PANDEMIA

Covid-19: risco de paralisia facial é baixo em vacinados

Maior estudo sobre associação entre a imunização e um distúrbio que inflama nervos faciais indica que os benefícios da CoronaVac e do fármaco da Pfizer/BioNTech são superiores à possibilidade da ocorrência do problema

Paloma Oliveto
postado em 17/08/2021 06:00
 (crédito: Eitan ABRAMOVICH / AFP)
(crédito: Eitan ABRAMOVICH / AFP)

A publicação de relatos de casos sobre pessoas que ficaram com parte do rosto paralisada depois de receberem o imunizante da Pfizer/BioNTech levou o Canadá a incluir a chamada paralisia de Bell na lista de efeitos colaterais da substância. Porém a primeira análise populacional de grande escala sobre aumento de risco da condição em imunizados demonstra que os benefícios das vacinas são muito superiores à potencial ocorrência da adversidade.

O estudo, publicado na revista The Lancet Infectious Diseases, avaliou casos da paralisia facial unilateral, caracterizada por uma inflamação temporária nos nervos, na população vacinada de Hong Kong. Essa rara condição desaparece sozinha em até seis meses em 70% dos pacientes.

Nos demais, o uso de corticoides reverte o dano em quase 100% das vezes. Durante os ensaios clínicos das vacinas de mRNA (Pfizer e Moderna) e da CoronaVac, houve relatos entre os imunizados. Além disso, já foram publicados alguns estudos de caso de pessoas com a face paralisada após serem vacinadas.

Essas ocorrências levaram a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) a prever a paralisia de Bell como efeito colateral tanto da substância da Pfizer quanto da CoronaVac. Na semana passada, o Canadá listou a adversidade na bula da vacina de mRNA, mas, até agora, não é possível dizer qual a relação entre o fármaco e a inflamação facial.

No estudo publicado ontem, os pesquisadores analisaram casos de paralisia de Bell relacionados às duas vacinas aprovadas em Hong Kong — CoronaVac e BNT162b2 (Pfizer). A pesquisa usa dados do sistema de farmacovigilância da autoridade reguladora de medicamentos da região administrativa, que abrange relatórios de eventos adversos registrados por profissionais de saúde em todo o território.

As ocorrências de paralisia de Bell foram incluídas na análise quando diagnosticadas dentro de 42 dias da primeira ou da segunda dose da imunização. Os pesquisadores também conduziram um estudo de caso-controle, com registros de saúde eletrônicos de todo o território, incluindo 298 casos de paralisia de Bell e 1.181 controles correspondentes.

Notificações

Entre 23 de fevereiro de 2021 e 4 de maio de 2021, 28 ocorrências clinicamente confirmadas de paralisia de Bell foram identificadas entre as 451.939 pessoas que receberam pelo menos uma primeira dose de CoronaVac (equivalente a 3,61 casos por 100 mil doses administradas) e 16 entre as 537.205 que tomaram pelo menos uma primeira dose da Pfizer (correspondente a 2,04 casos por 100 mil injeções aplicadas).

Ao analisar dados de 2010 a 2020 (ou seja, antes que existissem as vacinas), os pesquisadores estimaram que o risco de paralisia de Bell em Hong Kong é de cerca de 27 casos por 100 mil pessoas, por ano. As estimativas globais variam de 15 a 30 ocorrências por 100 mil pessoas, anualmente.

Com os dados das pessoas vacinadas, os cientistas constataram que, para cada 100 mil imunizadas com CoronaVac, 4,8 podem desenvolver paralisia de Bell. No caso da Pfizer, o risco aumentado foi equivalente a dois casos em 100 mil vacinados. Os autores ressaltam que mais estudos de larga escala são necessários para avaliar a associação entre a paralisia de Bell e a BNT162b2.

“Nosso estudo sugere um pequeno aumento do risco de paralisia de Bell associado à vacinação com CoronaVac. No entanto, ela permanece um evento adverso raro e temporário”, disse, em nota, o autor principal, Ian Chi Kei Wong, professor da Universidade de Hong Kong. “Todas as evidências até o momento, de vários estudos, mostram que os efeitos benéficos e protetores da vacina covid-19 inativada (caso da CoronaVac) superam em muito qualquer risco. A vigilância contínua, por meio de estudos de farmacovigilância como o nosso, é importante para calcular com níveis crescentes de confiança os riscos de eventos adversos raros.”

Desconhecimento

Os autores observam, ainda, que não podem apontar uma relação causal entre a paralisia de Bell e a vacinação em nenhum caso individual que entrou no estudo. Segundo eles, o mecanismo pelo qual os imunizantes podem — em casos muito raros — levar à inflamação facial permanece desconhecido.

Outros estudos identificaram ocorrências também pouco frequentes da paralisia após algumas vacinas inativadas, como a da gripe. Um levantamento anterior, usando o Banco de Dados de Farmacovigilância da Organização Mundial da Saúde, por sua vez, não relatou risco maior seguido à vacinação com substâncias de mRNA.

“De uma perspectiva clínica e orientada para o paciente, nenhum dos estudos publicados até agora fornece evidências definitivas para ajudar a escolher uma vacina específica, no caso de pessoas com histórico de paralisia de Bell”, diz Richard Doan, infectologista da Universidade de Toronto, no Canadá, que não participou da pesquisa. “Enquanto esperamos por evidências conclusivas sobre a paralisia facial associada à vacina, uma certeza permanece: o benefício de ser vacinado supera qualquer risco possível.”

Para o professor Kevin McConway, os casos relatados até agora podem ser coincidência
Para o professor Kevin McConway, os casos relatados até agora podem ser coincidência (foto: Universidade Open/Divulgação)

Kevin McConway, professor de estatística aplicada da Universidade Open, no Reino Unido, também não descarta que os casos relatados até agora sejam mera coincidência. “A paralisia de Bell não é comum, mas também não é extremamente rara. São reportados entre 20 e 30 casos por ano para cada 100 mil pessoas globalmente, o que significaria que existem entre cerca de 13,5 mil e 20,5 mil ocorrências anuais no Reino Unido”, exemplifica.

“Portanto, você esperaria que alguns casos de paralisia de Bell se desenvolvam logo após a vacinação apenas por coincidência. Meu sentimento é que, mesmo se houver uma relação causal com a vacinação (e sobre isso certamente não se sabe nada), é provável que aconteça tão raramente, que isso não afete o equilíbrio entre o risco de possíveis efeitos colaterais da vacina e o de consequências ruins se você não for imunizado e pegar covid-19”, ressalta.

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Dose extra no Uruguai

 (crédito: Eitan Abramovich/AFP )
crédito: Eitan Abramovich/AFP

Com a covid-19 bem controlada, o Uruguai começou, ontem, a aplicar uma dose de reforço da vacina da Pfizer/BioNTech às pessoas imunizadas com CoronaVac. Em Montevidéo, a procura foi grande nos postos de vacinação (foto). Embora não exista estudos conclusivos sobre essa combinação, especialistas locais consideram a iniciativa segura e necessária diante da ameaça da variante delta. Cerca de um terço dos 3,5 milhões de habitantes se inscreveram para serem inoculados com o fármaco americano após terem recebido duas injeções do imunizante do laboratório chinês Sinovac. O Uruguai imunizou 73% de sua população com pelo menos uma dose contra a covid-19, enquanto 67% têm o esquema completo. Desse total, 65% receberam CoronaVac e, agora, terão a oportunidade de aumentar a proteção imunológica, seguindo o mesmo protocolo adotado no Chile e na República Dominicana.

Cientistas explicam a diversidade do cacau

 (crédito: Sidney Oliveira/AG. Pará)
crédito: Sidney Oliveira/AG. Pará

Geneticistas moleculares sabem, há cerca de uma década, que as variantes estruturais genômicas podem desempenhar papéis importantes na adaptação e especiação de plantas e animais, mas sua influência geral na aptidão das populações vegetais é mal compreendida. Isso ocorre, em parte, porque a identificação precisa no nível populacional dessas variações requer a análise de vários conjuntos de genoma de alta qualidade, que não estão amplamente disponíveis.

Em um estudo publicado na revista Pnas, pesquisadores da Universidade da Pensilvânia analisaram a aptidão de variantes genômicas estruturais em 31 populações naturais do Theobroma cacao, a espécie de árvore de longa vida que cresce na Bacia Amazônica e é a fonte do chocolate. Entre cepas do cacau, eles encontraram mais de 160 mil variantes estruturais, ou seja, o conjunto de transmutações que envolvem pelo menos centenas de pares de base no cromossomo.

“A pesquisa, que tem implicações para a genética de plantas em geral, não teria sido possível antes que computadores poderosos tornassem o sequenciamento de alta resolução de genomas possível, acessível e relativamente rápido”, diz Mark Guiltinan, um dos autores do estudo. “Os genomas de diferentes populações de cacaueiros são 99,9% idênticos, mas são as variantes estruturais naquele décimo de 1% que explicam a diversidade da planta em diferentes regiões e sua adaptação ao clima e a diversas doenças”, afirmou. “Esse estudo faz uma associação entre a variação estrutural e a capacidade de uma planta de se adaptar a um ambiente local.”

No artigo, os pesquisadores relataram que a maioria das variantes restringem a adaptação da planta do cacau. Esses efeitos prejudiciais, provavelmente, surgem como resultado direto da função prejudicada do gene e, indiretamente, devido à recombinação genética suprimida por longos períodos de tempo.

Resistência

No entanto, apesar dos efeitos prejudiciais gerais, o estudo também identificou variantes estruturais individuais com assinaturas de adaptação local. Genes envolvidos na resistência a patógenos estão entre eles, destacando a contribuição de variantes estruturais para esse importante traço de adaptação local.

Além de revelar novas evidências empíricas para a importância evolutiva de variantes estruturais em todas as plantas, documentar as diferenças genômicas e variações entre as 31 cepas de cacau, a pesquisa fornece um recurso valioso para estudos genéticos e de melhoramento em andamento para essa planta valiosa, observou Guiltinan.

“Todo o cacau vem da Bacia Amazônica — as plantas foram coletadas há muito tempo na natureza por coletores e clonadas, então, temos uma coleção permanente”, disse, acrescentando: “Como resultado desse estudo, sabemos que a variação estrutural é importante para a sobrevivência da planta, para a evolução dela e, principalmente, para a sua adaptação às condições locais.”

 

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