MEDICINA

Técnica revolucionária identifica 25 genes ligados à microcefalia

O método é uma adaptação da tecnologia CRISPR, que mereceu o Nobel de Química deste ano, e promete melhorar a identificação e o estudo de genes que causam doenças nos seres humanos, incluindo o autismo

Humberto Rezende
postado em 29/10/2020 15:00
Imagem fluorescente de um organoide cerebral (modelo de cérebro criado em laboratório) usado no estudo -  (crédito: IMBA/Divulgação)
Imagem fluorescente de um organoide cerebral (modelo de cérebro criado em laboratório) usado no estudo - (crédito: IMBA/Divulgação)

Uma técnica recém-criada na Áustria, que promete revolucionar o estudo de doenças causadas por falhas genéticas, já alcançou seu primeiro resultado: a identificação de 25 genes que parecem ligados à microcefalia, condição na qual fetos se desenvolvem com um cérebro de tamanho reduzido, o que provoca uma série de dificuldades cognitivas e psicomotoras. A microcefalia afeta filhos de mulheres infectadas pelo zika vírus durante a gestação, mas essa não é a única causa da malformação, que surge geralmente por fatores genéticos.

A descrição da novidade e dos novos genes relacionados ao problema foi feita em um artigo publicado nesta quinta-feira (29/10) na revista especializada Science. Os autores são especialistas do Instituto de Biotecnologia Molecular (IMBA), em Viena, que asseguram poder usar a técnica para qualquer problema cuja origem pode ser relacionada a uma falha genética, incluindo o autismo.

Em um comunicado à imprensa, os cientistas do IMBA explicam que muitos dos princípios fundamentais da biologia e quase todos os caminhos que regulam o desenvolvimento de seres vivos foram descobertos com as chamadas telas genéticas, ou seja, o estudo por meio da desativação de genes em insetos como a mosca-das-frutas Drosophila e o verme Caenorhabditis elegans.

Ao desativar determinados genes nessas espécies, os pesquisadores conseguem ver a consequência e, assim, concluir o papel daquele pedaço do DNA no desenvolvimento de um organismo. Foi isso que permitiu, por exemplo, a identificação de genes necessários para a formação de um cérebro, inclusive o humano.
Porém, enquanto esse tipo de abordagem pode ser usado em moscas e vermes, em seres humanos é impossível. E foi para driblar essa dificuldade que os especialistas do instituto austríaco criaram a CRISPR-LICHT, uma união da tecnologia CRISPR-Cas9, que permite a correção de falhas genéticas e rendeu o Prêmio Nobel de Química neste ano, com a análise de códigos de barras genéticos, ou curtas sequências de DNA.

Microcérebros em laboratório

Com a novidade, eles acompanharam a formação de um organoide cerebral (microcérebro cultivado em laboratório) em detalhes minuciosos. "Nós conseguimos determinar o efeito de cada guia de RNA no número de células produzidas durante o crescimento do organoide", afirma Dominik Lindenhofer, um dos autores do estudo.

"Assim, identificamos não só genes causadores da microcefalia como também apontamos um mecanismo específico envolvido no controle do tamanho cerebral", acrescenta outro autor, Christopher Esk.
Até agora, eram conhecidos 27 genes relacionados à microcefalia. Com o CRISPR-LICHT foram encontrados outros 25. A técnica permitirá agora estudar melhor como esses 52 genes atuam no surgimento da malformação. Além disso, outros problemas, sejam no cérebro, sejam em outros órgãos humanos, poderão ser estudados.

"Estamos empolgados em anunciar que agora podemos, de maneira rotineira, realizar telas genéticas em sistemas organoides complexos. O método pode ser aplicado em outros modelos de órgãos e em qualquer doença que afeta a formação de um órgão. É uma abordagem completamente nova, que aponta um potencial futuro incrível, pois pode ser aplicada a qualquer doença cerebral, incluindo o autismo", antecipa outro coautor da pesquisa, Jürgen Knoblich.

 

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