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Fígado e coração: mãe conta em livro a jornada que salvou a vida da filha

Narrativa de coragem e amor incondicional inspira a obra na qual Tati Rocha usa crônicas para falar da jornada que salvou a vida da filha Ana Júlia

Tati Rocha (D) doou um terço do fígado para a filha Ana Júlia: livro de crônicas celebra a luta cheia de amor -  (crédito:  Ed Alves CB/DA Press)
Tati Rocha (D) doou um terço do fígado para a filha Ana Júlia: livro de crônicas celebra a luta cheia de amor - (crédito: Ed Alves CB/DA Press)

Há 23 anos, Tati Rocha, hoje com 52, precisou encontrar coragem onde acreditava não existir. Foi quando decidiu doar um terço do próprio fígado para salvar a filha, Ana Júlia, então um bebê de apenas 8 meses, diagnosticada com atresia de vias biliares, uma doença rara que impede o fluxo da bile, causa a falência do fígado e coloca a vida em risco.

A pequena estava magrinha, com a pele amarelada e os olhinhos cansados. Cada respiração era uma luta silenciosa. "Ela não tinha mais tempo", lembra Tati. A decisão não veio sem medo, mas veio carregada do mais puro amor.

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A atresia de vias biliares é uma condição rara em recém-nascidos, que inflama e bloqueia os ductos biliares, impedindo o fígado de eliminar a bile e levando à deterioração progressiva do órgão. À época, Brasília não realizava transplantes hepáticos pediátricos, e mãe e filha precisaram viajar a São Paulo, em busca da chance de vida que parecia distante.

Foi lá, em uma sala cirúrgica fria, que o impossível aconteceu. "Quando ela recebeu o transplante, estava completamente debilitada, com o fígado falido. Se tivesse que esperar na fila, não sobreviveria. Mas, quando saiu da mesa de cirurgia, parecia outra: o rostinho corado, as bochechas rosadas, a vida voltando a pulsar", conta Tati, com os olhos marejados.

 09/10/2025 Ed Alves CB/DA Press. Cidades.  Capa do Livro - Fígado e Coração - Amor e Superação. Mãe Tati Rocha  doou 1/3  doFígado para sua filha Ana Julia.
Capa do Livro Fígado e Coração - Amor e Superação. Mãe Tati Rocha doou 1/3 do fígado para sua filha Ana Julia (foto: Ed Alves CB/DA Press)

Dessa experiência nasceu o livro Fígado e Coração, uma obra escrita a muitas mãos de emoção. São 30 crônicas nas quais Tati reconstrói a trajetória da filha e da própria maternidade, um mosaico de dor, fé, superação e esperança. "Eu sempre quis transformar essa vivência em palavras. As histórias estavam dentro de mim, pulsando, e eu precisava colocá-las no papel. É um livro sobre amor, fé e doação. As pessoas se emocionam porque veem que é possível enfrentar os desafios sem se deixar abater", afirma.

Mas a jornada de Ana Júlia não terminou ali. Ainda na infância, mesmo após o transplante bem-sucedido, ela precisou travar uma nova batalha: o diagnóstico de um câncer no sistema linfático. Foram meses de quimioterapia, hospitalizações e incertezas, e novamente, lá estava Tati, firme, ao lado da filha. "Foram dias difíceis, mas nunca faltou fé. A gente chorava, ria, rezava. E, no fim, ela venceu mais uma vez", relembra.

Hoje, aos 24 anos, Ana Júlia leva uma vida plena. Cursa administração, sonha em ser servidora pública e tem planos que só quem venceu a morte sabe valorizar. "A última crônica do livro é uma carta que ela escreveu para mim quando era pequena. Ela sempre ressaltava: 'Eu tenho um pedacinho da minha mãe dentro de mim'. E tem mesmo, um pedaço de fígado, e de alma", diz Tati, com um sorriso que mistura gratidão e ternura.

Na dedicatória, Tati estende o amor também ao filho mais novo, Paulo Eduardo, que, ainda menino, precisou lidar com a ausência da mãe durante os longos períodos de internação da irmã. O prefácio do livro é assinado pela doutora Elisa de Carvalho, médica que acompanhou Ana Júlia no Hospital da Criança e testemunhou de perto a luta da família.

Lançamento do livro no dia 13 de Outubro, no Vitorino Café
Lançamento ocorreu no último domingo, no Vitorino Café, na Asa Sul (foto: Juliete Castro )

 

Coragem

Mais do que um relato pessoal, Fígado e Coração é uma carta aberta à esperança. Tati acredita que suas palavras podem acolher e inspirar outras mães que enfrentam jornadas semelhantes. "Espero que minhas crônicas toquem as pessoas, que despertem fé e coragem. Eu precisei exercitar isso todos os dias", reflete.

O lançamento oficial do livro ocorreu no domingo passado, data escolhida por coincidirem dois símbolos de devoção na vida da autora: o Dia das Crianças e o Dia de Nossa Senhora Aparecida. "Nada é por acaso. Foi Ela quem me sustentou quando eu mais precisei. Escolher esse dia é a forma que encontrei de agradecer", conclui Tati, com a serenidade de quem transformou dor em poesia, e um pedaço do fígado em um milagre de amor.

Para adquirir o livro, basta acessar este link.

 


Trechos do livro

"Dizem que mãe sente antes mesmo de saber, como se o coração da gente tivesse uma antena, captando os sinais invisíveis do mundo. Quando algo não vai bem com um filho, o peito aperta, o ar pesa e a alma fica em alerta: preste atenção, tem alguma coisa errada."

 

"Ser mãe sozinha é carregar uma casa inteira dentro de si. É acordar cedo, lavar, cozinhar, pagar contas, resolver tudo e, ainda assim, às vezes, escutar: o que você faz?"

"No hospital, conheci mães que viraram irmãs de alma. Cada uma com sua história, sua dor, sua luta. Mas todas com o mesmo desejo — ver os filho bem, curados. (...) Aquelas mães me ensinaram sobre resiliência, enfrentamentos, acolhimento e, principalmente, sobre acreditar"

"A verdade é que, quando a gente tem um filho doente, a vida da gente fica suspensa e não é mais a gente que decide. Mesmo sendo mãe, você não manda em mais nada. São os médicos, os exames, os números. Tudo gira em torno de um resultado. A gente só obedece."

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postado em 14/10/2025 07:30
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