Dia Internacional da Mulher

Conheça mulheres que batalharam por uma vacina contra a covid-19

As mulheres são maioria nas ciências, mas nos níveis mais elevados de pesquisa ainda lutam para conquistar espaço

Thays Martins
postado em 08/03/2021 10:58
 (crédito: Divulgação - BioNtech)
(crédito: Divulgação - BioNtech)

Pesquisas desenvolvidas por uma mulher possibilitaram a aprovação mais rápida da história de uma vacina. Menos de um ano depois do início da pandemia de covid-19, o primeiro imunizante contra a covid-19 era aprovado no Reino Unido. A vacina da farmacêutica norte-americano Pfizer, em parceria com o laboratório alemão BioNTech, foi o imunizante mais rápido a ser aprovado no mundo e ainda inovou ao usar uma tecnologia inédita, desenvolvida pela cientista húngara Katalin Karikó. Ao redor do mundo, são vários os exemplos de mulheres que foram para a linha de frente com o objetivo de produzir uma vacina contra a covid-19.

Cada vez mais as mulheres têm ganhado espaço nas ciências. Só no Instituto Butantan, em São Paulo, elas ocupam 71% dos cargos de pesquisador científico. Hoje, são cerca de 54% dos estudantes de doutorado no Brasil. Porém, a desigualdade ainda é grande: somente 23% de mulheres estão no nível mais elevado da carreira no CNPq, e elas corresponderem a apenas 14% dos cargos na Academia Brasileira de Ciências. Mesmo com todas as dificuldades, na pandemia, elas se destacaram na busca de soluções para a crise da covid-19. Neste Dia Internacional da Mulher, conheça algumas delas:

Katalin Karikó

Se hoje podemos comemorar o recorde na criação de vacinas contra a covid-19, temos que agradecer à bioquímica húngara Katalin Karikó, 66 anos. Ela foi a cientista responsável por criar a tecnologia de RNA mensageiro. Vacinas como a da Pfizer e a do laboratório Moderna utilizam essa tecnologia pioneira. O papel da cientista foi tão fundamental que ela está sendo cotada para o Prêmio Nobel de Química. Nesse modelo, para criar o imunizante, basta usar um RNA gerado em laboratório com informações genéticas do vírus. Com essa tecnologia é possível criar vacinas de maneira muito mais rápida e adaptada para variantes.

A ideia de usar um RNA mensageiro em vacinas foi primeiro proposta pela cientista em 1990, porém, as instituições não acreditavam que seria possível. “Recebia uma carta de rejeição atrás da outra de instituições e empresas farmacêuticas quando lhes pedia dinheiro para desenvolver essa ideia”, contou ao El País. Anos depois, um grupo de pesquisadores, liderado pelo imunologista Anthony Fauci, se interessou pela tecnologia.

Apenas em 2013 Karikó foi contratada pela BioNTech, onde hoje ocupa o cargo de vice-presidente. “Nos últimos 40 anos, não tive nenhuma recompensa pelo meu trabalho, nem mesmo um tapinha nas costas. Não preciso disso. Sei o que faço. Sei que é importante. E estou muito velha para mudar. Isso não me subiu à cabeça. Não uso jóias e tenho o mesmo carro velho de sempre”, afirma.

Rosana Richtmann

Rosana Richtmann
Rosana Richtmann (foto: Governo de São Paulo/ reprodução )

Apesar da grande equipe feminina do Instituto Butantan, na apresentação da vacina pelo governo de São Paulo, a única mulher presente à cerimônia foi a infectologista do Instituto Emílio Ribas Rosana Richtmann. Ela trabalhou como especialista na elaboração da vacina no Brasil. “Eu fiquei muito feliz com o convite, me senti representando a ciência feminina e muitas colegas me responderam que tinham se sentido representadas por mim”, lembrou, em entrevista ao Correio.

Ela ainda destaca que as mulheres são maioria na ciência, mas infelizmente ainda não ocupam os cargos mais altos. “A presença feminina é pequena nos cargos mais importantes e na visibilidade, mas nós estamos ganhando nosso espaço. Espero que a pandemia aumente o interesse das mulheres, das meninas, tenho recebido feedbacks muito bons”, diz.

Rosana também já enfrentou a pandemia de H1N1, a epidemia do zika vírus e trabalhou no combate ao HIV. Sobre a pandemia da covid-19, ela relata o cansaço com o descaso das pessoas com as medidas para evitar a disseminação do vírus. “Tenho trabalhado de uma forma intensa, porém, mais recentemente, de uma forma mais triste. Eu me sinto incompetente para convencer as pessoas da gravidade da situação. É uma sensação muito ruim, parece que parte da população não nos ouve. Frustrante”, relata.

Sue Ann Costa Clemens

Sue Ann Costa Clemens
Sue Ann Costa Clemens (foto: arquivo pessoal )

Sue Ann é carioca e filha de pais norte-americanos. Ela foi a coordenadora dos testes clínicos da vacina da Universidade de Oxford, em parceria com a AstraZeneca, no Brasil. Sue Ann é uma das fundadoras e diretora do Programa de mestrado em Vacinologia e Desenvolvimento de Medicamentos da Universidade de Siena, na Itália. Ela também é professora e chefe do Departamento de Clínica do Instituto Carlos Chagas, no Brasil. Além disso, atua como conselheira sênior e consultora da Fundação Bill e Melinda Gates.

A brasileira foi responsável por um estudo na América Latina que testou a vacina para rotavírus em 60 mil voluntários em 2005 e foi ela que conseguiu o financiamento do Instituto D’Or e da Fundação Lemann para os testes da vacina contra a covid-19 no Brasil. “Eu trabalhei como uma leoa para trazer esses testes para cá o mais rápido possível. Precisávamos correr para fazer o trabalho ainda com a curva epidemiológica ascendente”, afirmou Sue Ann no dia que os testes tiveram início no Brasil, ao O Globo.

Nísia Trindade Lima 

Nísia Trindade Lima
Nísia Trindade Lima (foto: Fiocruz/ reprodução )

A presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Nísia Trindade Lima, é a primeira mulher a ocupar o mais alto posto na fundação. De quebra, ela vai ficar para a história como a pessoa que conseguiu firmar a parceria da Fiocruz com a Universidade de Oxford e o laboratório AstraZeneca, que viabiliza a vacinação no Brasil.

“Costumo dizer que me orgulho muito de ser a primeira mulher a presidir a Fiocruz, mas que não adianta orgulho sem ação. Portanto, eu só me orgulho porque tenho buscado trabalhar pela inclusão de mulheres e meninas na ciência, pela equidade de gênero e raça na nossa instituição, com medidas concretas. Portanto, temos trabalhado muito, mulheres e homens, todos que apostamos num mundo mais justo. Este é o nosso compromisso”, afirma ao Correio.

Ela explica que a Fiocruz está trabalhando em um projeto para lembrar a história de mulheres que passaram pela fundação, o Mulheres na Fiocruz: trajetórias. “Lutei muito para estudar, para criar meus filhos e desenvolver, concomitantemente, minha carreira acadêmica e de gestora. Essa experiência, que não é só minha, mas de milhões de mulheres no mundo”, completa.

Além da vacina, Nísia lidera as ações da Fiocruz no enfrentamento da pandemia de covid-19 no Brasil. A instituição criou iniciativas como o Observatório covid-19, rede que realiza pesquisas e sistematiza dados epidemiológicos e monitora e divulga informações, para subsidiar políticas públicas, sobre a circulação do coronavírus.

A Fundação também se tornou laboratório de referência para a Organização Mundial da Saúde (OMS) em covid-19 nas Américas. “Nossa prioridade foi garantir o acesso da população, através do SUS, a uma vacina eficaz e segura e, por meio de prospecção realizada conjuntamente ao Ministério da Saúde, essa estratégia foi a que se mostrou mais coerente com a história da instituição”, conta.

Paula Melo Suzana

Brasília se tornou palco para a produção de uma das vacinas mais promissoras contra a covid-19. A Sputnik V está sendo produzida pela fábrica da União Química. Na farmacêutica, a vice-presidente de Qualidade, Inovação e Assuntos Regulatórios da empresa, Paula Melo Suzano, chefia uma equipe de 1,2 mil pessoas. Ela tem sido a responsável pela área de qualidade da empresa e quem conduziu as negociações com a Rússia para conseguir o acordo. “Ser uma mulher à frente de um enorme grupo técnico nesta empresa, é um imenso orgulho e executo com muito prazer”, afirma.

Nita Patel

Nital Patel
Nital Patel (foto: redes sociais )

No caso da vacina da empresa de biotecnologia norte-americana Novavax, que apresentou 89% de eficácia, uma das equipes responsáveis pelo imunizante é totalmente feminina. A equipe é liderada pela imigrante indiana Nita Patel. A cientista vem de uma família humilde e se formou graças a bolsas do governo. Ela se tornou cientista por incentivo do pai, que tinha tuberculose, e durante anos trabalhou na tentativa de encontrar uma cura para a doença.

Com a pandemia da covid-19, passou a trabalhar 18 horas por dia. “Para mim, nada é impossível. Então, tendo essa mentalidade, honestamente, nada me estressa”, disse à revista Science. Antes de começar a trabalhar na Novavax, em 2015, ela trabalhou como cientista e gerente de pesquisa na AstraZeneca por 25 anos.

Lisa A. Jackson

Lisa A. Jackson
Lisa A. Jackson (foto: Kaiser Permanente Washington/ reprodução )

O primeiro teste de uma vacina contra a covid-19 em humanos foi liderado pela cientista Lisa A. Jackson, da Universidade de Washington. Em 16 de março de 2020, cinco dias após a OMS declarar a covid-19 como pandemia, Lisa supervisionava a aplicação da primeira injeção da vacina da Moderna, em Seattle, nos Estados Unidos. Ela também atuou na fase final dos ensaios das vacinas da Moderna e da Johnson & Johnson.

Kathrin Jansen

KATHRIN U. JANSEN
KATHRIN U. JANSEN (foto: Pfizer/ reprodução )

A microbiologista alemã Kathrin Jansen acumula conquistas quando o assunto é vacina. Ela já esteve à frente de projetos como o do imunizante contra o papilomavírus humano (HPV), que previne o câncer de colo do útero, e do Prevnar 13, vacina contra o pneumococo, bactéria que provoca pneumonia. Agora, coloca em seu currículo a vacina da Pfizer. Na farmacêutica ela comanda uma equipe de 650 pesquisadores. “Eu sempre digo: 'Você aprende alguns truques se trabalhar em algo por tempo suficiente'”, disse à People.

Kizzmekia Corbett

 Dr. Kizzmekia Corbett,
Dr. Kizzmekia Corbett, (foto: National Institutes of Health/ reprodução )

A primeira vacina aprovada nos Estados Unidos, a da Moderna, foi desenvolvida em parceria com o Centro de Pesquisa de Vacinas do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas por uma equipe co-liderada por uma mulher negra de 34 anos chamada Kizzmekia Corbett. A imunologista já estava pesquisando coronavírus muito antes da pandemia. A equipe dela estudava os surtos de Mers e Sars para se preparar para um possível novo vírus.

"Estar na vanguarda dos esforços de desenvolvimento de vacinas, uma vacina que é 94% eficaz e tem a capacidade de acabar com esta pandemia e ser o grande equalizador quando pensamos sobre as disparidades de saúde, é realmente uma honra para mim”, disse ao site Essence.

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    Dr. Kizzmekia Corbett, Foto: National Institutes of Health/ reprodução
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    Lisa A. Jackson Foto: Kaiser Permanente Washington/ reprodução
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