool, mas que são variáveis, vai de pessoa para pessoa. Questões emocionais, inclusive, são importantes neste contexto", pondera. Dentre as variáveis para avaliar o nível da embriaguez, estão o volume ingerido, a concentração etílica, o tempo, e a massa corporal da pessoa. Diante disso, são utilizadas técnicas que avaliam as sutis alterações comportamentais, que vão desde o andar, até a negativa de fazer exames.

Se enganam aqueles que pensam que comer doce, tomar banho ou tomar remédios são alternativas que podem ajudar a reduzir a alcoolemia do corpo. É o que explica o professor. "A depender da quantidade, para você tirar o último resíduo de álcool, gasta quase 24 horas. Então, muitas vezes a pessoa acorda e acha que está com uma ressaca enfadonha, mas bebeu até de madrugada. Isso é, na verdade, a embriaguez", ressalta. "É preciso um tempo para metabolizar e sair da zona embriaguez. Após algum tempo de alcoolemia elevada, a pessoa se acostuma e acha que está bem, sob controle. Mas ao parar na blitz, acaba dançando. Então o recado é: se você tomou uma cervejinha, não dirija", completa.

Questão de saúde

A direção sob efeito do álcool é um problema que extravasa os limites da segurança pública, atinge proporções alarmantes e, segundo a doutora em Transportes e mestra em Ciências da Saúde, Adriana Modesto, é, ainda, uma questão de saúde pública. De acordo com ela, os prejuízos do consumo de álcool são em decorrência de três fatores: toxidade, intoxicação aguda ou dependência. A dependência ao álcool pode gerar uma série de agravos à saúde, conforme explica Adriana.

"Tais como: contribuição ou agravamento de doenças crônicas, problemas psicossociais e outros tipos de violência além da relacionada ao trânsito", cita. Segundo a especialista, após ocorrências de trânsito, o álcool pode prejudicar, ainda, o diagnóstico e atendimento da vítima, além de desenvolver o agravamento de doenças crônicas latentes, e aumentar as chances de reincidência e dificuldade de recuperação.

Por isso, a especialista reforça a importância de políticas públicas integradas, que combatam a reincidência de casos, que podem ser causados, inclusive, pelo alcoolismo. "É necessário o aprimoramento dessas abordagens e que tratem o tema como questão de saúde pública, sobretudo, em se tratando de reincidências", completa.

 

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