Em uma decisão unânime, a 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) condenou o Distrito Federal a indenizar os familiares de um detento que morreu vítima de tuberculose após não receber diagnóstico e tratamento adequados enquanto cumpria pena no sistema prisional.
O preso, Wesley Jesus de Souza, de 22 anos, faleceu no Hospital Regional da Asa Norte (HRAN) em 24 de junho de 2023, um dia após ser transferido do Centro de Internamento e Reeducação (CIR) do complexo da Papuda. Ele estava com tuberculose pulmonar ativa e pneumopatia aguda, doenças de evolução lenta e com altíssima taxa de cura se tratadas a tempo.
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A ação foi movida pela mãe, o pai e as duas irmãs de Wesley, que alegaram omissão estatal no atendimento médico. Eles pediam indenização por danos morais e materiais, incluindo pensão mensal. A sentença de primeiro grau havia julgado o pedido improcedente, mas a apelação da família foi aceita pela corte.
Condenação
O TJDFT fixou os seguintes valores de indenização:
- Dano moral: R$ 200 mil, a serem divididos igualmente entre os quatro familiares (R$ 50 mil para cada).
- Pensão mensal: equivalente a 2/3 do salário mínimo, rateados entre os autores.
- Para as irmãs: até completarem 25 anos ou até o falecimento.
- Para os pais: até Wesley completaria 76,4 anos (expectativa de vida do IBGE) ou até o falecimento de cada um.
A pensão será corrigida pelo IPCA-E e acrescida de juros, e o valor do dano moral também será atualizado monetariamente. Além disso, o Distrito Federal foi condenado a pagar honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação.
Omissão no atendimento
De acordo com relatos e registros médicos analisados pelo tribunal, Wesley apresentava sintomas típicos de tuberculose — como febre, tosse seca, dor torácica e dificuldade respiratória — há vários dias antes de ser levado ao hospital. No entanto, ele só foi encaminhado para atendimento hospitalar em 23 de junho, em estado grave.
O desembargador Fábio Eduardo Marques, relator do caso, destacou que a unidade prisional realizou mutirões de saúde em maio de 2023, incluindo busca ativa por tuberculose. Porém, não há registro de que Wesley tenha sido submetido a exames específicos para detectar a doença na ocasião. “A evolução lenta da tuberculose apenas corrobora a omissão estatal em prestar o devido atendimento, pois havia tempo hábil para um diagnóstico e tratamento eficazes”, afirmou o magistrado.
Responsabilidade do Estado
A corte reafirmou que a responsabilidade civil do Estado é objetiva — ou seja, independe de dolo ou culpa —, bastando a comprovação do nexo causal entre a omissão e o dano. O caso se enquadra na Teoria do Risco Administrativo, prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal.
Além disso, os desembargadores aplicaram a teoria da “perda de uma chance” — a qual diz que quem pratica um ato ilícito e impede outro de obter uma vantagem ou evitar um prejuízo deve indenizar a vítima pelos danos causados —, pois a demora no diagnóstico e tratamento retirou de Wesley a possibilidade real de cura. A tuberculose, quando tratada precocemente, tem cerca de 95% de chances de recuperação.
