Administrado em dose única, o imunizante contra a covid-19 desenvolvida pela Janssen, divisão de vacinas da empresa Johnson & Johnson, apresenta risco de desencadeamento de uma doença autoimune rara: a síndrome de Guillain-Barré (GBS, em inglês). O alerta foi feito ontem pelo Centro de Controle de Doença (CDC), dos Estados Unidos, após revisar dados de imunizados no país. O órgão enfatizou que o risco de ocorrência da complicação é muito baixo, e que os benefícios gerados pelo fármaco protetivo se sobressaem consideravelmente.
“Nos Estados Unidos, quase todas as hospitalizações e mortes por covid-19 estão ocorrendo, agora, em pessoas não vacinadas. O risco de eventos adversos graves após a vacinação permanece raro. Recomenda-se que todas as pessoas com 12 anos ou mais de idade recebam um imunizante”, orientou o CDC em comunicado.
Foram identificados 100 casos de GBS entre os 12,8 milhões de imunizados com a fórmula de dose única. Desses, 95 demandaram hospitalização, e uma pessoa morreu. Segundo o CDC, a maioria dos casos da doença autoimune relatados após o uso da vacina ocorreu cerca de duas semanas após a aplicação do fármaco e, principalmente, em homens — muitos com 50 anos ou mais.
A GBS é um distúrbio neurológico no qual o sistema imunológico do corpo danifica as próprias células nervosas, causando fraqueza muscular ou, nos casos mais graves, paralisia. “Essa enfermidade ocorre quando você tem uma reação exagerada do sistema imune. Ela gera uma inibição da atividade motora dos nervos periféricos, que faz com que o paciente sinta muitas dores”, explica Luciano Lourenço, clínico geral e chefe da Emergência do Hospital Santa Lúcia, de Brasília.
Segundo o médico brasileiro, outras vacinas estão associadas à ocorrência da GBS, como a da febre amarela, a da gripe sazonal e a de herpes-zóster, e é difícil estabelecer uma relação de causa e efeito entre as fórmulas e o distúrbio neurológico. (Leia Para saber mais) “A síndrome pode, sim, ter sido desencadeada pela vacina (da covid), mas não temos como provar. Pode ser que o paciente já tivesse uma predisposição à doença. É uma dúvida que surge sempre que avaliamos o uso de imunizantes, e que só vamos ter certeza de como ocorreu com mais análises”, justifica. Nos Estados Unidos, de acordo com a CDC, anualmente, cerca de 3 mil a 6 mil pessoas desenvolvem a GBS, e a maioria delas se recupera totalmente.
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Em análise
Após a divulgação das informações, a Johnson & Johnson divulgou um comunicado em que informou estar ciente dos dados observados pelos especialistas do CDC, e que mantém conversas com o FDA, a agência que controla o comércio de medicamentos e alimentos nos EUA. “Temos discutido com a FDA e outros reguladores sobre casos raros do distúrbio neurológico, a síndrome de Guillain-Barré, que foram relatados após a vacinação com a vacina Janssen covid-19 (…) A chance de que isso ocorra é muito baixa”, declarou. A FDA informou que incluiu uma informação sobre um “aumento do risco” do desenvolvimento da GBS ao imunizante.
No início do ano, os dois órgãos estadunidenses interromperam o uso da vacina da Janssen devido ao risco de um tipo raro de complicação de coagulação sanguínea principalmente em mulheres. A pausa foi suspensa em abril, após os especialistas concluírem que a probabilidade de ocorrência era baixa e a condição adversa, tratável. A embalagem da vacina foi atualizada para alertar sobre a possibilidade desse efeito.
Para Luciano Lourenço, os dados divulgados e as medidas adotadas eram esperados e não devem assustar a população. “Qualquer medicamento pode gerar algum dano colateral, e esses efeitos adversos são vistos com frequência ainda maior quando a droga é aplicada em uma grande quantidade de pessoas, que é o que está acontecendo no caso da covid-19, em que precisamos de todos imunizados”, justifica. “É algo que precisa ser avaliado com cuidado, mas, como os especialistas ressaltaram, os benefícios da vacina superam esse risco, o que reforça a necessidade de continuar com a utilização do fármaco e manter sempre a vigília, que é o que esses órgãos responsáveis estão fazendo.”
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Relação também com o zika vírus
Em 2016, pesquisadores internacionais observaram um aumento no número de casos da síndrome de Guillain-Barré na mesma época em que o zika vírus se estabeleceu em sete países. O estudo, publicado na revista especializada New England Journal of Medicine, foi conduzido por cientistas da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), que analisaram as taxas das duas enfermidades no Brasil, na Colômbia, na República Dominicana, em El Salvador, Honduras, Suriname e Venezuela.
Analisando dados coletados em relatórios oficiais governamentais, os pesquisadores avaliaram 164.237 casos confirmados e suspeitos de infecção do zika e 1.474 casos de Guillain-Barré entre 1° de abril de 2015 e 31 de março de 2016. A equipe detectou uma associação próxima entre o aumento dos casos de zika e o dos de Guillain-Barré. À medida que as infecções do zika diminuíram nos países avaliados, a incidência da doença autoimune também.
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