INFRAESTRUTURA

Incêndio no metrô assusta passageiros e alerta para falta de investimentos

Fogo em grandes proporções em vagão chama atenção para o sucateamento desse transporte público. O Metrô-DF espera adquirir, via PAC do governo federal, a compra de 15 novos trens

Um incêndio de proporções inéditas em um vagão do metrô do Distrito Federal na manhã de ontem causou comoção e trouxe à tona a necessidade de mais investimentos na Companhia do Metropolitano do Distrito Federal (Metrô-DF). Conforme o Correio noticiou no fim de dezembro de 2023, os investimentos no metrô, por parte do Governo do Distrito Federal (GDF), caiu drasticamente nos últimos anos. Dados obtidos pelo Correio mostram que, entre 2019 e 2023, a queda nos recursos destinados ao transporte metroviário foi de 88,3% — passando de R$ 17,1 milhões para apenas R$ 2 milhões.

A população de Águas Claras e usuários do metrô relataram o caos vivido no momento do incêndio. Lucas Salvaterra e Marta Gomes são vendedores de alimentos em frente à estação do metrô Águas Claras há um ano e estavam presentes no momento da chegada do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF). "Quando vimos os bombeiros chegando, subimos até as guaritas, na Rua Pau Brasil, para ver o que estava acontecendo. As chamas já estavam altas", relatou Lucas. "Um cliente nosso disse que estava no metrô com destino a Samambaia e começou a sentir cheiro de fumaça", completa o vendedor. "A estação ficou parecendo um formigueiro. Dava para ver as pessoas bastante nervosas e apreensivas", ressaltou.

A paralisação na linha atrasou a rotina de Julia da Silva Oliveira, que estava a caminho de um compromisso. Todos os dias, ela desce no terminal Samambaia, mas hoje iria pegar um Uber para ir à  Quadra 301. "O funcionário me orientou a pegar a linha para o terminal no sentido Central, mas quando subi na plataforma, o metrô não estava passando", relatou.

Incêndio

Em coletiva de imprensa na sede da companhia, o diretor-geral Handerson Cabral Ribeiro, contou detalhes sobre o que aconteceu. Conforme a reportagem do Correio revelou em primeira mão, um passageiro notou fumaça dentro do vagão e acionou o botão de emergência. O caso ocorreu entre as estações Guará e Arniqueiras, sentido Samambaia. O piloto do trem, comunicado dentro da cabine sobre o que estava acontecendo, decidiu desembarcar todos os passageiros, evitando assim uma tragédia, tendo em vista que o trem pegou fogo minutos depois.

"Quando notado pelo piloto, foi determinada a evacuação daquele trem por completo. Após o desembarque dos passageiros, as equipes de plataforma e de segurança fizeram uma inspeção e não foi verificado foco de incêndio. O trem saiu da Estação Arniqueiras, passou pela de Águas Claras e no pequeno trajeto entre a estação e o pátio, foi notado o incêndio", explicou Ribeiro.

A diretoria da companhia anunciou que fará uma investigação interna a fim de compreender o que motivou o incêndio. Os gestores também registraram boletim de ocorrência na Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), que também irá investigar o caso. De acordo com Handerson Cabral, a manutenção ostensiva do vagão atingido aconteceu em janeiro de 2022 — o que é recomendado a cada três anos. Em janeiro de 2023, os técnicos realizaram uma nova manutenção, que está prevista para acontecer em dois anos. Na ocasião, foram feitos ajustes do engate do trem.

"O sistema de engate é o que conecta os quatros carros para fazer uma composição única. É um trem que está com o protocolo de manutenção em dia, passando regularmente por todas as revisões. Mas, nesse período, alguma coisa veio a fazer com que esse carro pegasse fogo", disse o gestor. Os integrantes da companhia pontuaram que há manutenções que ocorrem a cada 45 dias, mas não detalharam se o trem atingido pelas chamas passou por esse processo.

O carro atingido pelo incêndio é de 1994. Na coletiva de imprensa, Handerson Cabral foi questionado sobre a vida útil do trem, que completará 30 anos em 2024. O diretor-presidente reiterou que o carro ainda continuará em atividade, mas que o vagão atingindo não será mais utilizado para o transporte de passageiros. "O veículo tem cerca de 30 anos de idade. No entanto, a estrutura física desses carros é projetada para 45 anos de vida útil. Apesar de ser um dos primeiros trens, todo esse período, ele tem passado por manutenção", explicou.

"Regularmente, há notícias na imprensa de que o trem parou na plataforma ou que está com a velocidade reduzida. O que acontece é que é um equipamento mecânico, que há muita parte eletrônica dentro dele. É inevitável que possa acontecer falhas, mas automaticamente fazemos as manutenções", disse. "A primeira pergunta que todo mundo deve estar fazendo é sobre ser seguro andar no metrô. Eu digo que é seguro, porque tivemos um evento grave em um dos nossos carros e não tinha um passageiro lá dentro. Nossa equipe está preparada, treinada e capacitada, obedecendo um procedimento operacional, transportando 180 mil passageiros em segurança", afirmou.

O diretor-presidente da companhia explicou que o Metrô-DF indicou, no Novo PAC do governo federal, a compra de 15 novos trens. O custo, ao todo, gira em torno de R$ 1 bilhão. Atualmente, há 32 trens, mas apenas 24 rodam em horário de pico. "É um dos nossos pedidos para a compra de novos trens. O projeto de compra de 15 novos carros é para ampliar e renovar a nossa frota. Ao que parece, esse trabalho ainda está passando pelo crivo do Ministério das Cidades, e esperamos que Brasília seja contemplada com a aquisição desses novos trens", explicou.

Tragédia anunciada

O secretário-executivo do Instituto MDT (Movimento pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos), Wesley Ferro Nogueira, que tem acompanhado de perto a situação do Metrô-DF, explicou que os investimentos por parte do GDF estão concentrados em pessoal e custeio, deixando a desejar nas melhorias em infraestrutura. "Em uma frota de cerca de 30 trens em operações, pelo menos 20 foram produzidos em série em 1992. São 32 anos de operação. Há um desgaste grande nos trens que operam em Brasília", analisou. "Falta investimento em tecnologia também. Há instrumentos mais modernos de controle de gestão da operação e isso ainda não foi implementado no DF", acrescentou.

Wesley observou também que há uma carência de pessoal trabalhando nas estações do metrô no DF. "Muitas vezes, cheguei em estação do metrô onde não havia nenhum servidor próximo às catracas para resolver qualquer problema que surgisse", afirmou. "Percebemos um direcionamento de recursos para outras áreas, onde talvez não sejam necessários. Em vez de qualificar o sistema, investir em frota nova, ampliar o quadro de trabalhadores, usar tecnologias mais modernas, rever o contrato de fornecimento de energia, o GDF prioriza outras questões, tipo a inauguração de duas estações na Asa Sul, por onde passam pouquíssimos passageiros por dia", ressaltou. "O que aconteceu ontem era previsível. Ainda bem que não aconteceu nada mais grave. O metrô que está operando é uma bomba-relógio e isso é reflexo de anos de abandono", concluiu.

Para Carlos Penna Brescianini, especialista em mobilidade urbana, há um esvaziamento recente do quadro de funcionários do metrô, que reflete na falta do serviço no dia a dia da população, tendo em vista que o trabalho de manutenção dos trens foi privatizado. Para ele, se o vagão pegou fogo, é porque falta manutenção. "Com manutenção correta, os trens duram até 80 anos. O material ferroviário é quase eterno. No Rio de Janeiro, por exemplo, os bondes de Santa Tereza têm 80 anos e circulam", explicou.

"A causa de um incêndio é a falta de manutenção ou sabotagem. Trens não pegam fogo do nada. A manutenção do metrô está privatizada e essa é a provável causa do incêndio. O GDF optou por gastar em ônibus e obras rodoviárias. São mais de R$ 2 bilhões em subsídios às empresas de ônibus nos últimos anos. Todo ano, o Metrô perde funcionários por aposentadoria, saída ou falecimento, e não é feito o concurso para sua substituição. Repito: trens não pegam fogo do nada", completou o especialista.

Comissão

Em outubro de 2023, a Comissão de Transporte e Mobilidade Urbana da Câmara Legislativa (CLDF) acionou o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) para apurar irregularidades no Metrô-DF. O grupo citou problemas relacionados à manutenção da rede metroviária e as frequentes interrupções do serviço, além de irregularidades na administração de pessoal do Metrô.

Para o presidente da Comissão de Transporte, deputado distrital Max Maciel (PSol), a população sofre há anos com o transporte público do DF em consequência do descaso e do desinteresse do governo. "O sistema não oferece qualidade e segurança aos usuários e eles ficam sem alternativas para garantir o seu direito ao transporte. Precisamos de alternativas viáveis e eficientes para evitar o colapso de todo o sistema de transporte do DF", alega o parlamentar.

Cronologia do acidente

11h45: Entre as estações Guará e Arniqueiras, um passageiro notou fumaça saindo do teto do veículo. No mesmo momento, ele acionou o botão de emergência do vagão e comunicou o piloto.

11h48: O piloto decidiu parar o trem que era sentido Samambaia na Estação Arniqueiras. Ele saiu da cabine e foi averiguar a situação dentro do vagão, percebendo que havia fumaça. No mesmo momento, ele acionou a central de controle e todos os passageiros foram removidos dos vagões. Foi decidido que o trem seria levado ao pátio.

11h52: No trajeto, entre o pátio e a Estação Águas Claras, um dos quatro vagões começou a pegar fogo. O motorista comunicou a central de controle e evadiu do local, sem ferimentos.

11h55: De acordo com o Corpo de Bombeiros, os militares chegaram no local da ocorrência pouco antes de meio-dia. Ao todo, nove viaturas atenderam o chamado, para apagar o incêndio do vagão atingido pelo fogo. Os bombeiros esperaram o desligamento da energia dos trilhos para apagar o incêndio, com espuma química.

12h32: Em nota encaminhada à reportagem, o Metrô-DF informou que a circulação dos trens foi interrompida logo após a notícia do incêndio que tomou conta do vagão. Todas as estações continuaram abertas, aguardando os técnicos liberarem a via.

13h13: Apesar da não liberação da via, o Metrô-DF informou que a circulação dos trens foi retomada. Na ocasião, os usuários com destino a Samambaia deveriam trazer o transbordo na Estação Águas Claras.

 

 

Mais Lidas

Cronologia

11h45: Entre as estações Guará e Arniqueiras, um passageiro notou fumaça saindo do teto do veículo. No mesmo momento, ele acionou o botão de emergência do vagão e comunicou o piloto.

11h48: O piloto decidiu parar o trem que era sentido Samambaia na Estação Arniqueiras. Ele saiu da cabine e foi averiguar a situação dentro do vagão, percebendo que havia fumaça. No mesmo momento, ele acionou a central de controle e todos os passageiros foram removidos dos vagões. Foi decidido que o trem seria levado ao pátio.

11h52: No trajeto, entre o pátio e a Estação Águas Claras, um dos quatro vagões começou a pegar fogo. O motorista comunicou a central de controle e evadiu do local, sem ferimentos.

11h55: De acordo com o Corpo de Bombeiros, os militares chegaram no local da ocorrência pouco antes de meio-dia. Ao todo, nove viaturas atenderam o chamado, para apagar o incêndio do vagão atingido pelo fogo. Os bombeiros esperaram o desligamento da energia dos trilhos para apagar o incêndio, com espuma química.

12h32: Em nota encaminhada à reportagem, o Metrô-DF informou que a circulação dos trens foi interrompida logo após a notícia do incêndio que tomou conta do vagão. Todas as estações continuaram abertas, aguardando os técnicos liberarem a via.

13h13: Apesar da não liberação da via, o Metrô-DF informou que a circulação dos trens foi retomada. Na ocasião, os usuários com destino a Samambaia deveriam trazer o transbordo na Estação Águas Claras.