
Uma combinação de analgésicos comuns — acetaminofeno (comercialmente conhecido como Tylenol) e ibuprofeno (Advil) controla a dor melhor do que medicamentos opioides após a extração do dente do siso. É o que diz um estudo com 1,8 mil pacientes conduzido pela Universidade de Rutgers, nos Estados Unidos. Segundo os autores, os resultados indicam uma nova maneira de tratar a dor pós-cirúrgica.
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Os opioides são compostos extraídos da planta papoula ou sintéticos, com propriedades semelhantes, com efeitos analgésicos e sedativos. Entre os fármacos à base dessas substâncias, estão morfina, codeína e fentanil. Embora muito eficazes para controlar a dor, o uso inadequado pode causar dependência.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, em todo o mundo, em 2019, 600 mil pessoas morreram devido ao uso de drogas, sendo que 80% desses óbitos estão associados a opioides, incluindo as formulações farmacológicas e os entorpecentes, como heroína. Nos Estados Unidos, a dependência de medicamentos dessa classe é considerada uma epidemia.
Sono
Segundo o estudo da Universidade de Rutgers, os pacientes que receberam a combinação dos analgésicos comuns sentiram menos dor, dormiram melhor e reportaram maior satisfação, comparado àqueles que receberam hidrocodona (um opioide) associada ao acetaminofeno. “Achamos que este é um estudo marcante”, disse, em nota, Cecile Feldman, principal autora do estudo. “Existem estudos por aí que mostram que quando os jovens são apresentados aos opioides, há uma probabilidade maior de que eles eventualmente os usem novamente, e então isso pode levar ao vício”, destacou.
Para comparar o alívio da dor por opioides e não opioides, os pesquisadores conduziram um estudo randomizado em pacientes submetidos à remoção cirúrgica de dentes do siso, um procedimento comum que normalmente causa dor moderada a intensa. Metade dos pacientes recebeu hidrocodona com paracetamol. A outra metade recebeu uma combinação de paracetamol e ibuprofeno. Os pacientes avaliaram seus níveis de dor e outros resultados, como qualidade do sono, ao longo da semana após a cirurgia.
Os resultados no The Journal of American Dental Association mostraram que a combinação não opioide proporcionou alívio superior da dor durante o período de pico de desconforto nos dois dias após a cirurgia. Os pacientes que tomaram os medicamentos não opioides também relataram melhor qualidade de sono na primeira noite e menos interferência nas atividades diárias durante a recuperação. "Estamos bastante confiantes em dizer que os opioides não devem ser prescritos rotineiramente e que se os dentistas prescreverem a combinação não opioide, seus pacientes ficarão muito melhores", disse Feldman.
Brasil
“No Brasil, a prescrição de opioides após a extração de sisos não é um costume tão comum quanto em países como os Estados Unidos”, esclarece Ilana Marques, dentista da IGM Odontologia para Família, em Brasília. “Aqui, os profissionais costumam priorizar o uso de analgésicos comuns, como paracetamol e dipirona, e anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), como o ibuprofeno. Isso se deve tanto a questões culturais quanto à maior preocupação com o risco de dependência associado ao uso de opioides”, explica.
Segundo Marques, em situações específicas, como dor severa, pós-operatório complexo e pacientes que não podem tomar os AINEs, os opioides podem ser indicados. “Mesmo nesses casos, a prescrição de opioides no Brasil é geralmente feita com cautela, em doses controladas e por períodos muito curtos.”
Para a dentista, o estudo da Rutgers pode impactar a prática clínica. “Esse tipo de pesquisa também pode ajudar a desestigmatizar o uso de analgésicos simples, promovendo maior adesão a alternativas seguras. Portanto, além de contribuir para práticas clínicas melhores, ela apoia a saúde pública no enfrentamento da crise de opioides”, opina.
Duas perguntas para Ianara Pinho, cirurgiã dentista
Quando os opioides são indicados na odontologia?
Normalmente os opioides são receitados em situações muito específicas. Quando, por exemplo, as medicações não opioides realmente não fazem efeito. Em geral, em dores muito fortes, agudas ou crônicas. Um exemplo disso é para o tratamento da articulação, da disfunção temporomandibular Às vezes, o paciente apresenta uma dor crônica que não responde mais aos analgésicos convencionais Então, esse é um dos exemplos de uso. Porém, no Brasil, o uso de fato é bem restrito e realmente só é receitado quando as medicações não opioides não fazem efeito
Qual a principal colaboração do estudo da Universidade de Rutgers?
Medicamentos não opioides, como analgésicos, dipirona, paracetamol, e anti-inflamatórios, como ibuprofeno e nimesulida, não têm o viés da dependência, como acontece com opioides. Então, considerando que muitas pessoas têm uma tendência a uma dependência química, a substituição proposta pela pesquisa traz um fator de risco muito menor para a dependência.
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