FEBRE MACULOSA

Saúde do DF investiga 42 casos suspeitos; 62 foram descartados

Nesta semana, o Distrito Federal acendeu o alerta para um suposto caso de contaminação pela doença, que teria ocorrido às margens do Lago Paranoá. Especialista destaca que o caminho não é "demonizar" as capivaras

 Carrapato-estrela, transmissor da bactéria causadora da febre maculosa -  (crédito:  Prefeitura de Jundiaí/Divulgação)
Carrapato-estrela, transmissor da bactéria causadora da febre maculosa - (crédito: Prefeitura de Jundiaí/Divulgação)
Arthur de Souza
Letícia Mouhamad
Mariana Saraiva
postado em 14/09/2023 06:07

Um suposto caso de febre maculosa deixou autoridades da saúde pública do Distrito Federal em alerta nesta semana, quando uma criança teria pegado a doença após ser picada por um carrapato enquanto brincava às margens do Lago Paranoá. Em 2023, a Secretaria de Saúde (SES-DF) recebeu 104 notificações de possíveis infecções, sendo que 42 continuam sob investigação e 62 foram descartadas.

Subsecretário de Vigilância à Saúde, Divino Valero Martins conta que essas investigações costumam ser divulgadas apenas quando, de fato, há comprovação da doença, para evitar o pânico por parte da população do DF e evitar alarmes falsos. Questionado se algum desses 42 casos poderia dar positivo para febre maculosa, o subsecretário afirma que as possibilidades são baixas.

"Ao longo de 20 anos, estamos fazendo uma vigilância no Lago Paranoá e, para contrair a doença, é preciso se ter a capivara, o carrapato estrela, e que ele esteja contaminado com a Rickettsia. Então, é um conjunto de situações e, em duas décadas, não se encontrou carrapatos estrelas no Lago, a grande maioria são carrapatos de cachorros", aponta.

Ainda segundo Divino Valero, a Vigilância à Saúde tem feito, independentemente do resultado da criança, uma varredura em toda a orla do lago, para saber se tem a presença do carrapato estrela nas bordas da bacia. A mais recente foi realizada na manhã de ontem e, de acordo com a SES-DF, nenhum inseto do tipo foi encontrado. Coletas sanguíneas também vêm sendo feita com frequências em capivaras. 

O ambientalista do movimento Guardiões do Meio Ambiente Heron Sena lembra que o ser humano violou o habitat de populações de animais que viviam no Planalto Central, quando instalou a capital do país. "A partir de 1990, essa a violação foi intensificada com ocupação desenfreada do território do DF, com a baixa observação da farta legislação ambiental existente naquele período", observa.

Para o especialista, animais como as capivaras precisam da água para seu processo de vida, como alimentação e reprodução. "O caminho não é demonizar as capivaras que estão a caminhar e viver por essas terras antes da existência de Brasília", destaca. "O primeiro passo é incluir a população das capivaras em todos os planos (ambientais) do GDF, considerando que estamos lidando com um ser vivo que tem sua função a cumprir dentro do ecossistema e do bioma Cerrado", defende.

Estudo

A Secretaria de Meio Ambiente (Sema) afirmou que está elaborando, conjuntamente com o Instituto Brasília Ambiental (Ibram), a segunda fase de um estudo sobre as capivaras no Distrito Federal. O primeiro, feito em maio deste ano, apontou que capivaras ocupam apenas 25% da orla do Lago Paranoá.

A nova análise tem como objetivo: desenvolver estratégias sustentáveis de manejo de carrapatos em unidades de conservação; executar estratégias pré-aprovadas de manejo, desenvolver modelos de barreiras para evitar o deslocamento de capivaras até vias públicas; produzir e instalar barreiras para evitar o deslocamento desses animais até vias públicas, sem impedir o fluxo de pedestres; executar ações educativas evidenciando a necessidade de convivência pacífica com capivaras e sobre zoonoses.

Audiência pública

O vice-presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), deputado Ricardo Vale (PT), protocolou na última terça-feira um requerimento convocando audiência pública para o dia 28, com a finalidade de discutir a infestação de carrapatos na orla do Paranoá e as implicações dos parasitas na saúde pública do DF. A solicitação ocorreu após a suspeita do primeiro caso de febre maculosa na capital.

No início de agosto, o parlamentar havia pedido informações aos órgãos ambientais sobre quais medidas preventivas foram adotadas contra as doenças causadas pelos carrapatos identificados na orla. O pedido de esclarecimentos foi destinado à Sema e ao Ibram, devido a intensificação da presença de capivaras — principais hospedeiros de carrapatos — na orla do Lago no período da seca.

O Ibram informou, em resposta, que o DF não é uma área endêmica para febre maculosa, uma vez que não foi identificado nenhum óbito pela doença na região, nos últimos 20 anos, segundo dados do Ministério da Saúde. "Com a notícia de um possível caso, precisamos nos antecipar a uma eventual crise sanitária e tranquilizar a população sobre o cenário local e os cuidados que devem ser tomados rotineiramente", disse Vale. O distrital também afirmou que além dos humanos, pets podem ser picados pelos carrapatos, e a população precisa estar orientada.

Suspeita

A criança picada pelo carrapato foi levada a um hospital privado, onde recebeu um diagnóstico precoce e realizou o tratamento adequado, mesmo sem a confirmação da doença. Depois de cinco dias de internação, a criança teve alta e passa bem. Em nota, o SES-DF esclarece que, para que se possa confirmar ou descartar os casos, é necessário que sejam feitas duas coletas de exames, com duas semanas de intervalo entre elas, o que causa demora na confirmação.

Na terça-feira, a pasta informou ao Correio que o Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen) recebeu a primeira amostra do caso suspeito de febre maculosa e que, em duas semanas, outra amostra será coletada. A pasta esclareceu ainda que, após a coleta da segunda amostra, todo o material será encaminhado ao laboratório de referência para a doença, Fundação Ezequiel Dias, em Minas Gerais, onde será analisado. A previsão é que o resultado saia entre 25 e 30 dias.

 


  • A técnica utilizada foi a de arrasto: uma lona amarrada em cabos de vassoura para entrar em contato com o solo e a vegetação, coletando possíveis carrapatos na fase jovem, período de maior transmissão
    A técnica utilizada foi a de arrasto: uma lona amarrada em cabos de vassoura para entrar em contato com o solo e a vegetação, coletando possíveis carrapatos na fase jovem, período de maior transmissão Foto: Jurana Lopes/Agência Saúde-DF
  • Na orla do Lago Paranoá, placas alertam para a presença de carrapatos devido à circulação de animais silvestres na Área de Proteção Ambiental (APA)
    Na orla do Lago Paranoá, placas alertam para a presença de carrapatos devido à circulação de animais silvestres na Área de Proteção Ambiental (APA) Foto: Minervino Júnior/CB/D.A Press
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