
Liderado pela China, o avanço do setor de energia renovável foi considerado o maior destaque científico de 2025 pela revista especializada Science, uma das mais importantes do mundo. Todos os anos, em dezembro, o corpo editorial da publicação, formado por cientistas e jornalistas da área, elege 10 descobertas ou feitos que marcaram os últimos 12 meses. Um deles é escolhido como o "mais mais", título que ficou com os esforços chineses sem precedentes para alcançar a independência de combustíveis fósseis, o principal motor das mudanças climáticas. Outra inovação lembrada pelo periódico foi o transplante de rim de um porco para um ser humano, procedimento que teve a participação do cirurgião brasileiro Leonardo Riella.
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Arroz à prova de calor
Em fevereiro, pesquisadores da Universidade Agrícola de Huazhong, da China, divulgaram na revista Cell a identificação de um gene fundamental que aumenta a tolerância do arroz ao calor, mantendo a qualidade e a produtividade dos grãos. A descoberta representa uma solução para as crescentes ameaças à produção de arroz em condições de calor extremo. "Sob altas temperaturas, o gene, QT12, interage com o complexo proteico NF-Y para proteger os grãos como uma barreira interna, resistindo às altas temperaturas e, ao mesmo tempo, estabilizando a síntese de amido e proteínas", explicou Li Yibo, autor correspondente do estudo. Li afirmou que a bacia do Rio Yangtzé (foto) produz cerca de dois terços do arroz da China, mas o calor extremo dos últimos anos tem ameaçado o cultivo da planta.
Terapia individualizada
Apenas seis meses após o nascimento, o norte-americano Kj Muldoon (foto), da Filadélfia, recebeu um tratamento individualizado inédito, baseado na técnica de edição genética CRISPR. Ele tinha mutações em ambas as cópias do gene CPS1, que impediam seu corpo de produzir uma enzima hepática responsável pela decomposição da ureia. As deficiências de CPS1 são consideradas ultrarraras, e foram alvo de um grupo de cientistas do Hospital Infantil da Filadélfia. Os pesquisadores mapearam todo o DNA da criança e, em tempo recorde, desenvolveram a terapia que consertou o erro. Em duas semanas, a Food and Drug Administration (FDA) deu aprovação para a administração da substância, e Muldoon recebeu a primeira dose no fim de fevereiro, seguida por outras duas em março e abril. "Esperamos que KJ seja o primeiro de muitos a se beneficiar de uma metodologia que pode ser adaptada para atender às necessidades individuais de cada paciente", comentou Rebecca Ahrens-Nickas, do Hospital Infantil da Filadélfia.
Novas armas contra gonorreia
Pela primeira vez em décadas foram desenvolvidos, com sucesso, dois novos antibióticos para tratar a gonorreia, infecção sexualmente transmissível (foto) que afeta mais de 82 milhões de pessoas anualmente e que, entre outras complicações, pode levar à infertilidade e aumentar o risco de HIV/Aids. Em maio, um estudo de fase 3 publicado na revista The Lancet anunciou os resultados positivos do tratamento com a geoptidacina, um composto já aprovado para tratar infecções urinárias e que integra uma nova classe de antibióticos. Na semana passada, também na The Lancet, cientistas afirmaram que a zoliflodacina, que age com um mecanismo diferente, curou os pacientes do ensaio clínico. O medicamento foi aprovado pelo FDA dias depois. "Pela primeira vez em décadas, tanto os pacientes quanto seus profissionais de saúde terão uma opção de tratamento oral em dose única", comemorou David Altarac, diretor médico da Innoviva Specialty Therapeutics, que desenvolveu a zoliflodacina.
Estratégia revelada
Em junho, pesquisadores da Universidade do Sul do Alabama, nos Estados Unidos, publicaram na revista Nature um estudo que aprofunda o conhecimento sobre como as células cancerígenas exploram seu microambiente, especialmente os neurônios próximos, para crescer e se espalhar. As descobertas ajudarão os cientistas a compreender a complexidade do comportamento do câncer e poderão levar a novas abordagens para o desenvolvimento de terapias oncológicas. Os cientistas usaram modelos de câncer de mama inovadores e visualizaram a interação entre as células, explicando como isso contribui para a agressividade e a metástase do tumor. "Nossos resultados sugerem que talvez precisemos mudar nossas estratégias terapêuticas para atingir as células cancerígenas", afirmou Simon Grelet, que liderou o estudo. Na imagem, as células doentes (vermelhas) "roubam" energia dos neurônios (verdes) para se desenvolver.
Visão inédita do céu
Instalado no Chile, o Observatório Rubin (foto), financiado pelos Estados Unidos, entrará em operação no próximo ano, com a missão de fotografar uma região diferente do céu do hemisfério sul a cada 40 segundos. Os registros serão feitos com a câmera LSST de 3.200 megapixels — a maior já construída —, criando um registro em de ultra-alta definição das mudanças no céu noturno, incluindo informações detalhadas sobre milhões de corpos celestes. Estima-se que o Rubin detectará cerca de 100 milhões de estrelas variáveis — que mudam de brilho — em 10 anos de operação. "Isso vai permitir muitos avanços científicos que antes eram muito difíceis de realizar, pois a maior parte do que sabemos sobre as estrelas vem da luz que elas emitem", comentou Adam Miller, astrônomo da Universidade de Northwestern que participa do projeto.
Um rosto denisovano
Dois estudos divulgados em junho nas revistas Science e Cell identificaram o icônico "Homem dragão" (foto), um crânio de 146 mil anos descoberto em 1930 perto de Harbin, na China, como um denisovano primitivo. A equipe desenvolveu um método para identificação automática de populações humanas e otimizaram técnicas de extração, além de criar algoritmos para rastrear a evolução do DNA humano antigo a partir do tártaro dentário do Pleistoceno, extraído do crânio do fóssil. Identificado como uma nova espécie de hominídeo, o Homo longi, compartilha semelhanças morfológicas significativas com restos de denisovanos encontrados em outros locais. "Temos, agora, o primeiro esboço morfológico das populações denisovanas, ajudando a responder uma questão não resolvida, sobre a sua aparência", escreveram os autores do estudo.
Nova geração de IA
Uma corrida do ouro da inteligência artificial (IA) para a ciência. Assim a revista Science definiu as centenas de milhões de dólares de gigantes da tecnologia e investidores em empresas como Periodic Labs, Lila Sciences e OpenAI for Science. Elas estão atrás da próxima geração de LLMs (Large Language Models), sistemas avançados de IA como o GPT e o Gemini (foto), treinados com enormes volumes de dados para compreender, gerar e processar linguagem humana. Em 2025, houve grandes avanços das LLMs na execução de tarefas como tradução, resumo, criação de conteúdo e chatbots, usando arquiteturas de Deep Learning. A revista científica destacou alguns desses progressos, como a identificação, pela IA, de novos candidatos entre os medicamentos existentes para fibrose hepática e a reprodução, em dois dias, de uma descoberta sobre a disseminação de parasitas em bactérias, que levou anos para ser identificada nos laboratórios tradicionais.
Precisão inédita
Cientistas que trabalham no experimento Muon g-2 — pronuncia-se "gê menos dois" —, sediado no Laboratório Nacional de Aceleradores Fermi do Departamento de Energia dos Estados Unidos (foto), divulgaram em junho a terceira e última medição da anomalia magnética do múon. O resultado concorda com aqueles publicados em 2021 e 2023, mas com uma precisão muito maior, de 127 partes por bilhão, superando a meta original do projeto experimental, de 140 partes por bilhão. O Moun g-2 estuda a oscilação de uma partícula fundamental chamada múon, semelhante aos elétrons, mas cerca de 200 vezes mais massiva. A partícula tem uma propriedade da mecânica quântica chamada spin, que pode ser interpretada como um pequeno ímã interno. "É empolgante adicionar uma medição precisa que acredito que permanecerá válida por muito tempo", comentou Peter Winter, físico do Laboratório Nacional de Argonne.
Rumo ao xenotransplante
Marco significativo na pesquisa de xenotransplante — entre diferentes espécies —, o rim de porco geneticamente modificado funcionou pelo tempo recorde de 271 dias, quase nove meses, no corpo de Tim Andrews (na foto, com a esposa), um homem de 67 anos, com falência renal. O transplante experimental ocorreu em 25 de janeiro de 2025, no Massachusetts General Hospital, em Boston e, em outubro, o órgão foi removido, por perder a função. Andrews, que foi voluntário, não pode se submeter a outra operação do tipo e teve de voltar à diálise diária, mas disse que tem muito orgulho de ter ajudado em um passo importante rumo a ensaios clínicos maiores. Para evitar rejeição, o órgão teve 69 genes alterados. "O xenotransplante representa um ponto de virada, eliminando a escassez de órgãos como uma barreira ao transplante", comentou o co-líder da equipe de cirurgiões, Leonardo Riella. Uma curiosidade: Riella é brasileiro e se formou na Universidade Federal do Paraná.
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